postado em 27/11/2010 08:00
Durante a Idade Média, era comum que um guarda fosse posicionado no alto de uma torre para, de lá, avisar toda a aldeia sobre algum perigo iminente. Espécie de guardiões de fortalezas modernas, os vigilantes noturnos desempenham função semelhante nos dias de hoje. A comparação é do diretor brasiliense radicado em Recife Marcelo Lordello, para explicar o mote do documentário Vigias, último longa da Mostra Competitiva em 35mm do 43; Festival de Brasília do Cinema Brasileiro e que será exibido hoje. ;Sempre morei em apartamento. Em Brasília, era na 416 Sul e sempre convivi com esse tipo de profissional. Tenho a sensação de que é bem frágil a tranquilidade que eles transmitem;, constata o cineasta.
A estreia de Lordello em narrativas longas desfia um novelo que começa com a observação de um ofício e termina por revelar a maior fobia moderna: o medo da violência urbana e o investimento em construções de verdadeiras torres de concreto para a classe média.
;Existe uma espécie de tendência à fortificação nas novas edificações. E focar-se nos seres humanos possibilita um diálogo para entender em que situação as cidades se encontram atualmente;, explica o documentarista.
Vigias apresenta histórias em Recife, uma das metrópoles mais violentas do país hoje, mas poderia ser filmado tanto na capital pernambucana, quanto em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. ;Na verdade, filmamos em Recife, mas não necessariamente o filme coloca a cidade em primeiro plano. Ela entra como ambiente e contexto. A gente trabalhou esse conceito de acompanhar turnos noturnos com vigias da cidade. A partir daí, relacionamos a questão do medo da classe média com a insegurança e as consequências disso;, admite o diretor.
Apesar de revelar método semelhante ao modelo de documentário observacional, Lordello garante que as semelhanças só existem em escala superficial. ;A questão é a relação da equipe com esses personagens, tendo como mote principal o trabalho deles, pessoas com senso crítico. Personagens solitários que trabalham à noite e esperam a manhã chegar para ir para casa. A nossa presença fez com que eles se abrissem e encontrassem interlocutores. Na verdade, somos parceiros de discurso. O meu e o deles;, acredita o realizador sobre as estrelas do documentário, Seu Ary, Seu Lucena, Pequeno, Damião, Samuel, Pedro e Gilm.
O diretor não é exatamente um estreante no FBCB. Um dos integrantes do coletivo Trincheira Filmes, Lordello filmou um incidente aparentemente banal numa escola secundária com tintas de suspense em N; 27, curta de ficção que participou da competitiva em 35mm no Festival de Brasília de 2008.
MOSCA NA PAREDE
Eternizado pela frase ;a equipe como uma mosca na parede;, o método de documentário observacional foi cunhado pela dupla norte-americana Richard Leacock e Robert Drew nos anos 1960. Os preceitos de Leacock e Drew rezavam que o documentarista não poderia dirigir-se de modo algum a seus entrevistados, trabalhando apenas com o registro do objeto documental, sem interferências.
Surpresas e cotidiano
; Um elemento surpreendente numa fotografia transforma o universo do fotógrafo Francisco numa viagem poética dentro da animação O céu no andar de baixo, estreia como diretor do animador mineiro Leonardo Cata Preta, 34 anos. Já o carioca Leonardo Pirovano não é exatamente um iniciante. Este ano, ele apresenta o sétimo curta-metragem da carreira, Custo zero, em que relaciona acontecimentos cotidianos, aparentemente sem propósito, como prova do inevitável. É o primeiro filme em 35mm do diretor.
SERVIÇO
Hoje, às 20h30 e 23h30, Mostra Competitiva 35mm no Cine Brasília (106/107 Sul; 3244-7777), exibição dos curtas-metragens O céu no andar de baixo, de Leonardo Cata Preta e Custo zero, de Leonardo Pirovano e do longa-metragem Vigias, de Marcelo Lordello. Ingressos: R$ 6 e R$ 3 (meia). Não recomendado para menores de 16 anos.