Diversão e Arte

Documentário Exit through the gift shop distoa das escolhas da Academia

postado em 29/01/2011 08:00
Um quê de estranheza paira sobre o Oscar 2011. A escolha do filme inglês Exit through the gift shop como concorrente a melhor documentário (na competição com o brasileiro Lixo extraordinário) destoa do tom conservador da Academia de Hollywood. Dirigido pelo grafiteiro inglês Banksy, Exit é mais uma provocação de um artista plástico acostumado a aplicar estratégias de choque no público. Desta vez, a verve do misterioso enfant terrible mira a credibilidade do mercado de galerias de arte. O longa é narrado pelo francês Thierry Guetta, um fã que se torna obcecado por filmar as criações de Banksy. Eis o primeiro enigma do longa-metragem: seria esse admirador um personagem de ficção?

A convivência com o ídolo cria uma inversão de papéis: mesmo sem talento algum para o ramo, Guetta resolve se transformar num artista de rua, atendendo pelo codinome Mr. Brainwash. Curiosíssimo com a aventura, Banksy passa a acompanhá-lo com a câmera. Além disso, o grafiteiro passa a promover exposições do pupilo, que atraem uma multidão predisposta a admirar as ;ousadias; do novo queridinho do underground. Em tom de farsa, o filme aponta a mira para o público de arte contemporânea: até que ponto o hype (produzido pela mídia, pelos fãs e pelos próprios artistas) valida a arte?

A presença de Banksy na cerimônia da Academia é incerta. Os fãs já se perguntam: se a produção sair vencedora, quem subirá no palco para receber a estatueta? O artista, cuja identidade é mantida em sigilo, nunca fez sequer uma aparição pública exibindo o próprio rosto. Em geral, se apresenta usando um capuz ou vestido com a máscara de um macaco. Alguns suspeitam que ele represente um coletivo de criadores. Em julho de 2008, o jornal Daily Mail fez alarde ao supostamente desmascará-lo. Segundo o jornal, o nome do artista seria Robin Gunningham. Ele seria o segundo filho de uma família de classe média baixa em Bristol e teria se desviado do ofício de açougueiro muito cedo para se dedicar à arte de rua.

Nenhum dos entrevistados confirma se Gunningham é mesmo Banksy e não existe qualquer prova concreta da relação entre os indivíduos. A história, contada bem ao estilo da imprensa britânica, nunca foi confirmada, mas rendeu o burburinho necessário para vender jornais. Ano passado, Banksy voltou a protagonizar as manchetes no mundo inteiro com uma versão da famosa abertura do desenho animado Os Simpsons. Na peça, crianças orientais desempenham trabalho escravo para fabricar produtos da série enquanto animais em extinção são usados como força de trabalho.

A única declaração do artista após o anúncio do Oscar transformou-se em mais um de seus petardos. ;Eu não concordo com o conceito de cerimônias de premiação. Mas estou preparado para abrir uma exceção para aquela em que estou indicado: a última vez que um homem pelado, pintado de dourado, esteve na minha casa era eu mesmo.;

Mal-estar
Os primeiros trabalhos do grafiteiro começaram a aparecer durante o chamado ;boom do aerosol; na década de 1980 em Bristol, interior da Inglaterra, quando a cultura hip hop tomou o espaço do movimento punk da década anterior. O estilo inconfundível de Banksy é exercitado com a mistura das técnicas de estêncil e spray. Todos os trabalhos de rua do artista são acompanhados de fortes mensagens políticas feitas com bom humor. O riso diante de uma cena engraçada é substituído pelo mal estar e pelo incomodo.

As instituições britânicas também são alvo do grafiteiro. Em um deles, o célebre retrato da rainha Elizabeth II foi substituído pelo rosto de um chimpanzé. Na Inglaterra, os conceitos se confundem. Banksy era tratado como um vândalo, mas depois que o mercado de arte se interessou por seus trabalhos passou a ser tratado como um tesouro nacional. Nos últimos tempos, o grafiteiro tem espalhado sua arte de guerrilha pelo mundo. Ele já esteve na Palestina para deixar sua marca no muro que separa aquele território do de Israel. E o Museu do Louvre, na França, recebeu a contragosto uma Monalisa estilizada.

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