Diversão e Arte

Rapper reúne letras em livro com o sugestivo título A rima denuncia

Regina Bandeira
postado em 25/08/2010 07:00
Pioneiro do movimento hip-hop de Brasília, o rapper GOG resolveu transformar em poesia urbana as letras de 48 músicas de sua autoria. Seu primeiro livro, A rima denuncia, será lançado hoje, às 19h, na Fnac do ParkShopping, e revela momentos importantes da carreira do músico e histórias da cena da música negra brasiliense. A Rima Denuncia
Do rapper GOG. Global Editora. Número de páginas: 265. Preço médio: R$ 46. Lançamento na Fnac do ParkShoping, às 19h, com show de Black Music, com Ellen Oléria (voz), Kiko Santana (violão) e Buiu Bass (carron). O livro também será vendido no site do artista: www.gograpnacional.com.brO livro tem 265 páginas e, entre as mais de 100 músicas do repertório do artista, foram escolhidas as letras mais pujantes, de mensagens mais fortes. ;Escolhi os textos de melhor qualidade. Meu foco é na juventude;, adianta o compositor, de 45 anos, que rejeita o rótulo de poeta marginal. ;Produzo uma leitura divergente, me comunicando com o meu leitor. Diferentemente do Plano Piloto, nossas cidades não têm um museu ou um teatro, mas isso não nos deixa à margem. Isso nos coloca no centro do problema;, reforça o artista, que começou a escrever textos e músicas de protesto em meados da década de 1980. Escrevia, mas não conseguia espaço na cena musical da cidade. Em 1992, chegou a fazer uma parceria com o selo Discovery, em que lançou seu primeiro trabalho sonoro, Peso Pesado. Um ano depois, lançou o selo Só Balanço ; que além de seus próprios CDs, também apoiou artistas da black music contemporânea, como Dino Black, Japão, Mano Mix, Rapadura e Nêgo Dé. ;Tivemos de construir as coisas, abrir o caminho;, recorda. Gratuito O lançamento do livro terá um pocket show com a cantora e instrumentista brasiliense Ellen Oléria acompanhada pelos músicos Kiko Santana (violão) e Buiu Bass (carron/percurssão). No ano passado, a cantora produziu seu primeiro CD, com uma mistura de funk, hip-hop e samba. Também está programado um recital de poesias totalmente aberto à comunidade. O evento tem entrada franca. Dividido em oito capítulos, cada um deles abordando diferentes fases do artista, a publicação pode ser lida como um retrato da cena da música negra feita nas cidades- satélites do Distrito Federal nos últimos anos, tendo GOG como personagem principal. Para serem incorporadas ao livro, as letras passaram pela avaliação do professor de literatura Nelson Maca, um dos ativistas do movimento negro da Bahia que pontuou as letras, dando ao texto o sentido correto das intenções do artista. ;Uma coisa é ouvir a letra; outra, ler o texto. O Nelson nos ajudou nessa tradução das frases, que, dependendo da pontuação, podem expressar emoções e mensagens diferentes;, destaca. A educação é uma área sensível para o músico, cuja mãe é professora. ;Costumo dizer que estudo é escudo. Fui alfabetizado com os livros da Cecília Meirelles;, lembra o músico, que se formou em economia. ;Não quero mudar ninguém, mas é sempre bom poder aumentar a autoestima das pessoas, ampliar seu campo de visão;, argumenta o músico. Durante a entrevista ao Correio, GOG se preocupa com os conteúdos políticos de suas frases. Não gosta de dizer rap, mas ;rep; (;para aproximar da língua brasileira;) e chama seus shows de ;celebração;. ;Não faço show, celebro. Celebrar deixa saudade, traz a ideia de união em torno de um momento. Na celebração você bate papo, desmistifica o artista. É diferente de sair de casa, fazer um evento, voltar e nem olhar a comunidade;, argumenta o músico que fez de sua produtora uma espécie de coletivo ; grupo de pessoas interessadas em discutir seus problemas ; em que música, poesia e luta social convivem integralmente. Em novembro, GOG lança seu 10; CD, em pleno dia da Consciência Negra (20). A rima tem urgência, o caso é complicado Tem que ser certeira, não pode errar o alvo A rima denuncia e sacrifica... A rima não se silencia nos lamentos nos desgostos É eterna, seu autor nunca está morto ... Cheguei pra ficar, entrei no ar, o meu lema é expressar O meu modo de agir, de pensar, sem me deixar levar Sou rapper, sou forte, sou GOG, então vamos lá! %u3000 %u3000 História Aconteceu quando eu fazia parte do grupo Os Caras, no final dos anos 80. Até aí eu procurava uma alcunha, e era conhecido como Genival. Foi quando fui apelidado GOG, iniciais do meu nome, pelo Dj Raffa e pelo Mc Vapo. O primeiro viria a ser produtor das minhas 4 faixas no Peso Pesado; o segundo, que era um talento muito evoluído para a época, influenciou a minha escrita, levada, a ponto das músicas dos meus primeiros trabalhos conterem citações dele em algumas faixas. Pois é, após gravar e lançar o vinil, começaram as apresentações. As pernas ficavam bambas diante de um público atento. O palco era uma grande arena. Eu já conhecia São Paulo, mas só de passagem, e aqui acontecem as primeiras apresentações na Terra da Garoa. Eu e o Dj Manomix éramos ainda muito inexperientes. A estrutura, mínima. Usávamos um tape deck, para soltar as bases. O Mano riscava e fazia viradas. Foi assim nosso primeiro contato com público paulistano, com os grupos locais e lendas, como o Natanael Valêncio. Foi um grande aprendizado para os capítulos que estavam por vir. Afinal era só o início... %u3000 Papo Cabeça 1 Dizem Que a responsabilidade chega com a idade... Que nada, meu Cumpadi! Vejo jovens rappers pela cidade, Pregando a moralidade, Por outro lado, vejo o quadro inverso: Velhos gagás à toa, no Congresso Alguém se vira e me pergunta: - Por que tanta ira? Vivo entre a mira do mala e do tira. Que sempre andam com um ferro A tira colo Você vacila, aí complica, Eles atiram, Te esfolam, Te estouram os miolos. Isso acontece aqui dentro, lá fora, a toda hora. Peso pesado, sempre carregado, Suportamos sempre calados, Estamos cansados... Mas esteja convencido: Quem fere com ferro, é sério, Um dia com ferro será ferido. -A culpa é de quem? Hein, responde? De quem se esconde? De quem se cala? Vai, fala, desentala, desencanta, Cara! Jogue, de uma vez, sobre a mesa As cartas! Peso pesado sempre carregado! - Dizer Que a responsabilidade chega com a idade, Isso é vacilar, é falar apenas um lado da realidade. Com muita falsidade, é omitir a verdade, Realçar safadagens, como sempre se faz neste País. Eu sou Marcão, um rapper, E falo com a razão, então, Vamos colocar alguns pingos nos is: Os da terceira idade tentaram, Falharam... Zombaram com muita miguelagem... Malandragem dando pelé, Um grande bonde num irmão de fé. Queremos nossa chance... Isso não é revanche! Estamos bem ligados, baseados no lance, Sabemos da conseqüência, Então, DF na seqüência. - Convivemos com a miséria, temos nossas idéias, Conceitos formados! Responsabilidade Com poucos anos de idade. Junto com a necessidade de ter o que comer Pra sobreviver, E não, após anos de estudo, Como manda a cartilha de um certo poder... - Aí, GOG, manda ver! - Se você ouviu, gostou, botou fé, Estamos juntos pro que der e vier! Mas, se você, meu camarada, chega como quem, Quem não quer nada, E, simplesmente, critica o que eu digo, Sem saber onde vivo, Pegue um jornal, leia um artigo. Defina fome, inimigo, bandido, medo, violência, Perigo... Amigo, matilha, poder, Família! É, você terá definido o Brasil. - E sabe o que mais? A resposta está na cara dos caras Que sempre falham, Nunca encaram com seriedade. Quase sempre, ninguém nada sabe viu ou ouviu. - E aí? Vamos mudar a voz do Brasil?

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