Diversão e Arte

Casa do Cantador é palco de duelos poéticos no 1º Festival Regional de Repentistas neste fim de semana

postado em 23/07/2010 07:00
; Viviane Marques Especial para o Correio Só não vale pornografia. De resto, seja qual for o mote, é só desafiar que o repentista empunha a viola e improvisa seus versos. Para dominar a arte, é preciso talento e técnica, e esses estarão à prova no 1o Festival Regional de Repentistas, de hoje a domingo, na Casa do Cantador, em Ceilândia. O evento promoverá uma disputa entre 10 duplas do Distrito Federal por quatro vagas no concurso nacional, agendado para setembro, no mesmo local. Mais que um desafio, o evento promete ser uma celebração da cultura nordestina. Na abertura haverá shows de forró, enquanto o intervalo dos duelos contará com atrações como a dupla de emboladores Roque José e Terezinha, e o poeta Zé Cardoso. Os repentistas Roberto Silva, 55 anos (e), e Geraldo Queroga, 50 anos, preparam as rimas para o festivalO nome repente vem do improviso dos versos, feitos ;de repente;. Acompanhado da viola nordestina (com sete cordas), é chamado de cantoria. No festival, as duplas terão que mostrar sua competência em sextilhas, mote em sete e em 10 sílabas e disporão de cinco minutos para se apresentar em cada modalidade. Os competidores são avaliados individualmente, mas a pontuação total da dupla é o que vale para a classificação no desafio. O júri contará com cinco integrantes, sendo três cantadores e dois especialistas no gênero. E quais as características do bom repentista? ;Saber rimar e desenvolver a métrica num fraseado que faça sentido, além de boa projeção de voz e presença de palco;, resume Marques Célio Rodrigues de Almeida, diretor da Casa do Cantador do Brasil, quartel-general da cultura nordestina em Ceilândia. Cearense, voz empostada ; apesar de não ser artista ; ele lembra que Patativa do Assaré, poeta e cordelista popular, não tinha projeção vocal, apesar de produzir versos geniais. Por isso foi mais conhecido pela sua obra escrita. Ter boa cultura geral é outro requisito importante. A natureza, as questões sociais e a dureza da vida no sertão são temas recorrentes nas cantorias. Para sobreviver a partir de sua arte, os repentistas se apresentam em feiras, nas cantorias chamadas de ;pé de parede;, criam jingles publicitários, além de serem convidados para eventos institucionais e exposições, nos quais se apresentam mediante cachê. Segundo Marques, a média de rendimento mensal de um cantador é de cerca de R$ 1.500, mas o valor pode ser mais alto, de acordo com os convites recebidos. O paraibano Geraldo Queroga, há sete anos em Ceilândia, tornou-se profissional exclusivo da viola há 15 anos, além de compor hinos evangélicos e criar piadas. Não tem um fim de semana livre. ;O repentista está sempre pensando em parar de cantar, mas o povo não deixa. E se parar, a gente fica até doente;, diz ele, que gosta de se inspirar em temas ligados à natureza em suas apresentações em casas de família, bares, escolas e empresas. E alerta: ;Aqueles grupos que se apresentam na praia por uns trocados depreciam o valor do repentista. O verdadeiro cantador não faz show na rua;. Segundo Marques, o Distrito Federal e o Entorno contam com aproximadamente 30 cantadores cadastrados na casa, que tem alojamento com capacidade para receber nove artistas visitantes. Um deles é o pernambucano Roberto Silva, que há seis meses se apresenta na capital para, da sua viola, tirar o sustento da família. Filho de cantador, ele é um exemplo de que não há escola que forme repentistas. A tradição é passada de uma geração a outra e o aprendizado se dá na prática. Em casa, no entanto, Silva não terá herdeiros na poesia do improviso: a filha, de 23 anos, está se formando em psicologia, enquanto o filho mais novo é candidato à faculdade de direito. Variações Os dois tipos de repente mais conhecidos são o de viola, representado no festival da Casa do Cantador, e o coco de embolada, em que os cantadores são acompanhados pelo pandeiro ou pelo ganzá (um tipo de chocalho). Tanto um quanto o outro se baseiam no improviso de versos cantados, mas têm diferenças entre si. Na viola, canta-se muito a natureza, o sertão e a crítica social, enquanto a embolada tem um perfil mais puxado para a sátira. A tradição de ritmos que unem poesia e improviso está presente em diferentes regiões do Brasil, como no samba de partido alto, no Rio de Janeiro, o cururu, de São Paulo, e a trova, na Região Sul do país, em que geralmente o cantador é acompanhado por acordeão. Todas, por sua vez, remetem aos trovadores da Europa medieval, provável origem das atuais poesias de improviso presentes em diferentes culturas mundo afora. Saiba mais Repente de viola ; Cantoria. Apresentação feita de improviso a partir de motes, em que o cantador improvisa versos dentro de uma métrica e toca uma viola, geralmente a nordestina de sete cordas Pé de parede ; Apresentação de repentes em bares ou casas de família, em que dois cantadores ficam por mais de quatro horas improvisando, em diversas melodias, a partir de temas propostos pela plateia Sextilha, mote em 7 e mote em 10 ; Tipos de métrica usados nos versos do mote Mote ; Tema a ser cantado e também a frase que encerra cada verso Viola nordestina ; Possui sete cordas (três graves mais quatro médias e agudas). Seu miolo é fechado e as cordas tensionadas produzem sons mais secos, duros, bem característicos das cantorias Emboladores ; Duplas de cantadores do coco de embolada (ou embolada, simplesmente). Improvisam versos tocando pandeiro ou ganzá (tipo de chocalho). Os motes geralmente são cômicos ou satíricos 1; FESTIVAL REGIONAL DE REPENTISTAS De hoje a domingo, às 20h, na Casa do Cantador (QNN 32, área especial G, Av. Fundação Bradesco). Duelo entre 10 duplas mais participações de Roque José e Terezinha (coco de embolada) e do poeta Zé Cardoso. Shows de abertura com Forró Biju (sexta), Luizão (sábado) e Trio do Nordeste (domingo). Entrada franca. Classificação indicativa: 16 anos.

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