Diversão e Arte

Maior exposição de arte de Brasília ocupa Museu Nacional com 1500 peças

Nahima Maciel
postado em 19/05/2011 09:17

O sonho da antropóloga Ângela Mascelani é ver o termo arte popular desmembrado e as peças classificadas como tal encaradas apenas como arte. Enquanto isso não acontece, Ângela trata de tornar cada vez mais acessível um mundo de artistas inspirados por seu próprio cotidiano. O Brasil na arte popular, em cartaz no Museu Nacional da República, funciona como uma etapa do desejo da antropóloga.A mostra reúne 1.500 obras pertencentes ao Museu Casa do Pontal (Rio de Janeiro), o maior do gênero no Brasil. Concentrada na arte escultórica, as obras assinadas por 70 artistas de todas as regiões brasileiras contam a história de um país diverso, colorido e rico em manifestações populares.

Adalton reproduziu uma escola de sampa em barro e cerâmicasQuem recebe o público é um Sinaleiro de vento feito pelo paranense Laurentino, uma espécie de boas-vindas para os núcleos temáticos dispostos pela sala principal do museu. A ideia de propor uma viagem pelo território brasileiro se concretiza na montagem. O público escolhe a estrada, que passa pelas bonecas do Vale do Jequitinhonha, pelas carrancas do São Francisco, pelos presépios do Vale do Paraíba, pelas cerâmicas de Caruaru e mamulengos da Zona da Mata pernambucana e até pelo interior de Goiás, com as cavalhadas encenadas em conjuntos de esculturas de Maria de Beni.

Ângela quer proporcionar ao visitante um cardápio capaz de conduzi-lo à descoberta da diversidade. ;A gente está explorando uma coisa bem lúdica. A proposta é permitir que o público faça uma viagem pelo Brasil e que cada pessoa possa fazer seu próprio percurso. Tem algo que permeia todos nós, mesmo quem é urbano: as pessoas vão olhar e reconhecer alguma coisa de próprio, em alguma parte daquela arte as pessoas vão se reconhecer.;

Linguagens
Diretora do Museu Casa do Pontal e curadora da exposição, Ângela embarcou na missão de mudar a imagem de uma produção menor frequentemente atribuída à arte popular. ;É um campo que tem suas fronteiras e limites pouco determinados. Dificilmente as pessoas compreendem as diferenças entre artesanato e arte popular, arte popular e arte naif. Tem uma série de confluências: as pessoas não aprendem que arte popular é um tipo de arte e não uma arte subalterna à grande arte.; Não é possível falar de estilos em arte popular, assim como identificar nessa produção uma lista de características bem delineadas seria um erro.

Para Ângela, a única característica da arte popular está na origem. ;Só tem um nivelador: pertencer às camadas populares. Tem artistas de todos os tipos possíveis se expressando com as linguagens mais diversas. A ideia é possibilitar que o público perceba isso pela própria exposição.; Não se deve, no entanto, encarar a produção popular apenas como uma leitura do artista para seu próprio entorno.

Esse olhar existe, mas não é o único. Algumas produções são também uma maneira de compreender a história do Brasil, caso das cerâmicas confeccionadas em todo o país. Durante o século 19 e parte do 20, a técnica era usada para produzir utensílios domésticos em larga escala para classes mais populares com pouco acesso a objetos refinados.

Com a popularização do plástico e outros materiais, as olarias ficaram sem função e muitos ceramistas se voltaram para uma produção artística. Se o resultado tem forte carga figurativa e de representação do universo popular, também é portador de uma parcela da história do país. ;Essa arte surge a partir dessa realidade, que é uma mudança de patamar tecnológico da sociedade maior.

E aí temos como nome emblemático Mestre Vitalino, a primeira pessoa que aparece para o público como um criador de cenas gratuitas, que não são utilitárias. Quando mestre Vitalino aparece, os meios cultos olham para esses produtores, reconhecem o caráter artístico da produção e esses artistas ganham legitimidade;, diz Ângela. Entre as peças da eVGxposição estão cerâmicas de Viatlino, mamulengos de Boca Rica e Saúba e as bonecas vestidas de noiva de Noemisa, do Vale do Jequitinhonha.

Graças a Beuque

O designer francês Jacques van de Beuque inaugurou o Museu Casa do Pontal, um antigo sítio no Recreio dos Bandeirantes, em 1976, para abrigar uma gigantesca coleção de arte popular adquirida ao longo de décadas de pesquisa. Beuque fugiu da França no final da Segunda Guerra Mundial e, aconselhado por Cândido Portinari, desembarcou no Brasil para nunca mais sair. O encanto pela arte popular o levou a acumular um acervo de 8 mil peças produzidas desde a década de 1930. Ângela Mascelani e o marido, Guy van de Beuque, filho de Jacques, assumiram a direção da casa em 1995, cinco anos antes da morte de Beuque. O estatuto da Casa do Pontal é de museu privado, mas Ângela rejeita a ideia e prefere se autointitular como um museu público não governamental voltado para ações públicas.

O Brasil na arte popular

Exposição de 1.500 peças do Museu Casa do Pontal. Visitação até 26 de junho, de terça a domingo, das 9h às 18h30, no Museu Nacional da República.

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