José Carlos Vieira, Enviado Especial
postado em 04/06/2011 08:00
Telavive ; Veja, leitor, o semblante carregado e o olhar melancólico dos dois oficiais israelenses, um ao centro e o outro em pé, à esquerda da foto. Apenas eles percebem e sentem que esta será a derradeira ceia para alguns de seus soldados.
O fotógrafo Adi Nes usou como referência A última ceia, de Leonardo Da Vinci, para retratar a insensatez da guerra.
A imagem está exposta com destaque na galeria destinada à arte contemporânea no Museu de Israel, local em que grande parte da história de nossa civilização está preservada, como os manuscritos do Mar Morto.
;Não tentei fazer uma transposição da pintura de Da Vinci, mas criei minha própria Última ceia ; é por isso que há um soldado extra na imagem (não são só Cristo e os 12 apóstolos). O soldado extra representa o artista ou o espectador que vê fora da imagem e conhece o passado ou pode esperar o que pode vir no futuro;, destaca o fotógrafo ao Correio.
Ele acrescenta que esse trabalho faz parte do ensaio Soldados, realizado entre 1994 e 2000. ;É um esforço de humanização do soldado, sem importar de qual exército seja, uma metáfora para todas as pessoas em todas as partes do mundo;, diz Adi Nes, 45 anos, filho de imigrantes iranianos e curdos que chegaram a Israel na década de 1950. ;Queria mostrar a pessoa por trás do soldado, sua vulnerabilidade e fragilidade. Mostrar que, no momento em que se coloca um uniforme, há um contrato subentendido que inclui a possibilidade da morte, e o medo sempre a acompanhará. Não é heroico e nobre (abençoado) morrer.;
Adi representa um movimento em alta no seu país, o que defende a diversidade do povo israelense, ao contrário de anacrônicas políticas governamentais do passado que focavam a lente num judeu ;ideal;. ;O tema principal em minha arte são questões de identidade. Sou um israelita e um homossexual militante que lida com a masculinidade e a israelidade.
Mas meu trabalho é composto por várias camadas, não há uma que domine a outra. Cresci em uma região em desenvolvimento e a uso em meus cenários (especialmente na série Boys). Minhas origens de fundo oriental (sefardita) também são marcantes em minha obra, assim como os temas judaicos e as histórias bíblicas. Todas essas camadas diferentes vivem dentro de mim, lado a lado;, tenta se definir o fotógrafo que joga cores fortes na crítica à desigualdade social, na sua postura política e também no seu olhar artístico.
Photoshop, câmeras digitais e efeitos computadorizados estão longe de seu trabalho. ;Estou ciente de que eu sou como aqueles malucos que ainda gostam de ouvir música de um disco de vinil e não de um CD.; Além de Soldados, ele produziu séries premiadas como Boys (2000), Prisioneiros (2003) e Histórias da Bíblia (2004-2007). Atualmente investe na produção The village, que deverá ser concluída em 2012.
* O repórter viajou a convite do governo de Israel
Reconhecimento
Adi Nes (foto) nasceu em 1966, em Kiryat Gat, perto de Jerusalém. Suas exposições têm percorridos grandes centros artísticos do mundo, como o Wexner Center for the Arts (EUA), o Museu de Arte Contemporânea de San Diego (EUA) e a Galeria Melkweg, em Amsterdã, entre outros. Em 2005, Nes foi escolhido como ;notável artista; da prestigiada Israel Cultural Excellence Foundation.
"A composição do palco desta foto (A última ceia) é dividida em duas etapas: os símbolos debaixo da mesa (aquelas coisas que nós ignoramos, como o ;diálogo; das botas dos soldados e também o clima de aparente tranquilidade antes de ir para o conflito. Morte, em meu ponto de vista, sempre ocorre em um momento trivial (e não o heroico como em Hollywood), ou seja, acontece quando você está fumando, rindo, comendo ou escrevendo uma carta para sua namorada"