Nahima Maciel
postado em 19/10/2010 09:47
Carlos Vergara confessa ter encontrado quatro portas de entrada para Brasília. A primeira consiste no respeito pela capital enquanto sede da República, seguida da admiração pela arquitetura e pela condição de cidade inventada. A última porta, a mais afetiva e sofrida de todas, foi uma estadia forçada no Planalto Central. Duas operações no joelho levaram Vergara a longas internações no Sarah Kubitschek. Impressionado com a habilidade dos cirurgiões em consertar suas articulações, realizou a série Hospitalares, conjunto de desenhos expostos na Referência Galeria de Arte. Carlos Vergara: pinturas e desenhos reúne 13 obras do artista, sob curadoria de Marcus Lontra, para comemorar o aniversário de 15 anos da galeria. Além dos desenhos, o artista gaúcho radicado no Rio de Janeiro mostra nove pinturas, investigações pictóricas realizadas com pigmentos, pó de mármore, areia e tinta sobre tela. São as monotipias nas quais Vergara se permite testar uma linguagem livre e um improviso que inclui a apropriação de materiais encontrados nos locais pelos quais já passou. ;Alguns lugares me motivam, têm uma carga de informação e mistério que é interessante tornar visível através do trabalho. Acabei me tornando um artista viajante;, admite. Uma das telas, feita no Pelourinho, em Salvador, agrega materiais coletados no chão do bairro baiano.
Em Brasília, Vergara pediu a amigos que recolhessem terra e areia do solo brasiliense para confeccionar uma série de três monotipias nas quais predominam as tonalidades ocre e vermelha. Trabalhou na galeria durante três dias. O resultado são composições bastante simples, de uma abstração que demanda um certo tempo de contemplação. Não se entregam ao primeiro olhar. ;Acho legal trabalhar com poucos recursos e construir algo que possa fazer sentido;, avisa o artista de 68 anos. ;Meu trabalho é uma mistura de dois jogos. Um jogo de dardos, na medida em que tenho um objetivo, e um jogo de dados, no qual a sorte vai intervir no resultado final.;
Vergara, que nos anos 1960 e 1970 adotou a linguagem da arte pop e do neoexpressionismo com trabalhos figurativos, há mais de três décadas se concentra na abstração. O gestual é fundamental no processo. É possível notar os caminhos da mão do artista nos percursos sugeridos pelo acúmulo de pigmentos. ;Meu objetivo é o quanto posso mobilizar o olhar das pessoas para coisas que aparentemente não têm significado. São elementos que, às vezes, você reconhece e às vezes não, mas que podem ter a capacidade de alavancar em você um raciocínio abstrato. O projeto é produzir coisas que possam ter sentido a partir do olhar do espectador.;
Na série Hospitalares, a figuração está presente na reprodução de mãos que se entrelaçam a desenhos de pedra lascada. ;A mão é o ponto final do cérebro;, constata o artista. Serve para a cirurgia, mas também para o desenho.
CARLOS VERGARA: PINTURAS E DESENHOS
Exposição de Carlos Vergara. Visitação até 15 de novembro, de segunda a sábado, das 10h às 22h, e aos domingos, das 14h às 20h, na Referência Galeria de Arte (Shopping CasaPark).