Diversão e Arte

Chefs oferecem feijoada com pequenos toques gourmet

postado em 18/09/2010 08:00
Ninguém sabe ao certo se seu cozimento começou na senzala para aproveitar as partes menos nobres dos porcos abatidos ou se ela chegou à casa grande por influência do cozido português ou do cassoulet francês. O fato é que ela se tornou um prato tipicamente brasileiro, quase uma unanimidade nacional. Com um preparo que dura dias, ingredientes selecionados e uma busca constante pela culinária tradicional, a feijoada ganhou ares refinados e faz sucesso. Em Brasília, ela é preferência no almoço de sábado em grandes restaurantes. Para receber bem os clientes, os chefs apostam no requinte na hora de servir, em um ambiente com trilha sonora e na liberdade de comer à vontade. E, claro, pequenos toques gourmet que deixam o prato popular com gosto de requinte.

A combinação de linguiça, paio, charque, costelinha, orelha, rabo e pé de porco com feijão surgiu no século 19 e logo se tornou um prato tipicamente brasileiro, consumido em todo o paísLinguiça, paio, charque, costelinha, orelha, rabo, língua e pé de porco misturados e cozidos com feijão preto. O tempero, cada um tem o seu, mas é importante não se esquecer do alho, da cebola e de um toque de pimenta-dedo-de-moça. De acordo com o historiador Luís Câmara Cascudo, autor do livro História da Alimentação no Brasil (Global Editora), essa mistura surgiu no século 19 e foi uma adaptação brasileira dos cozidos europeus, como o cozido português feito com diversos tipos de corte de carne, legumes e feijão branco. Apesar de ser conhecida mais por sua forma tradicional, em algumas regiões do país, a feijoada sofreu adaptações. No Nordeste, é comum juntar abóbora ou maxixe na receita ou usar o feijão carioca no lugar do preto.

Se a feijoada surgiu como um prato com carne de porco e feijão, com o tempo ela se tornou uma refeição completa. Porções de arroz branco, couve, farofa, torresmo e laranja fazem parte de um menu com as panelas de feijão. Nos últimos anos, ela ganhou status ao lado de pratos internacionais no cardápio. O jeito rústico e tradicional de servir é valorizado em restaurantes e para os apreciadores surgiram mais opções de degustação. Foram feitas sugestões de harmonizações com vinhos, mas a melhor bebida para acompanhar ainda é a caipirinha, servida de cortesia em muitos dos estabelecimentos para quem escolhe a comida típica da culinária brasileira.

Mesmo tendo um restaurante de cozinha internacional, no fim de semana Veloso se rende ao prato nacionalQuando o restaurante Carpe Diem surgiu, em 1991, a feijoada logo entrou no cardápio. Ela era servida em cumbucas individuais para os clientes, mas como os pedidos aumentaram com rapidez, os proprietários resolveram criar um buffet completo para que todos pudessem se servir à vontade, um modelo pouco conhecido na época. O sucesso foi imediato, e a casa na 104 Sul ficou conhecida pela forma de servir o prato, o que se repete até hoje todos os sábados.

Para o chef da casa, Fernando de La Rocque, o segredo de uma boa feijoada é a qualidade dos ingredientes e o cuidado com o preparo. Nada de pressa, portanto. Para o chef, uma feijoada gourmet exige dedicação de dias. ;Começamos a dessalgar (as carnes) na quarta-feira. Deixamos o feijão de molho, tudo feito com capricho;, salienta. É preciso dedicação também para garantir sabor. ;Você só consegue preparar uma comida boa se tiver um bom fundo de panela, que são os temperos básicos refogados. Usamos muito alho, cebola, alho-poró e louro para dar gosto;, conta.

Uma dica do chef para deixar a feijoada mais leve é cozinhar uma laranja inteira dentro do feijão com as carnes. Isso ajuda a tirar um pouco a gordura. O ritual, passado de geração para geração e conhecido por alguns cozinheiros, é usado no restaurante. Outro diferencial que La Rocque faz questão de oferecer aos clientes é a couve frita na hora, fresquinha. ;A linguiça também é frita no buffet e temos duas opções, com ou sem pimenta. Além de uma carré de porco e um pernil inteiro assado por horas;, diz.

La Rocque começa a preparar na quarta-feira a feijoada de sábadoNo meio do Clube de Golfe de Brasília (Setor de Clubes Sul), o restaurante Le Jardin du Golf, com um cardápio francês, italiano e contemporâneo, rendeu-se à gastronomia brasileira. Há um mês, os proprietários reservaram os sábados para um buffet de feijoada especial. ;Apesar de sermos um restaurante com culinária internacional, resolvemos apostar nesse prato típico brasileiro. Aqui, pode-se comer na varanda, um ambiente aberto. E ainda temos um grupo que toca bossa nova. Tudo combina com o prato;, comenta o chef Carlos Augusto Veloso.

Ele e a mulher, a também chef Cristiane Veloso, dão um toque diferente à tradicional feijoada ao utilizar, no prepraro do molho de pimenta, uma receita criada por eles mesmos. Ela leva os tipos malagueta, cumari e dedo-de-moça. O casal também aposta em uma entrada caprichada, com bolinho de arroz, caldinho de feijão, linguicinha frita e porção de minipastéis servida na mesa. Além de um cálice de batidinha de limão. ;Também temos um pernil especial. Ele é temperado com alecrim, alho, azeite, vinho e fica no marinado por dois dias. Depois vai para o forno e é cozido por 12 horas. Na hora de servir, ele fica com um aspecto de pururuca, uma delícia;, explica o chef. O casal colocou outro prato brasileiro que tem feito sucesso nas sextas-feiras: rabada com agrião e polenta.

Tempero caseiro

O espaço verde e o ambiente campestre também servem de pano de fundo para a feijoada no Empório da Mata (Jardim Botânico). O restaurante fica em uma chácara no Setor de Mansões Mata da Anta, que lembra as fazendas antigas de Minas Gerais, terra natal da proprietária Lídia Nepomuceno. ;Aqui, o clima é bem campestre, tem muita sombra, espaço para as crianças brincarem. Todo mundo chega aqui achando que vai comer galinha caipira, mas faço uma cozinha mais contemporânea. Mas, aos sábados, é sempre a feijoada;, conta a cozinheira.

O feijão e as carnes são servidos em panelas separadas de forma muito organizada. Segundo Lídia, a receita preparada no Empório é bem leve e tem o sal no ponto certo. ;Acho que a minha feijoada tem equilíbrio, é light dentro da medida do possível, é claro;, brinca. ;Faço um temperinho caseiro, bem básico para dar gosto na carne mas sem rebuscar muito, para que as pessoas sintam o sabor do feijão;, diz a cozinheira. Para completar, caldinho de feijão com ou sem pimenta e uma batidinha de maracujá ou limão de cortesia.

No Feitiço Mineiro (306 Norte), feijoada é sinônimo de festa. Com 20 anos de tradição na cidade, o restaurante serve a feijoada todos os sábados com um tempero especial: um show de chorinho. Além da música, o buffet de feijoada é servido com outros pratos mineiros como o tutu de feijão, galinha ao molho pardo e frango caipira, um verdadeiro banquete. ;É um programa bem família, não é apenas para almoçar, mas para chegar, curtir e ficar a tarde inteira;, sugere Selma Souza, gerente da casa.

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