Diversão e Arte

Turnê milionária da banda U2 leva 180 mil fãs ao estádio do Morumbi

postado em 12/04/2011 09:46

São Paulo ; Talvez não por coincidência, Bono escolheu quase exatamente as mesmas palavras de Barack Obama, o presidente dos Estados Unidos, para elogiar o Brasil. ;Este não é o país do futuro. É o país do presente;, decretou o cantor diante das 90 mil pessoas que lotaram o estádio do Morumbi domingo à noite, no segundo show brasileiro da U2 360; tour. A sensação de déjà vu, é claro, foi inevitável ; mas soou apropriada. No palco, o vocalista de 50 anos se porta com o protocolo, a retórica e o carisma de um chefe de Estado. ;Nossa relação com o Brasil é antiga e profunda. Somos casados com o país. Acima de tudo, nós entendemos vocês;, seguiu, sob aplausos abafados pelo poderosíssimo equipamento de som.

Há cinco anos, quando trouxe a São Paulo a turnê Vertigo, o band leader mirou a crise no Oriente Médio e bradou contra os conflitos religiosos. Hoje, a agenda do grupo parece ainda mais vasta. Nas duas primeiras apresentações paulistanas da 360; tour, Bono comentou a guerra na Líbia, fez referência ao massacre das 12 crianças na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo (Rio de Janeiro), falou do encontro com Dilma Rousseff (e foi vaiado) e acendeu velas em homenagem à birmanesa Aung San Suu Kyi, presa por motivos políticos. Num dos trechos do espetáculo, o arcebispo sul-africano Desmond Tutu, que venceu o Nobel da Paz pela luta contra o apartheid, apareceu no telão para fazer o discurso que antecede One, um dos hits do grupo. O engajamento estava no ar.

Mas, num tom que superou as produções mais grandiosas do grupo (e como esquecer do ;cine drive-in; cintilante da PopMart Tour, em 1998?), o fervor humanitário teve que se adaptar às atrações coloridas de um parque de diversão que, zunindo nos efeitos especiais de um telão flexível, encheu os olhos do público já na curta passagem do Muse, convidado para a abertura. O palco, com 50 metros de altura, simula uma estação espacial ; pode ser visto de todos os pontos do estádio e se movimenta como um inseto gigante. As referências ao universo da ficção científica aparecem antes da entrada da banda, quando Space oddity (de David Bowie) reverbera no ginásio, e na despedida, pontuada por imagens de astronautas ao som de Rocket man (de Elton John). Os pés de Bono, no entanto, não saem do chão. ;Lute, proteste, mude o mundo;, ele conclamou.

No palco que simula uma estação espacial e se move como um inseto gigante, os músicos tocam como se estivessem numa praça aberta

Para todos
É com naturalidade, aliás, que o cantor alterna as facetas de ativista e astro pop. No set list, dá prioridade às faixas de álbuns gravados a partir dos anos 1990 e queridos pelo público, como Achtung baby (1991) e All that you can;t leave behind (2000). Agrada quem só conhece os velhos megahits (como With or without you e Sunday bloody Sunday), uma geração mais recente (de tiques nervosos do naipe de Vertigo e Elevation) e os devotos (com raridades como Out of control, do primeiro disco, Boy, e Zooropa, ambas incluídas no repertório de domingo). Não há contratempos para os passageiros desse voo confortável, luminoso, que dura pouco mais de duas horas e que ; tecnologicamente ; adentra territórios nunca antes visitados por bandas de rock.

Dono da cena, Bono não segue um roteiro estanque: experimenta canções que não estavam nos planos, brinca com a própria popularidade, improvisa com clássicos (domingo, arriscou Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, Helter skelter e Blackbird, todas dos Beatles) e acena aos concorrentes. ;Vocês viram shows dos Rolling Stones, do Radiohead, do Killers. Bandas muito atraentes, boas namoradas, mas é com o U2 que o Brasil está casado;, reforçou. Não é de todo exagerado: a velocidade com que os ingressos foram vendidos é prova de que o reinado de Bono não esmorece. Com as escalas em São Paulo no fim de semana, a turnê bateu um recorde: superou os Rolling Stones e passou a ter a maior bilheteria de todos os tempos, com mais de US$ 558 milhões arrecadados. O show de amanhã, também no Morumbi, fecha a etapa brasileira.

O que faz de 360; uma turnê sem precedentes para o U2 é o modo como o aparato técnico hitech agrega as várias identidades da banda: sem paredes, o palco ressalta os músicos, que tocam como numa praça aberta (The Edge aparece mais solto que nunca, e o baixista Adam Clayton até se sai bem na percussão em I;ll go crazy if I don;t go crazy tonight, do disco mais recente, No line on the horizon). Esse arranjo simples, quase básico, tão ;antiquado;, contrasta com efeitos visuais que apontam para o futuro. Talvez o U2, com 35 anos de carreira, tenha concebido o playground à sua imagem e semelhança: um mundo de fantasia habitado por homens sérios, adultos, super-heróis de carne e osso.

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