Diversão e Arte

Dupla comenta o desafio de traduzir o maior clássico de Alexandre Dumas

Thiago Lins
postado em 08/01/2011 09:20
Os três mosqueteiros foi originalmente publicado como folhetim no jornal Le Siècle entre março e julho de 1844. O primeiro título pensado para o livro foi Athos, Porthos e Aramis, alterado então para Os três mosqueteiros pelo editor do Siècle. Alexandre Dumas aceitou o título ao refletir que o seu absurdo (afinal, os mosqueteiros são quatro) contribuiria para o sucesso da obra. Também entre março e julho - de 2010 - André Telles e Rodrigo Lacerda enfrentaram o desafio de traduzir as mais de 600 páginas deste clássico - ou "mito cultural", como prefere Rodrigo - de Dumas. A parceria, que já havia rendido a belíssima edição do Conde de Monte Cristo (ganhador do Prêmio Jabuti 2009 de melhor tradução), preenche agora mais uma lacuna no mercado editorial brasileiro com esta nova tradução dos Mosqueteiros, contendo mais de cem ilustrações originais e duzentas notas explicativas. Grandes fãs de Dumas, Rodrigo e André se conheceram por meio de amigos em comum na editora Zahar. Após perceberem que tinham lido quase toda a obra do autor (e, no caso de André, já tê-lo traduzido; Napoleão - uma biografia literária e o incrível Grande dicionário de culinária), cogitaram então uma tradução a quatro mãos do Conde de Monte Cristo. "Lemos o romance na adolescência e desde então ele assombra nossos sonhos literários", brinca André. "A experiência deu tão certo, que quisemos repetir a experiência. A escolha óbvia foi Os três mosqueteiros", afirma Rodrigo. Além do ritmo puxado de trabalho, os problemas iniciais de uma tradução como essa são as muitas padronizações necessárias, afirmam os tradutores. "Logo de início, decidimos os termos de vestuário; o que seria um gibão, uma sobrepeliz, uma sobrecasaca. Além disso, houve a padronização dos pronomes de tratamento. Os mosqueteiros se tratariam por %u2018vós%u2019? Optamos por 'você', que tornaria a relação entre os amigos menos formal", explicam. Outra constante preocupação é a feitura das notas para o público brasileiro. "Um livro como o Romance da rosa ou uma referência à 'segunda Rochelle' devem ser algo familiar ao público francês", explica Rodrigo, ao mostrar as primeiras notas redigidas - "No entanto não é algo que faça parte do nosso imaginário; daí já não bastam as notas das edições estrangeiras". "Além disso, uma coisa me deixou muito feliz no processo de escrever as notas; é sempre um consolo você ver que os deuses também erram, descobri que uma das notas da edição da Pléiade (uma das mais respeitadas coleções do mundo) continha uma remissão a uma nota que não existia", brinca. Ação e humor Com suas muitas reviravoltas, duelos, trágicos casos de amor e a complexidade de alguns personagens, Os três mosqueteiros recusa o rótulo de romance "capa e espada". O humor, geralmente ausente nos romances de aventura (com aparições mais constantes em suas adaptações cinematográficas) é justamente um dos traços mais fortes do livro. "Ele, sociologicamente e psicologicamente, pode ser considerado menor que O Conde de Monte Cristo, agora o que o torna tão incrível e único? O humor que funciona muito bem, como na relação dos mosqueteiros e seus criados, que é hilária sempre, e muito bem dosada", reflete Rodrigo. "Além disso, a galeria de personagens é muito rica. Temos os quatro mosqueteiros, mais seus quatro criados, mais a Milady, mais o Cardeal Richelieu, mais o Rei. São personagens de primeira grandeza e muito bem feitos. A própria Constance Bonacieux não tem o temperamento de uma tradicional mocinha de romance. O Conde é uma figura central que ofusca os outros personagens. Podemos pensar em um protagonista em Os três mosqueteiros? É possível afirmar que Athos, por exemplo, divide com d'Artagnan o título de protagonista. Além disso, Richelieu é um personagem incrível, que com certeza também estaria no páreo.", finaliza. Largamente adaptado para o cinema, Os três mosqueteiros já protagonizaram desde um constrangedor musical russo até a mais recente e controversa versão de 2001, que segue os moldes de filmes de luta asiáticos, como O tigre e o dragão. Entre as mais conhecidas versões estão a de 1948; com Gene Kelly no papel de d'Artagnan e Vincent Price como Richelieu; a de 1973; com Charlton Heston no papel de Richelieu e Christopher Lee como Conde de Rochefort; e a de 1993; patrocinada pela Disney; talvez a pior adaptação já feita para o cinema, onde um péssimo Charlie Sheen interpreta Aramis e, por algum motivo sem explicação, Porthos é chamado de "Porthos, o pirata". Curiosamente, a versão que se mantém mais fiel ao espírito e à trama do original de Dumas é a versão de 1948, segundo Rodrigo, sua favorita com um "Vincent Price como o Cardeal Richelieu perfeito". Está prevista para 2011 uma versão 3D do clássico com o ótimo Christoph Waltz (Bastardos Inglórios) como o maléfico Richelieu. "Vai ser o primeiro filme em 3D que eu verei", brinca André. Ao serem questionados sobre a tradução das duas sequências do livro - Vinte anos depois e O Visconde de Bragelonne ', os tradutores afirmam que "as continuações serão feitas, no devido tempo. Depois de 1.900 laudas de Dumas (Conde Mosqueteiros) achamos que merecemos respirar outros ares". Neste momento, André Telles está envolvido com uma nova tradução de Vinte mil léguas submarinas de Júlio Verne e Rodrigo Lacerda trabalha em seus novos livros de ficção - um romance e um volume de contos. Até que a dupla decida voltar ao rico universo de Dumas, os Mosqueteiros merecem, certamente, uma visita de todo amante da literatura. Os três mosqueteiros De Alexandre Dumas. Tradução de André Telles e Rodrigo Lacerda. Jorge Zahar Editor, 688 páginas. R$ 69.

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