Diversão e Arte

Aos 74 anos, ilustrador tem parte de sua obra reunida em livro

postado em 08/03/2011 08:30

Não seria exagero dizer que o trabalho do artista gráfico José Luiz Benicio é dos mais conhecidos no Brasil ; talvez, o mais conhecido do país. E não teria como ser diferente. Primeiramente, pela qualidade de sua produção. Segundo, porque Benicio tem quase seis décadas de carreira profissional e continua em plena atividade até hoje, aos 74 anos. Ao longo dessa trajetória, ele trabalhou para as maiores e mais prestigiadas agências de publicidade, editoras e marcas brasileiras, além de ter feito diversas ilustrações para empresas estrangeiras. Seus trabalhos mais recentes foram para a Granado Pharmácias e para a cerveja Stella Artois (este, para Londres).

Se numa primeira olhada os desenhos ao lado e o nome desse ilustrador gaúcho (radicado desde os anos 1950 no Rio de Janeiro) não lhe disseram nada, fique tranquilo. Certamente você já esbarrou com alguma capa de livro, revista ou disco feita por ele, alguma embalagem de produto de beleza, rótulo de bebida ou cartaz de cinema (para a sétima arte, ele fez mais de 300). Sabe os pôsteres dos filmes dos Trapalhões? Isso mesmo, são todos de autoria de Benicio.

Benicio fez mais de 3 mil capas para a Monterrey, sempre com belas mulheres, como a espiã sexy Brigitte Monfort (foto ao lado)Mesmo fazendo parte da memória visual brasileira, Benicio nunca teve sua arte devidamente catalogada, republicada em livros, para o deleite visual de seus incontáveis admiradores. Com exceção da ótima biografia escrita pelo jornalista Gonçalo Junior (lançada em 2006 pela editora Cluq), nenhuma publicação se dedicou a perfilar o artista e sua vasta produção. Isso até agora.

O livro Sex & Crime ; The book cover art of Benicio, volume 1 foi lançado em fevereiro, na abertura da exposição que ficou em cartaz até o dia 26, na galeria Cartel 011, em São Paulo. Lá, puderam ser admirados 80 originais ; todos à venda (os preços variavam entre R$ 3 mil e R$ 4 mil cada). A iniciativa do livro e da exposição veio do editor Ricardo Antunes, responsável pela revista Ilustrar ; e que, com a publicação dedicada a Benicio, estreou a Reference Press.

;A revista é on-line, gratuita, tornou-se bastante conhecida no Brasil e, mais ainda, no exterior. Entre seus fãs está Alberto Ruiz Diaz, ilustrador americano, dono da editora Brandstudio Press. Com a Ilustrar, acabamos nos conhecendo e viramos grandes amigos. Dessa amizade surgiu a proposta do Alberto de fazermos uma parceria, em que eu criaria uma editora para publicar principalmente artistas brasileiros. Daí, surgiu a Reference Press. E o artista para o livro de estreia sempre foi o Benicio, devido à importância que ele tem na história da ilustração do Brasil;, comenta Antunes.

Tiragem limitada
O título do livro é sugestivo, mas não necessariamente óbvio. Até porque aborda uma produção de Benicio feita entre as décadas de 1960 e 1980: as capas ; sempre com belas mulheres ; dos romances de espionagem publicados pela editora Monterrey, com especial destaque para as capas da série ZZ7, que apresentou ao público a espiã sexy Brigitte Monfort.

;Eu e o Antunes escolhemos as nossas capas preferidas;, conta Benicio por telefone, de sua casa (onde funciona seu estúdio), no Rio. ;Teríamos material para não sei mais quantos outros livros. Fiz muita capa para a Monterrey.; Das 3 mil capas produzidas para a editora, o livro apresenta mais de 60, além de rascunhos e uma página sobre a carreira de Benicio. O desenhista adianta que, da parceria com a Reference, sairão mais dois livros, cada um sobre um tema. ;Um seria sobre cartazes de cinema e o outro sobre a minha produção para publicidade.;

Os interessados em conseguir um exemplar de Sex & Crime terão de correr atrás. A tiragem é pequena, parte já foi vendida na exposição, parte irá para o exterior e o restante não será distribuído para livrarias, podendo ser adquirido apenas pelo site da editora (por enquanto, no endereço referencepress.blogspot.com). As vendas devem começar neste mês. A estratégia, segundo Ricardo Antunes, é baratear o preço do livro. ;No processo normal de produção editora-distribuidora-livraria, a fase da distribuidora e livraria fica com praticamente todo o lucro do processo. Vendendo pelo site, acabamos cortando esse gasto e sobra mais dinheiro para o autor;, explica.

Benicio se diz satisfeito com esse livro dedicado ao trabalho dele. Mas ambiciona, um dia, uma publicação mais ampla sobre sua produção. ;Um livro com a minha trajetória toda, sobre a minha maneira de trabalhar, de fazer desenhos. Quem sabe com a publicação desse primeiro livro isso não aconteça?;

SEX & CRIME ; THE BOOK COVER ART OF BENICIO, VOLUME 1
Editora Reference Press, 60 páginas. Preço: R$ 60 (mais frete). À venda em www.referencepress.blogspot.com

Leia entrevista com o ilustrador Benicio

Como surgiu a ideia do livro?
Inicialmente, foi a partir das capas de pocket book que eu fiz para a editora Monterrey. Tinha material para não sei quantos livros. É muita coisa. São 60 capas para o livro. Escolhemos as nossas preferidas. Estão programado outros livros, cada um sobre um tema, um sobre cartazes de cinema e outro sobre minha produção para a publicidade.

Qual a inspiração para as capas?
Eram baseadas nos textos, então o mérito era mais do autor. Elas eram aproximadamente ligadas ao texto. Não tinha nem tempo de ler os livrinhos, recebia uma sinopse.

O que o faz continuar na ativa até hoje?
O que me faz continuar é que eu gosto de desenhar. Gosto de desenhar desde pequeno e nunca parei. Enquanto eu tiver forças, estamos aí.

Há algum trabalho que você ainda gostaria de fazer?
Com quase 60 anos de trabalho, eu já fiz tudo o que queria.

Como foi a inauguração da exposição em São Paulo?
A exposição foi no dia de uma catástrofe, uma chuvarada que parou São Paulo, foi justamente na hora da inauguração da exposição. Eu cheguei atrasado por conta do transito, mas mesmo assim, 400 pessoas estavam lá. Foi uma exposição dos livros com os originais. Estavam à venda. Variava entre R$ 3 mil e R$ 4 mil.

Você tem todos os seus originais?
Todos, não. Mas a maioria dos originais estão comigo. Outro dia, me ligou um cara que pinta cartazes. Ele me procurou porque tinham encomendado para ele um trabalho e dado como referência um original meu. Como isso foi parar lá em Rezende, eu não tenho a menor ideia. Já estava todo estragado, mas valeu pela história. Ele veio de Rezende para me entregar o original.

Quais seus trabalhos mais recentes?
Acabei de fazer um trabalho de propaganda de polvilho anti-séptico para a Granado. Fiz uma propaganda para a cerveja Stella Artois, para Londres. Foi o quarto trabalho que fiz pra eles.

Qual o segredo do sucesso do seu trabalho?
O tipo de trabalho é uma coisa real, mas sem ser fotografia. Acho que as pessoas se identificam. Eu melhoro as mulheres, as pessoas; acho que seja por isso.

Você tem um trabalho mais pessoal, que não seja propaganda?
Nunca me interessei por pintar pra mim mesmo. Gosto do que faço. Tenho alguma coisa particular, mas é insignificante, pouca coisa.

Como seria um livro ideal sobre a sua carreira?
Um livro com a trajetória toda. Um livro mais sobre a minha maneira de trabalhar, de fazer desenho. Pode ser que agora, com a publicação desse livro;


Leia entrevista com Ricardo Antunes, editor da revista Ilustrar

Como começou este projeto do Benicio?
Surgiu de uma sucessão de fatores. Começou com a Revista Ilustrar, hoje a mais importante revista dedicada à ilustração no Brasil (www.revistailustrar.com), da qual sou editor. Entre os vários convidados, tivemos o Benicio algumas vezes. A revista é on-line, gratuita e se tornou bastante conhecida no Brasil e mais ainda no exterior. Entre os fãs da revista está Alberto Ruiz Diaz, ilustrador americano dono da editora Brandstudio Press. Através da Revista Ilustrar, acabamos nos conhecendo e viramos grandes amigos. Dessa amizade surgiu a proposta do Alberto de fazermos uma parceria onde eu criaria uma nova editora para publicar principalmente artistas brasileiros. Daí surgiu a Reference Press. E o primeiro artista para o livro de estreia sempre foi o Benicio, devido a toda importância que ele tem na história da ilustração do Brasil.

Para este primeiro livro, o tema escolhido foi sexo e crime. Por quê?
O tema, na verdade, são as pin-ups das capas de livros de bolso que o Benicio fez durante mais de 20 anos para a Editora Monterrey, entre os anos 1960 e 1980. São trabalhos que ficaram muito famosos, mas que nunca tinham tido uma impressão bem feita. Essas ilustrações eram para livros com histórias de espiões, crimes, detetives, mas regados com muita sensualidade... então o título do livro do Benicio acabou surgindo naturalmente. E é apenas o primeiro de outros livros, já que o Benicio fez mais de 3 mil capas para a Monterrey.

A exposição com 80 originais seguiu esse tema? As obras expostas estão todas no livro?
No livro estão em torno de 40 ilustrações coloridas e uns 25 esboços, mas na exposição levamos 80 originais. Parte deles estão no livro, e o resto fará parte dos próximos lançamentos.

Todas as obras estavam com o próprio Benicio? Ou alguma delas vocês conseguiram com outra pessoa? E por falar nisso, o quão fácil ou difícil é encontrar originais do Benicio?
O Benicio é um artista muito zeloso de suas obras, e a maioria das coisas que produziu na vida estão com ele, por isso é fácil o acesso a esse material. Mas, claro, muitas obras se perderam pelo caminho. No caso específico dessas ilustrações das capas para a Monterrey, são originais que estiveram desaparecidos por mais de 20 anos depois que a editora fechou, mas há poucos anos Benicio conseguiu recuperar a maioria delas. E são essas artes que usamos no livro e na exposição.

Quais os critérios de seleção das obras para o livro?
Bem, em se tratando de trabalhos do Benicio, é difícil escolher um trabalho específico, porque todo o seu trabalho é bom demais. O critério que tentamos manter no livro foi focar nas maravilhosas pin-ups que ele produziu e que se tornaram parte da marca registrada de sua obra.

As obras exibidas na exposição foram colocadas à venda? Quanto custa uma peça do Benicio?
Sim, todas as obras da exposição estão à venda, e o preço varia um pouco consoante o tipo de trabalho. Os preços estavam entre R$ 2,5 e R$ 4 mil, mas estamos falando exclusivamente de ilustrações pequenas (tamanho A4) usadas para capas de livros. Porque os outros trabalhos que ele produziu (como por exemplo, pôsteres de cinema) não estão à venda. E mesmo que estivessem, os valores seriam outros.

Tirando a biografia escrita pelo jornalistas Gonçalo Junior (publicada em 2006), não existem outras publicações dedicadas à carreira do Benicio. Levando isso em consideração, como você avalia a atenção recebida pela memória das artes gráficas no Brasil?
O livro do Gonçalo Junior é excelente, foi feito um trabalho memorável sobre a vida do Benicio. Mas fora isso, curiosamente não havia mais nada sobre ele, e menos ainda sobre tantos outros ilustradores e artistas que fizeram a história do Brasil. É uma pena que isso aconteça, mas se depender de nós iremos corrigir esse fato.

Além de Benicio e Hiro Kawahara, quais outros artistas serão temas de livros da Reference?
A vontade é publicar todos os grandes artistas, ilustradores e amigos, fazendo justiça ao grande talento que eles têm, mas isso é complicado. No entanto, temos vários nomes no planejamento e já estamos em conversação. Mas infelizmente não posso confirmar nenhum nome ainda, mas posso adiantar que além do Benicio e do Hiro, outros quatro artistas já estão agendados. Aguardem.

As capas dos livros são em inglês? A ideia é levá-los para o mercado estrangeiro?
Sim, os livros serão feitos sempre visando o mercado exterior, por dois motivos: primeiro, devido à parceria que temos com a Brandstudio Press (o que, inevitavelmente, fará com que boa parte dos livros sejam vendidos nos EUA) e, segundo, porque a intenção não é só publicar livros, mas divulgar o talento brasileiro no exterior. Por isso os livros serão sempre bilíngues (português/inglês) e com capas em inglês.

Os livros não serão distribuídos para livrarias, certo? Por que essa estratégia?
Porque os livros produzidos por nós, Reference Press e pela Brandstudio, apesar de serem de alta qualidade e material de primeira, não têm qualquer tipo de apoio, patrocínio ou ajuda. Ou seja, os custos são altos. E no processo normal de produção editora-distribuidora-livraria, a fase da distribuidora e livraria fica com praticamente todo o lucro do processo. Vendendo pelo site acabamos cortando esse gasto e sobra mais dinheiro para o autor.

E quem quiser adquirir o livro, como faz?
O livro estará a venda a partir da metade de maço tanto no site da Reference Press (www.referencepress.com) como no site da Brandstudio Press (www.brandstudiopress.com).

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