Ricardo Daehn
postado em 03/05/2011 08:00
Há mais de três décadas movida pelos desafios do mercado audiovisual, a carioca Sandra Werneck já deu forma a romances (Pequeno dicionário amoroso e Amores possíveis), revolveu a aura de um ícone musical (Cazuza ; O tempo não para) e expôs mazelas brasileiras (Sonhos roubados), mas é na adaptação para as telas do livro Marina: a vida por uma causa que reside uma das maiores pelejas: representar a ética. O escasso valor social saiu da ponta da língua da diretora, quando ; em processo de negociações dos direitos do livro ;, uma das filhas da ex-candidata à Presidência perguntou: ;Qual é a primeira imagem que você vê para o filme?;.
Apesar da simpatia com a qual tem visto o governo da presidente Dilma Rousseff, a diretora não segreda: votou mesmo, à época, foi na candidata do Partido Verde. À frente de um produto que demandará muitas filmagens no Acre, a realizadora estima um orçamento de R$ 9 milhões para o longa que, previsto para ser filmado no começo de 2012, possivelmente não pleiteará montantes de editais, dependendo de conglomerado entre empresas públicas.
;Acho que esse projeto me escolheu. Logo depois das eleições, parei, por acaso, numa entrevista dela e, quando acabou, eu estava completamente emocionada. Fui para a livraria, comprei o livro, li na mesma noite e no dia seguinte disse: ;Vou fazer esse filme;;, conta a realizadora. Dois meses depois de e-mail propondo a fita, em fins de dezembro, a política recebeu Sandra Werneck. Reticente, e com reservas quanto à exposição, foram mais três meses de suspense até o sinal verde para a adaptação da obra assinada pela jornalista Marília de Camargo César.
;Andava com meu telefone que nem mulher apaixonada esperando ligação do namorado. Até no banheiro eu levava meu celular. Nunca esperei tanto uma ligação na vida;, diverte-se. Na trama, uma leve interferência da ex-ministra já foi estabelecida. ;Metade do filme (que deve ser chamado de Marina e o tempo) sou eu, e quero fazer ; os outros 50% são da minha família;, teria dito. A diretora, não perdeu tempo, e já conheceu, detidamente, toda a família. Diante do primeiro tratamento do roteiro, ainda sob esboço ; ;porque a vida dela é uma saga; ; a cineasta firma a parceria com Melanie Dimantas (autora dos roteiros de Nome próprio e Olhos azuis).
Em julho, a etapa será de testes para a definição da trinca de atrizes que viverá ;diferentes Marinas;, em três fases: dos 8 aos 10 anos, dos 18 aos 30 e dos 30 aos 50 anos. ;Vou buscar desconhecidas, mas pretendo contar com uma excelente profissional também. Faremos teste de maquiagem, uma vez que a Marina é cabocla, não sendo negra, nem mulata e nem parda;, explica. Cobrir a vida privada da ambientalista, ;menos dividida com a imprensa;, é uma das metas da diretora. ;Digamos que reservei 90% do filme para a determinada trajetória de vida dela e 10% para a atuação dela na política;, adianta Sandra Werneck. O risco de um retrato institucionalizado, na autoavaliação, passa a léguas. ;Hoje, a Marina não é nada, politicamente: por isso, eu quis fazer o filme. Não é senadora, não é deputada, não sabe nem se vai se candidatar de novo. O filme, claro, vai falar de política, mas muito pouco. Me interesso por ela enquanto mulher, ser humano e alguém ligado ao meio ambiente;, ressalta.
Sobrecarga
A fuga da sobrecarga de temas políticos, porém, não acarretará em lacunas. ;Vou abordar a religião ; porque faz parte da vida dela, né? ;, assim como vamos mostrar a saída dela do PT;, promete. Contornando mal-estar, Werneck é apaziguadora quando o tema é a derrota da cinebiografada nas urnas. ;O PT tem uma máquina muito grande e havia uma parte da população bem satisfeita com o governo Lula;, acredita. Os modestos resultados (de bilheteria e crítica) alcançados pelo longa Lula, o filho do Brasil não abatem Sandra Werneck.
;Sigo muito um comentário do Hector Babenco (de Carandiru), que uma vez disse: ;O público sente o cheiro do filme que ele quer ver;. Talvez o Lula, naquele momento já estivesse muito em evidência, pela mídia;, observa. O reconhecimento internacional da política (vencedora, em 2009, do prêmio norueguês Sophie, por causa dos esforços em projetos para o desenvolvimento sustentável) pode garantir maior visibilidade da fita, fora do país, onde chegou a levar prêmio máximo .;Estou fazendo este filme pra mim. O diretor vive muito da sua fantasia, da sua imaginação e de querer contar uma história que emocione. Primeiramente, a ele, e depois, ao público. Quero que o país conheça a história da Marina;, conclui.