postado em 28/07/2010 07:00
Um homem que misturou completamente vida com teatro. Daí, ;ele ser tão absurdamente natural no palco, enquanto era extremamente teatral no dia a dia;. É com essas palavras que a atriz e diretora Bibi Ferreira define seu pai, Procópio Ferreira (1), homenageado de hoje do terceiro encontro do Mitos do Teatro Brasileiro, projeto que intercala cenas inéditas criadas pelo jornalista e dramaturgo Sérgio Maggio, a partir da pesquisa biográfica do artista, com depoimentos de convidados numa espécie de ;teatro-documentário;.
Desta vez, estarão no palco os atores Jones Schneider e Gê Martú, que há quatro anos não trabalhavam juntos, retorna ao tablado. Ainda haverá a participação do autor e dramaturgo Lauro César Muniz e do ator Bemvindo Sequeira, para falarem sobre a experiência e a influência que tiveram de Procópio Ferreira.
Um gigante nos palcos, apesar da baixa estatura. Um artista único de trajetória impressionante. Estreou com 19 anos, depois de ter sido expulso de casa pelo pai, que não via com bons olhos a carreira escolhida pelo filho. Já com 26, tinha a sua própria companhia teatral e arrastava multidões para os teatros. ;Vários aspectos da vida dele nos impressiona. Foi um ator incansável, com mais de 400 peças no currículo. Tinha uma preocupação em encenar autores nacionais e era conhecido no Brasil inteiro, mesmo numa época que não tinha mídia, tevê. Tinha uma popularidade impressionante. Era um apaixonado pela vida. Você percebia como ele gostava de estar ali, como ele amava o palco;, comenta Jones Schneider, que conseguiu um depoimento exclusivo de Bibi Ferreira gravado em vídeo e que será exibido hoje à noite.
As cenas protagonizadas por Jones Schneider e Gê Martú em o Mitos do Teatro Brasileiro vão alternar o bate-papo com o dramaturgo Lauro César Muniz, que teve o texto A infidelidade ao alcance de todos montado por Procópio, em 1966, e o ator Bemvindo Sequeira, que reviveu no teatro um dos papéis mais marcantes da carreira de Procópio Ferreira: o mendigo de Deus lhe pague (1933).
Lauro César revela que, quando ficou sabendo que Procópio encenaria o seu texto, nem acreditou, já que o ator era consagrado, e o dramaturgo estava apenas em começo de carreira. ;Foi algo meio inesperado. Altair Lima e o Walter Avancini, que era o diretor, chegaram pra mim e disseram que chamariam Procópio e o Rodolfo Mayer, que era outro monstro daquela época. Achei que seria difícil, mas eles aceitaram e nos três anos em que ficou em cartaz, o espetáculo foi um sucesso;, lembra.
Brilho incrível
Para o dramaturgo e autor de novelas, que chegou a assistir a Procópio no teatro quando menino, era impressionante como o ator conseguia se sobressair, mesmo quando não era o protagonista da peça. ;No meio de 10 atores, você só via ele. Ninguém no palco conseguia se destacar quando estava ao lado dele. Não era algo intencional, de querer tirar o espaço do colega. Era uma coisa dele. Tinha um brilho incrível;, recorda.
Já o ator Bemvindo Sequeira revela que sentiu um certo peso ao interpretar um personagem que consagrou Procópio Ferreira no palco e ainda, com a supervisão de Bibi, quando Deus lhe pague voltou a ser encenada em 1999. Certamente esse foi um dos melhores papéis que interpretou no teatro. ;Essa peça, que é do Joracy Camargo, é da década de 1930 e foi a primeira tentativa de um realismo socialista nos palcos; testou um teatro político e social no Brasil. Foi uma grande responsabilidade encená-la novamente e ainda com a Bibi Ferreira presente. Fui indicado ao Prêmio Shell e certamente marcou minha carreira;, acredita Bemvindo, que comemorou ontem os seus 63 anos em um jantar em Brasília.
O ator diz que espera acrescentar aos espectadores do projeto essas e outras história do teatro brasileiro com Lauro César Muniz e ajudar as pessoas a terem uma melhor compreensão de um período tão rico dos nossos palcos. ;É sempre bom reverenciar quem fez a história do nosso teatro e cultuar a memória desses grandes nomes. Procópio e tantos outros atores merecem;, destaca.
1 - Astro absoluto
Nascido no Rio de Janeiro, João Álvaro de Jesus Quental Ferreira (1898; 1979), batizou-se no palco como Procópio Ferreira (o nome provavelmente foi dado em homenagem ao santo do dia de nascimento do ator, 8 de julho) e tornou-se, em pouco mais de meia década, um astro absoluto em cena. Encenou cerca de 460 peças, 500 personagens, desde teatro de revista até tragédia grega e com menos de 30 anos já tinha a sua própria companhia de teatro. Pai da atriz e diretora Bibi Ferreira, trabalhou praticamente até o fim da vida, em 1979.
O nosso Procópio
Não é somente Procópio que vai ganhar uma homenagem logo mais. O ator Gê Martú, 73 anos, sendo 40 dedicados ao teatro e ao cinema, com participações na telinha também, está longe dos palcos desde 2008, quando passou a se dedicar mais à direção, às locuções e à leitura de textos. Mesmo com tanta experiência cênica, Gê confessa estar sentindo um friozinho na barriga, ainda mais em um projeto ligado a um monstro da dramaturgia.
;Retornar à atuação e ainda num projeto como esse é uma responsabilidade grande. Estou realmente conhecendo o Procópio agora, apesar de tê-lo assistido no teatro. Lendo muito sobre ele, por meio do texto do espetáculo que vamos apresentar. E é a forma didática mais fantástica de aprender. Vai ser uma verdadeira prova de fogo, mas estou muito feliz e vai ser uma honra;, comemora.
Gê Martú chegou a Brasília no fim dos anos 1960. Fez o personagem infantil Coelho Juju numa peça e aqui conheceu a atriz Gisele Lemper, com quem casaria e teria a filha, também atriz, Luciana Martuchelli. No Rio, ele era uma espécie de faz-tudo no teatro. ;Varria, limpeza, ajudava para ter acesso ao teatro, assistir às peças;, conta o ator, responsável por protagonizar um dos maiores sucessos do teatro brasiliense, Bela Ciao, de Mangueira Diniz.
MITOS DO TEATRO BRASILEIRO ; PROCÓPIO FERREIRA
Texto de Sérgio Maggio, com os atores Jones Schneider e Gê Martú e participações especiais de Bemvindo Sequeira e Lauro César Muniz. Hoje, às 19h30, no Centro Cultural Banco do Brasil Brasília (SCES, Trecho 2, Lote 22). Entrada franca. As senhas serão distribuídas na bilheteria com uma hora de antecedência. Telefone: 3310-7087. Não recomendado para menores de 12 anos. O CCBB disponibiliza ônibus gratuito saindo do Teatro Nacional a partir das 11h.