postado em 22/02/2011 08:32
O centenário de nascimento de Custódio Mesquita (1910/1945), completado em 2010, passou sem que quase ninguém lembrasse. Uma homenagem solitária é o disco Junte tudo que é seu;, no qual, acompanhado pelo pianista Gustavo Sarzi, o cantor paulistano Carlos Navas interpreta 13 composições de Custódio. Gravado em novembro do ano passado, o álbum está sendo lançado agora. Com certo atraso, mas fazendo justiça à reverência devida ao compositor, pianista e maestro carioca, que teve importante papel na era de ouro do rádio brasileiro. São dele clássicos do cancioneiro nacional, como Nada além (com Mário Lago), Saia do caminho (com Evaldo Rui) e Mulher (com Sadi Cabral) ; todas regravadas até hoje, mas conhecidas principalmente na voz de Nelson Gonçalves.As duas primeiras estão no disco de Navas. ;Não gravei Mulher porque não senti que a minha leitura acrescentasse um diferencial. Mas canto no bis do show;, explica o cantor, que em 2007 dedicou um CD a outro personagem da história do rádio, o cantor Mário Reis. Ele conta que passou por processo ;intuitivo e até mediúnico; para chegar ao repertório. ;Li duas biografias dele, Prazer em conhecê-lo, de Bruno Ferreira Gomes, e Custódio Mesquita ; Um compositor romântico no tempo de Vargas, de Orlando de Barros. Passei a ouvir suas composições em gravações de Araci de Almeida, Sílvio Caldas, Isaurinha Garcia, Nelson Gonçalves; O que sentia que poderia dar uma leitura minha, separava.;
Nessa imersão, uma coisa encantou o intérprete: ;A doçura das melodias me hipnotizou. São deliciosas de cantar. Deixaram a minha voz ainda mais macia. Cantei sem inventar nada, cantei as melodias, sendo, de fato, um instrumento da canção;. E a primeira audição foi em um recital, em setembro do ano passado, no Rio de Janeiro, para plateia que incluía familiares do compositor. ;Devidamente aprovado, batalhei para chegar ao estúdio.; Isso aconteceria em novembro. Junte tudo o que é seu; foi gravado direto, voz e piano, como numa apresentação no palco.
;As minhas gravações de que mais gosto foram feitas assim, como Resposta, que gravei no Tributo a Maysa (coletânea lançada em 2007). Sempre quis fazer um disco de voz e piano, Mas não seria por uma razão gratuita. Custódio foi um pianista excepcional, elogiado pelos melhores da época. Tom Jobim expressou várias vezes a influência dele em sua obra.; O piano em Junte tudo o que é seu; ficou a cargo de Gustavo Sarzi, ;pianista jovem, de 28 anos, extremamente talentoso, discípulo de Egberto Gismonti, com quem me sinto bastante à vontade;, descreve Carlos Navas.
Mas Sarzi não foi o único parceiro no estúdio. Rosa Maria Colyn foi convidada a cantar com Navas a clássica Nada além e Alzira E., Nossa comédia (outra parceria de Custódio com Evaldo Rui). ;Nada além é um fox, coisa que Custódio fazia muito, sob influência da música americana. Desde o início pensei em Rosinha, que conheço há anos, quando nem pensava em cantar. É uma pessoa boníssima, muito espiritualizada e uma das nossas melhores ladies singers;, elogia. ;Alzira é minha madrinha musical. Já gravei quatro canções dela e cantamos juntos diversas vezes em shows, inclusive em Brasília, mas não tínhamos gravado juntos. Sentia que Nossa comédia precisava de algo que acentuasse sua força dramática, mas sem exageros. E ela deu a medida exata.;
Criação intensa
Nascido no Rio de Janeiro em 1910, numa família de posses, Custódio estudou piano desde menino. Formou-se em regência pela Escola Nacional de Música e em 1930 mostrou as primeiras composições. Noel Rosa foi seu primeiro parceiro, em uma única música: Prazer em conhecê-lo. Custódio ganhou projeção quando Ramon Navarro, astro hollywoodiano que visitou o Brasil em 1934, gravou Se a lua contasse. Fez parcerias com Mário Lago, Sadi Cabral, Joracy Camargo, David Nasser, Orestes Barbosa e, principalmente, com Evaldo Ruy. Foi gravado por Carmen Miranda, Carlos Galhardo e Orlando Silva e outras grandes vozes da época. Saia do caminho, seu maior sucesso, foi lançada um ano após sua morte, na voz de Dalva de Oliveira. Custódio Mesquita morreu de doença hepática, aos 34 anos, em 1945.
JUNTE TUDO O QUE É SEU;
Nono disco do cantor paulistano Carlos Navas. 13 faixas, arranjadas por Gustavo Sarzi e produzidas por Carlos Navas. Distribuição Tratore (também pelo site www.carlosnavas.com.br). Preço médio: R$ 24.