Volta e meia, Renato Aragão dá demonstrações de religiosidade e fé. O criador do cinquentão Didi Mocó, personagem que liderava o quarteto Os Trapalhões, já subiu de helicóptero ao Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, para beijar a mão da estátua, e chegou a andar mais de 150km a pé, em 1999, quando decidiu agradecer as doações do Criança Esperança, programa solidário da Globo, com uma caminhada de São Paulo até Aparecida do Norte. Por isso mesmo, foi na basílica da padroeira do Brasil que Jayme Monjardim decidiu começar e terminar o especial de fim de ano Eu sou Renato Aragão, que a Globo exibe dia 22, após Passione. ;Além de um grande talento, ele tem uma história incrível de vida que poucos conhecem e que vamos contar neste especial. Por exemplo, ele sobreviveu a um grave acidente de avião. Eu mesmo não sabia;, explicou o diretor, que vai aproveitar os passos do humorista da entrada até o altar da grande igreja para enumerar as diferentes fases da vida do artista.
A carga de emoção do especial fica por conta das surpresas reservadas ao próprio Renato, que só saberá seu conteúdo no dia da exibição. ;Vejo um movimento, mas escondem tudo de mim;, reclamou, em tom de brincadeira, em Aparecida, durante a gravação. Sigilosa, para que ele não descobrisse o que realmente o esperava. No santuário, que supostamente estaria vazio, para rodar uma simples caminhada até o altar, Renato viu o padre Hewaldo Trevisan, seu velho amigo, preparado para dar uma bênção. Mas o que deixou seus olhos cheios de lágrimas foi a presença de sua família de Sobral, no Ceará, quase inteira. ;Sempre acompanho os passos dele, mas tive de mentir hoje. Disse que ia à escola da Lívian ajudar em uma festa para não vir com ele;, confessou Lílian, mulher de Renato.
Antes, para que tudo saísse certo, a diretora Teresa Lampreia realizou um ensaio com um dublê. Um senhor, que teve ali sua meia hora de Renato Aragão, entrou e saiu da igreja algumas vezes até que todas as posições fossem marcadas. Tudo ao som de Romaria, de Renato Teixeira, imortalizada na voz de Elis Regina, cantada pelo coral do santuário. Foi esse o tempo que os familiares tiveram para conversar e, ao mesmo tempo, acenar para centenas de fãs que aguardavam, com eles, a entrada do homenageado. ;Dá muito trabalho gravar algo grandioso assim, mas meu pai merece todas as bênçãos e homenagens possíveis. Eu o divido com milhares de ;filhos; que ele divertiu nesses anos com sua alegria;, disse a filha Lívian, de 11 anos, a primeira a recepcionar o pai assim que ele entrou.
Renato já declarou em várias entrevistas que o trapalhão é seu alterego, quase um amigo pessoal. E a confusão entre criador e criatura foi reafirmada no altar. O padre parecia não diferenciar ficção da realidade, chamando o humorista de Didi durante a bênção. ;Já me acostumei com isso. Acho que só reafirma o sucesso desses 50 anos de trabalho. Mas o Didi não tem idade. Ele atravessa gerações;, opinou Aragão, enquanto se preparava para cumprimentar os fãs que lotaram a basílica.
Mais difícil que manter o segredo da homenagem foi furar o cerco dos fãs e tirar Renato Aragão do santuário. ;Quero ver se saio agora para voltar, anônimo, mais tarde. Quero assistir à missa;, disse. Isso antes de ser escoltado por vários seguranças no meio da basílica, enquanto uma multidão de pessoas tentava atravessar a barreira humana e tirar uma foto com ele. ;Nunca consegui isso. Já o vi aqui antes, mas não tenho foto com ele;, suplicou o estudante Jean Carlos de Castro Silveira, 16 anos. ;Meus amigos não acreditam que eu saiba tanto da vida dele e que admire tanto Os Trapalhões porque, quando nasci, o Zacarias já tinha morrido e o Mussum se foi três meses depois;, contou, emocionado, antes de, finalmente, abraçar o ídolo e sair com sua ;recompensa; na câmera digital.