Nahima Maciel
postado em 25/08/2010 07:00
Trabalhar em grupo ajuda a potencializar ideias. Nem sempre é simples. Quando muitas cabeças pensam ao mesmo tempo pode haver choques. Mas as afinidades costumam prevalecer e gerar bons frutos. A necessidade de viabilizar projetos, estudar e compartilhar é a responsável por juntar jovens artistas de Brasília em coletivos de arte. Grupos que se unem para pensar e produzir coletivamente são frequentes em toda a história da arte. Muitos movimentos nasceram na coletividade e a maioria teve tempo de existência limitado. Em Brasília, o Corpos informáticos, gerado no Instituto de Artes da Universidade de Brasília (UnB) há 18 anos, é o mais antigo e estável da cidade, mas muitos apareceram e desapareceram depois de gestar bons trabalhos. O Diversão saiu em busca dos coletivos atuais, aqueles que estão com trabalhos em cartaz em alguma exposição ou mostraram obras em apresentações recentes.
Entreaberto
Gustavo Magalhães, Sabrina Lopes e Polyanna Morgana sentiram um vazio quando terminaram o mestrado na UnB. Queriam continuar os estudos e resolveram que fazer isso juntos podia ser uma boa ideia. E foi. O Entreaberto passou de grupo de estudos a coletivo e já assina oito trabalhos. O mais recente está em cartaz na exposição Aos ventos que virão; Brasília (1960-2010). ;Acho que trabalhar em grupo é mais uma facilidade do que uma dificuldade. Um apoia o outro, conseguimos realizar projetos mais caros;, acredita Magalhães. Cada integrante tem trabalho independente, mas um interesse comum une o grupo. O Entreaberto tem diálogo afinado quando se trata de refletir sobre a poesia visual. A palavra é importante na produção do grupo. ;No início gostávamos muito de poesia visual, de trabalhar com a palavra. Tem esse link, todo mundo gosta;, garante Sabrina Lopes.
Mesa de Luz
O coletivo nasceu de apresentações na festa Funfarra. O VJ Hieronimus do Vale queria realizar projeções diferenciadas e convidou a artista plástica Marta Mencarini para participar com performances. Os movimentos de Marta eram registrados e editados ao vivo com equipamento improvisado até o grupo decidir por uma segunda mudança: sair das apresentações em festa e produzir um trabalho de videoarte com elementos sonoros, visuais, cênicos e plásticos. A dupla convidou então Tomás Seferin ; encarregado das intervenções sonoras ao vivo ; e projetaram uma mesa de vidro sobre a qual Marta encena as performances enquanto uma câmera instalada por baixo capta as imagens. Para funcionar, o trio deve estar em sintonia muito precisa. ;É tudo muito conversado, em grupo mesmo. É um trabalho de cinema ao vivo;, diz Marta. ;É como se estivéssemos tocando um instrumento;, completa Hieronimus. O grupo apresentou o trabalho no ano passado durante o Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (File), evento mais importante do país para esse tipo de linguagem. Em julho, o Mesa de Luz fez parte dos selecionados para o festival Depois das fronteiras, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Agora, o coletivo prepara o espetáculo Cubo, em parceria com a Companhia B de Teatro, que se apresenta no Museu da República durante o festival de teatro Cena Contemporânea.
João Angelini e EmpreZa
Angelini é o único integrante brasiliense do coletivo goiano EmpreZa. Formado há 10 anos e composto por oito integrantes, o coletivo realiza performances por todo o Brasil. Convidado para fazer parte do grupo há dois anos, Angelini deveria participar com apoio técnico para as performances dependentes de equipamento audiovisual. ;Mas acabei participando e fizemos várias apresentações pelo Rumos 2009;, conta. Acostumado a trabalhar principalmente com animação, Angelini bebeu nos experimentos performáticos do EmpreZa e emprestou um pouco da própria experiência ao grupo. ;O barato de trabalhar coletivamente é o fato de ter 10 cabeças pensando em um único trabalho. Eu não acredito muito em autonomia da obra: a gente constrói o trabalho, mas a autoria é de tudo o que está à nossa volta. Em um coletivo isso fica mais evidente.;
Sem nome
Quando Wesley de Souza, Lauro Gontijo, Fernando Nífio, Clarissa Paiva e Netinho Maia decidiram trabalhar juntos, a intenção era cumprir uma tarefa cobrada em disciplina do curso do Instituto de Artes Visuais da UnB. Produziram então o quadro A cara de Brasília, uma pintura de 2,10mx1,70m, confeccionada a 10 mãos, em três turnos formados por duas duplas e um trio. A pintura acabou inscrita no edital do Prêmio Marcantonio Vilaça, da Funarte, e premiada com R$ 90 mil. ;O trabalho foi pensado coletivamente. Como é muito grande, fizemos por partes e usamos a temática do aniversário de Brasília;, adianta Wesley de Souza. Para atender às exigência do edital, a pintura deve permanecer inédita até a exposição com os outros selecionados. O artista adianta que o resultado é um grande mosaico de cenas e paisagens da cidade. ;Além dos grandes monumentos, estão lá os detalhes da nossa vizinhança e o que marca a nossa imagética da cidade.;
Antiprosa e Oitava casa
No papel com formato e apresentação visual semelhante a uma bula de remédio lê-se uma tentativa de explicar o sentido de uma obra de arte. O pequeno papel pode ser visto como parte do Projeto malote na exposição Obra inventário, em cartaz no Espaço Cultural Marcantonio Vilaça. Concebido por Átila Regiani, Rebeca Borges e Luciana Fernandino, esteve entre os selecionados para o Rumos 2006, programa do Itaú Cultural destinado a mapear os artistas jovens do Brasil. Desde então, o Antiprosa ficou um pouco de lado e cedeu espaço ao Oitava casa, mais concentrado em projetos de curadoria. O grupo ganhou Mayra Miranda e Mariana Ventorim e passou a concentrar esforços na criação de projetos de curadoria e arte-educação. O coletivo já realizou seis exposições, todas experiências inusitadas. Em Play replay, o público precisava voltar várias vezes à galeria para acompanhar a confecção da obra e em Embreve os artistas aceitaram participar de uma exposição que estava sempre prestes a acontecer, mas nunca chegava a ser realmente concretizada. Obra inventário tem projeto educativo com maquetes de museus e miniaturas de obras destinadas às brincadeiras das crianças. ;Desde o início dos projetos a gente conversa e pensa em como articular o educativo, sempre muito integrado à exposição;, avisa Regiani. ;O Oitava casa funciona para produção de conhecimento e o Antiprosa é mais para o trabalho como artista. Na UnB nossos pensamentos já convergiam. Trabalhamos muito com a questão do texto, o que subsidia e circunda o objeto de arte;, diz Rebeca.
Samba
Lucas Gehre, Gabriel Mesquita e Gabriel Góes não gostam da palavra coletivo. Preferem a identificação ;grupo;. Assim, acreditam passar uma imagem mais fiel do Samba. ;Trabalhamos juntos mesmo. Somos muito unidos;, diz Lucas. A primeira edição da revista Samba foi publicada no ano passado e o segundo volume está em fase de conclusão. O trio concebe os desenhos e edita o material sempre em conjunto. Nada é feito individualmente na Samba. De uns tempos para cá, eles resolveram mostrar ao público como funciona e passaram a fazer as Performances de desenhos. Primeiro, estabelecem um tema. Depois, desenham juntos sobre uma superfície que pode ser papel ou parede. ;A gente consegue um resultado bem homogêneo;, garante Gehre. O fruto mais recente está no Espaço Cultural Contemporâneo (Ecco) e faz parte da mostra Aos ventos que virão; Brasília (1960-2010).