postado em 02/12/2010 09:30
Um ano atrás, Marcelo Jeneci veio a Brasília para o projeto Pode apostar, que reuniu novos talentos da MPB no Centro Cultural Banco do Brasil. Ninguém nunca tinha ouvido o rapaz por aqui ; embora ele tivesse duas composições em trilhas de novelas (Amado, na voz de Vanessa da Mata, e Longe, cantada por Leonardo) ; e o teatro ficou com metade das cadeiras vazias. Quem teve a curiosidade de vê-lo no palco não se arrependeu. Jeneci fez um dos melhores, senão o melhor, show do projeto. Não tinha lançado CD, só duas músicas no MySpace. Mas a plateia dançou, vibrou e saiu de lá com um baita sorriso no rosto. Cadê o disco para comprar? Só chegou ontem às lojas. Gravado em fevereiro deste ano, com produção de Kassin e arranjo de cordas do maestro Arthur Verocai, Feito pra acabar traz 13 faixas compostas por Jeneci, algumas em parceria com Chico César, Arnaldo Antunes, Luiz Tatit e José Miguel Wisnik. Amadurecido durante um ano nos palcos antes de ir para o estúdio, o repertório é deliciosamente pop, doce, romântico, retrato do jovem que cresceu em Goianases, na Zona Leste (ou ;zona lost;, como ele brinca) de São Paulo, ouvindo música no rádio e na televisão. Tem um quê de Roberto e Erasmo aqui, outro de Odair José ali, e referências de uma vida inteira, do rock à moda de viola.
Embora tenha levado um bom tempo preparando o primeiro álbum, Jeneci diz que as coisas só se definiram mesmo um pouco antes de entrar no estúdio. ;Gosto de criar de forma coletiva, aberto a mudanças, ouvindo a opinião da banda;, ele conta. ;Mas o período de gravação foi bastante sofrido pra mim. Foi intenso, pesado, era como se eu precisasse me curar de algo. Foi um exercício terapêutico. Até porque ali estava um retrato da minha infância, as minhas referências;;
O peso da expectativa dos outros ; afinal, muita gente vinha falando dele, ;artista revelação; ;, Jeneci garante que não sentiu. Diz que quanto mais comentavam, menos importante se sentia. O que pesava, de verdade, era a questão pessoal. E o fato de ser um trabalho só dele, o primeiro, depois de 10 anos na música (como tecladista e acordeonista) acompanhando cantores como Vanessa da Mata e Arnaldo Antunes. ;Tinha que fazer de forma caprichada, né? Tentar imprimir meus 28 anos de vida em uma hora de CD. Quando ficou pronto, senti um alívio.;
Entre amigos
Filho de uma paulista e um pernambucano ; que sempre levou a vida como um ;Professor Pardal;, consertando, inclusive, instrumentos musicais ;, Marcelo Jeneci ganhou sua primeira sanfona de Dominguinhos, um dos clientes do pai. Também foi lá, na oficina paterna, que recebeu o primeiro convite profissional, aos 17 anos: tocar acordeom e piano na banda de Chico César. Foram quatro anos com o cantor paraibano e outros quatro com Vanessa da Mata, até entrar na banda de Arnaldo Antunes (de quem não pretende se afastar tão cedo) e tomar coragem para compor.
Com Arnaldo, ele escreveu seis canções de seu primeiro álbum: Longe, Quarto de dormir, Jardim do Éden, Copo d;água, Café com leite de rosas e Pense duas vezes antes de esquecer. Com José Miguel Wisnik, fez a mais impactante do disco, Feito pra acabar (ficou tão apaixonado pela música que a elegeu faixa-título), além de Dar-te-ei e Tempestade emocional. Com os dois amigos, Jeneci fez o mesmo: chegou a eles com uma ideia por terminar, uma letra que tinha travado em determinado momento e ele não sabia para onde seguir. Foi assim com quase todas as 13 faixas do CD, à exceção de Por que nós (com Luiz Tatit), Show de estrelas (com Carlos Rennó) e Pra sonhar, a única só dele.
Operário da canção
Jeneci começou a compor há pouco mais três anos, encorajado por um disco do Los Hermanos que ouviu no avião. De estalo, achou que poderia fazer algo parecido e comprou uma guitarra, instrumento que não sabia tocar, para ver no que dava. ;Foi meio instintivo. As músicas começaram a vir;, lembra. Quando conheceu Laura Lavieri, filha de um amigo já falecido (o cantor Rodrigo Rodrigues), ficou tão tocado ao ouvi-la cantar que quis logo formar uma duplinha, tipo Carpenters.
É Laura, hoje com 22 anos, quem divide com ele os vocais no disco ; e em todos os shows. E foi ao lado dela, na maior alegria, que ele lançou Feito pra acabar no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, há duas semanas. Numa das três noites de apresentações, o convidado foi Marcelo Camelo. ;Eu e Laura somos tão fãs do Los Hermanos que não acreditávamos que ele estava ali no palco. A gente ficou rindo o tempo todo;, conta.
Jeneci anda tão contente que já pensa no próximo álbum. Tem canções novas suficientes para uns dois discos, mas vem dedicando as manhãs ao exercício de compor. ;Gosto de pensar no que faço como um ofício, com um trabalho diário mesmo, de operário. E tenho que compor outras para amarrar um repertório. Antes, eu precisava de parceiros porque travava e passava a letra para alguém terminar. Hoje, estou gostando de dar conta da música sozinho;, comenta ele, que também anda doido para cair na estrada. ;Não vejo a hora de ficar exausto. Estou adorando trabalhar com tanta gente boa. Feliz mesmo, porque tudo tem sido o plano A. Agora, é só alegria.;