Diversão e Arte

Saiba como é a convivência com a maior banda de rock em atividade

postado em 12/06/2011 08:00

Se rock fosse apenas uma questão de estatísticas, cifras, matemática, ainda assim os Rolling Stones seriam gigantescos. Estimativas indicam que o grupo vendeu cerca de 200 milhões de discos no mundo todo. E, em quase 50 anos de sucessos e excessos, a movimentação financeira nas contas dos ingleses faria inveja a muito empresário. Na contabilidade da música pop, no entanto, nada disso parece tão importante assim. Quando se discute a importância do quarteto, os valores são mais abstratos. E a pergunta recorrente tem mais a ver com arte que com lucro: qual é o segredo da longevidade criativa?

No palco, sabe-se, os Rolling Stones não vacilam. Nem desaceleram. Charlie Watts, o mais experiente da trupe, tem 72 anos. Mick Jagger e Keith Richard, 67. E Ron Wood, o caçula, 64. Mas virou clichê descrevê-los como meninos grandes, ainda às voltas com a fúria dos hormônios. Quando começaram a conviver com os ídolos, durante a turnê da coletânea Forty licks (2002), Philip Dodd e Dora Loewenstein acabaram descobrindo o lado generoso dessa entidade roqueira: uma família. ;Eles são artistas genuínos no que fazem. Mas se comportam como excelentes profissionais, e de uma forma muito carinhosa;, afirma Dora.

A imagem de uma caravana frenética, com as rusgas típicas do show business, logo se mostrou um mito. Engavetar essas e outras crenças é, ao fim e ao cabo, o objetivo principal do livro According to the Rolling Stones, publicado pela CosacNaify. Com o aval da própria banda, a edição luxuosa foi alinhavada por Philip e Dora em quatro extensas rodadas de entrevistas, cada uma numa escala de show: em São Francisco, Los Angeles, Melbourne e Tóquio. ;Foi um período intenso;, resume Dora, que idealizou o projeto. Integrante legítima da ;família Stones;, ela é filha do príncipe Rupert Loewenstein, que administrou as finanças do grupo.

;O propósito era contar a história nas palavras da banda, e não nas versões das outras pessoas;, afirma Dora. ;São muitos os mitos ao redor dos Rolling Stones, e é sempre bom dissipar aqueles que são mais pitorescos. É necessário termos as versões definitivas de episódios como o festival de Altamont, a relação com Brian Jones (ex-integrante, morto em 1969), o período dos anos 1980. São momentos importantes, históricos;, explica. Para o fã, o charme da edição está nesse jogo de pontos de vista: os trechos de entrevistas formam uma longa ;conversa; entre os músicos, que lembram a própria trajetória com distanciamento e senso de humor. ;Desde o início, o essencial era a música: e ela estava nos nossos ossos;, nota Richards.

Surpresas
Alguns depoimentos podem espantar o fã menos dedicado. A certa altura, por exemplo, Mick Jagger revela que não gosta tanto assim de Exile on Main Street (1972), considerado por boa parte da crítica a obra-prima do grupo. E Richards admite que sentia certo ciúme dos Beatles. As preocupações com a velhice também escapam ; ora nas entrelinhas, ora explicitamente. ;Não quero parar de tocar. Tenho medo de parar e me descobrir velho;, admite Watts. Apesar do estigma de produto oficial da banda, o discurso soa mais franco que calculado. ;O diferencial do livro é que ele não é mais uma interpretação da história dos Stones. Ele é a história integral, da forma como eles viveram;, sintetiza Philip.

Outros atrativos são a coleção de fotos raras (de feras como Anton Corbijn e David Bailey) que os organizadores selecionaram e os depoimentos de personalidades como Ahmet Ertegun (um dos fundadores da gravadora Atlantic), o produtor Don Was (dos CDs recentes) e a cantora Sheryl Crow (que abriu as turnês Bridges to Babylon e Forty licks). Uma pesquisa detalhista que, apesar de todo o esforço, não encontra a grande resposta para os mistérios dos Stones. ;Nas entrevistas, percebemos que era impossível prever a direção que a história tomaria. Existe sempre uma surpresa à espreita, e ela dificulta a descoberta dos verdadeiros segredos de uma grande banda;, despista Dora. De uma forma ou de outra, é uma trajetória não menos que monumental.

Quatro perguntas - Philip Dodd

Entrar no mundo dos Rolling Stones alterou sua percepção da banda?
Acredito que é comum se aproximar com certos preconceitos de pessoas que são famosas no mundo todo. Mas em nenhum momento me intimidei com o projeto, que foi concebido pela própria banda. E claro, eles se comportaram como pessoas comuns, corteses e generosos. A trupe dos Stones se comporta como uma grande família. Fiquei muito impressionado numa série de entrevistas em Tóquio. Na última noite na cidade, a banda nos chamou para a abertura de uma exposição de pinturas de Ronnie Wood. E, de manhã, havia um convite na porta, para a festa de 18 anos da filha de Keith, Theodora. Era tudo muito familiar, de verdade. E eles nos incluíram nesse clima.

Foi complicado conectar as ideias da banda para formar uma narrativa com começo, meio e fim?
Nós planejamos as entrevistas com muita antecedência. Nossa primeira reunião editorial com Charlie aconteceu seis meses antes da entrevista com ele. Nós definimos precisamente o tempo para cada entrevista, mas nos permitimos improvisar sempre que a banda saía pela tangente. Terminamos o processo com uma massa enorme de transcrições, mas a narrativa fluiu bem no período de edição. A parte mais difícil foi pedir os ensaios dos colaboradores, que estavam todos muito atarefados em vários cantos do mundo. Os dois últimos chegaram exatamente em cima do prazo.

No livro, Keith diz que, na história da música pop, quanto mais se descobre, menos se sabe.
Vocês concordam?
Concordo sim. Na música, quanto mais você descobre, mais você percebe que ainda tem muito a descobrir. Mas, enquanto líamos o livro, nós descobrimos como o amor pela música ; e estamos falando de um amor compartilhado pela música ; é a força propulsora que movimenta os Stones para frente.

No filme Shine a light, Martin Scorsese comentou que o poder dos Stones era a ;arte da performance;. Para você, como explicar a longevidade da banda?
Acredito que é tudo muito simples: amor e respeito pela música é a pulsação da banda, o cerne dos Stones. Se você combina isso com o frontman fenomenal que é Mick Jagger, você tem a performance mágica que todos conhecemos e amamos.

ACCORDING TO THE ROLLING STONES
De Dora Loewenstein e Philip Dodd. Tradução de Alexandre Barbosa de Souza. CosacNaify, 360 páginas. Preço: R$ 119.

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