Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Filme Somos tão jovens revive a ascensão do rock na cidade nos anos 1980

;A minha geração era do Caseb, do Elefante Branco, tinha essa coisa punk do Renato Russo e a turma dele. Eu vi isso crescer e tudo tomou conta do Brasil: vieram Os Paralamas do Sucessos e o Capital Inicial. Eu sou fã número um deles;, conta o produtor Marcelo Torres. A disposição de ele imprimir legitimidade ao retrato, em cinema, do clima da rapaziada do final dos anos de 1970 e início dos 80 ; às vésperas do início das filmagens de Somos tão jovens ; pode ser medida pelo comprometimento com a capital. ;É uma coisa arrepiante para mim. Primeiro, porque meu pai (César Torres) ajudou a construir a cidade, do nada: isso aqui era só terra. Eu fico emocionado ; já sai lágrima, aqui. Meu pai trabalhou na construtora Pacheco Fernandes e foi funcionário público do Senado;, diz o diretor de produção de Central do Brasil e produtor do mais recente filme de Arnaldo Jabor, A suprema felicidade.

O longa-metragem Somos tão jovens, com direção de Antônio Carlos da Fontoura (Copacabana me engana e A Rainha Diaba), pelo que adianta o produtor, compactará um período específico da vida de Renato Russo. ;Mostraremos desde 1973 ; quando a família se mudou do Rio para Brasília e ele teve uma doença, fez cirurgia e ficou numa de cadeira de rodas ; até, depois, quando ele criou a banda Aborto Elétrico. A trama será até a chegada na Legião Urbana, quando acaba o filme;, explica. Quatro anos depois de maturado, com autorização da própria família do cantor, que propôs a faísca inicial do filme (com o empresário musical Luiz Fernando Borges), o projeto se materializará, em sete semanas de filmagens, a partir de 23 de maio. ;A abordagem é livre e vai sair do jeito que está escrita. Não se trata de um documentário;, explica o produtor executivo.

Numa produção de médio porte, orçada em R$ 6,4 milhões e sob a chancela da Fox e da Imagem Filmes, Marcelo Torres pretende saldar uma antiga ambição ; ;Sempre quis que o cinema local alcançasse uma posição próxima à do rock. Me perguntava: ;Por que o cinema de Brasília não é o que é o rock para o Brasil?;;. Nesse intuito e com a energia de buscar ;a melhor bilheteria do mundo;, o produtor colocou o protagonista Thiago Mendonça (ator de 2 filhos de Francisco) em ensaio há um ano. Bruno Torres (O homem mau dorme bem) interpretará o baterista Fê Lemos. Ainda não há definição do ator que viverá o baixista Flávio Lemos. A mãe de Renato Russo, dona Maria do Carmo Manfredini, será representada por Sandra Corveloni (premiada em Cannes, pelo filme Linha de passe).

Admirador do cinema de Erik de Castro (;Acho Federal o melhor filme feito por aqui;) e de José Eduardo Belmonte (;um ícone, no estilo dele;), Marcelo Torres se atém a valores positivos para cercar o mote do filme. ;Queremos mostrar o que a cidade já foi, antes de estar toda invadida. São favelas para todos os lados e isso era uma coisa que não existia. Tem que se tomar consciência da importância do poder. Brasília já produziu rock, piloto de Fórmula 1. Precisamos é disso: produzir mais gente assim;, observa.

Na possível condição de quem ;mais fez filmes em Brasília;, Marcelo Torres pretende que Somos tão jovens venda Brasília ;pro resto da vida e da forma mais linda possível;. No longa, com roteiro assinado por Marcos Bernstein (Zuzu Angel e O outro lado da rua) e um dos melhores amigos de Renato Russo, Luiz Fernando Borges, haverá muito espaço para as paisagens do Distrito Federal, num circuito que inclui desde a Colina até a W3, passando pela 308 Sul e por Taguatinga. Com as externas do longa definidas, a dificuldade tem sido encontrar um estúdio.

Compromisso capital

;Aquele Polo de Cinema (e Vídeo Grande Otelo, em Sobradinho) está uma vergonha. Como pode? Uma cidade que é capital e não tem estúdio;, diz Marcelo Torres, com indignação. Na carreira, iniciada em 1981, na capital (foi assistente de produção para Geraldo Moraes, em A difícil viagem), Torres contabiliza participação em mais de 50 longas. A trajetória inclui um compromisso constante: ;Em qualquer lugar que eu filme, respeito muito a cidade. Os invasores somos nós: a gente está pegando muitos profissionais daqui;. Há dois meses empenhado em ensaios, o ator Bruno Torres tem auxiliado, desde a semana passada, na definição de atores. Cercadas de mistérios, pelo que conta o produtor, as decisões ;seguirão algo específico, com um rumo quase acordado pela produção;.

No departamento técnico, estão confirmados os nomes do diretor de fotografia Pedro Farkas (Desmundo e O menino da porteira), do diretor de arte Valdy Lopes (Falsa loura) e da figurinista Verônica Julian (VIPs). Torres faz questão de enfatizar a harmonia entre as equipes que, praticamente, se esbarram em sets diferenciados, com a coincidência das filmagens de Faroeste caboclo. ;Tô achando o máximo a geração de Brasília estar fazendo dois filmes simultâneos sobre aquilo que a gente viveu. Eu conheço toda a equipe que está no outro longa: o pessoal do som, das câmeras e figurinos. A gente troca informações, e vai caminhando junto;, comenta o produtor. Esses passos conjuntos parecem liquidar algo de que, desde o furor da admiração pelo Aborto Elétrico, Marcelo Torres se ressente. ;Ficou uma lacuna daquela época: Brasília tinha que ser um exemplo, em termos de cultura para o país;, conclui.