Diversão e Arte

Livro conta a história de africana e seu envolvimento com ingleses

postado em 13/02/2011 08:00
<b>PEQUENA ABELHA</b><Br>De Chris Cleave. Editora Intrínseca. Tradução de Maria Luiza Newlands. 272 páginas, R$ 29,90.Sabe aqueles livros em que o leitor, quase chegando ao fim, tem uma vontade louca de aplaudir? Melhor: fica poupando as últimas páginas para saboreá-las devargazinho enquanto lamenta estar no capítulo final. Dizem que a receita para um bom livro ; e um bom filme ; é saber contar uma boa história. Isso o inglês Chris Cleave conseguiu muito bem em Pequena Abelha, lançado no Brasil pela Editora Intrínseca.

Nos Estados Unidos, a obra ancorou no primeiro lugar dos best-sellers do jornal The New York Times. Publicado em 20 países, está sendo adaptado para o cinema, com produção e atuação da australiana Nicole Kidman.

São pouquíssimos personagens. Não mais do que cinco: Sarah, editora chefe de uma revista feminina; o marido, Andrew, colunista em um jornal londrino; o filho Charlie, de 4 anos, eternamente apegado à roupa de Batman; Lawrence, funcionário público do Ministério do Interior e amante de Sarah, e Pequena Abelha. Em torno dela, como se fosse mel, gravitam todos.

;As vezes, eu penso que gostaria de ser uma moeda de uma libra esterlina em vez de uma menina africana. Todo mundo ficaria satisfeito ao me ver.; De forma crua e sem adereços, assim começa o livro. Nascida na Nigéria, grande produtor de petróleo e nação marcada por conflitos étnicos, ela viu a família e a aldeia serem massacradas. Só encontrou uma forma de escapar: correr durante a noite e esconder-se de dia. Assim, chega a uma praia. Não por acaso, é onde Sarah e Andrew decidem passar uma semana de férias.

O destino do casal e o da africana ficam grudados para sempre. Pelo menos, na imaginação do leitor. Sem querer estragar o prazer do livro, basta saber que Pequena Abelha esconde-se em um enorme contêiner de navio e chega à Inglaterra, onde fica trancafiada durante dois anos em um centro para refugiados. Um lugar em que, para se conseguir um simples comprimido que alivie a dor de cabeça, é preciso fazer um requerimento com antecedência de 24 horas. Mas o que interessa é que a adolescente encontra o endereço de Sarah, que mora em um subúrbio a 40 minutos de trem de Londres.

Chris Cleave delineia os personagens com traços do coração. Tem sensibilidade para descrever as brincadeiras do herói-mirim Charlie, para imaginar o que se passa na mente e na alma de meninas nigerianas, tanto no país delas, quanto na cinzenta Grã-Bretanha, onde o livro chegou em 2008.

Formado em psicologia pela Universidade de Oxford, o autor, nascido em 1973, em Londres, onde mora com a mulher e três filhos, tem uma coluna no jornal The Guardian. Seu primeiro livro, Incendiary, publicado em 2005, venceu prêmios, como o Somerset Maugham e o especial do júri do Prix des Lecteurs. Aborda um ataque terrorista a um jogo de futebol do Arsenal e também ganhou versão cinematográfica, em 2008, estrelada por Ewan McGregor e dirigida por Sharon Maguire. Atualmente, o escritor esboça trama sobre amizade e rivalidade, sentimentos vivenciados por dois atletas.


Cinco perguntas - Chris Cleave

Por que você decidiu escrever sobre imigrantes africanos?
Em 1994, quando eu era universitário, trabalhei alguns dias em um centro de detenção de imigrantes em Oxfordshire. Conversei com muitos refugiados e vi que era injusto eles estarem presos. Não é crime ser um refugiado. Decidi que um dia iria escrever sobre o que acontece com um refugiado que chega a Londres, sobre a maneira como são tratados. Sem falar que meu país explorou os africanos e suas riquezas durante muito tempo.

Você é formado em psicologia pela Universidade de Oxford.
Como isso o ajudou a construir os personagens?
Por estudar psicologia de gênero, comecei a analisar se existe mesmo um ponto de vista masculino e outro feminino e tentei apurar essa linha ao compor os personagens. Fiz bastante pesquisa sobre stress pós-traumático, depressão e suicídio. Isso me ajudou a escrever de maneira realista. Escrevi sobre gente despedaçada por fatos da vida porque admiro a força delas na própria reconstrução. É necessário ser uma grande pessoa para redescobrir a felicidade depois de experimentar o pavor.

Como foi a pesquisa para o livro?
Passei um ano entrevistando refugiados, médicos, assistentes sociais. Li bastante também. Antes de 1992, o Reino Unido não tinha qualquer centro para refugiados e, em 2008, quando publiquei o livro, havia 10 instituições. Segundo dados oficiais, 4 mil pessoas pediram asilo no Reino Unido nos últimos quatro anos. Cerca de 25% conseguiram o status de refugiados e o restante foi rejeitado. Enquanto os aprovados aguardam os papéis, eles ficam nos centros de detenção ou moram em comunidades com pouquíssimos recursos, além da proibição de trabalhar. Então, eles ficam condenados a viver na pobreza ou trabalhar ilegalmente. Agora, existe uma grande diferença em relação aos imigrantes, muitos estabelecidos na Inglaterra por várias gerações, como os britânicos-jamaicanos, os britânicos-indianos.

Você já foi à África?
Passei minha infância na República dos Camarões, mas não voltei mais lá depois de adulto.

Qual é o seu projeto literário atual?
Estou trabalhando em um livro sobre os limites da amizade. É sobre dois atletas, que são amigos e também rivais. Psicologicamente, é bastante intenso.

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