Nahima Maciel
postado em 08/07/2011 09:59
Paraty (RJ) ; A Paraty pela qual o argentino Andrés Neuman caminha esta semana bem poderia ser a bizarra cidade alemã pela qual transita Hans. No romance de Neuman, uma cidade medieval com chão de paralelepípedos vira um pequeno paraíso quando Hans descobre ali Sophie, que tem todos os requisitos para se tornar o par perfeito, exceto o fato de que está noiva de outro. Mas Paraty não é bem a cidade imaginada em O viajante do século ; e com o clima frio neste julho chuvoso, Neuman até vê semelhanças. ;Minha Brandeburgo é assim como Paraty, mas menos turística. É uma versão hostil e menos cool de Paraty.;A cidade imaginária será um dos temas de hoje na Festa Literária Internacional de Paraty. O dia é da literatura de línguas latinas e Neuman vai dividir o cenário laranjado da tenda dos autores com a conterrânea Pola Oloixarac, o português Valter Hugo Mãe e os franceses Emmanuel Carr;re e Claude Lanzman. Neuman divide a mesa Viagens literárias com Michael Sledge, autor de livro sobre o relacionamento da poeta norte-americana Elisabeth Bishop e a brasileira Lota. ;Quando falamos em viagem literária, me vêm à cabeça diferentes maneiras de entender a viagem, como um personagem percorrendo milhares de quilômetros de maneira lenta e tortuosa. Ou a viagem intelectual da literatura, da arte;, diz o argentino.
Se o resfriado de Pola permitir ; ela chegou indisposta a Paraty na quarta-feira ;, ela sobe ao palco ao lado de Hugo Mãe para a mesa Pontos de fuga. Os dois criaram romances cujos pontos de vista dos personagens permitem o trânsito por várias perspectivas. Laços de família une Emmanuel Carr;re, autor de relato pessoal sobre duas famílias que precisam lidar com a perda, e o húngaro Peter Esterházy, que lança na Flip Os verbos auxiliares do coração, sobre a morte da figura materna.
Na noite de abertura, na quarta-feira, o crítico literário Antonio Candido fez rir a plateia com uma conferência perspicaz sobre Oswald de Andrade, o homenageado desta edição da festa. Falar de modernismo pode virar algo bastante empolado, mas o crítico avisou que não falaria sobre a obra de Oswald e sim sobre a convivência com o autor do Manifesto antropofágico.
Candido lamentou o quão desconhecida ficou a obra de Oswald até anos depois de sua morte, em 1954. ;Há certos escritores para os quais é importante conhecer a biografia. Há certos escritores cuja obra é devorada pela biografia. E há casos de escritores que constróem a vida como se fosse uma obra. Há um pouco disso em Oswald. A vida atrapalhou a obra;, acredita o crítico, para quem o temperamento briguento, mas nada vingativo de Oswald de Andrade também ajudou. ;Um dos fatores que fez com que a obra dele não fosse conhecida é que ele era extremamente sensível à crítica e ninguém queria escrever. Ele despertava certo temor. O Oswald gostava de brigar e desbrigar. Era um homem de uma certa candura e não tinha temor.;
Ontem a programação oficial da Flip teve início com uma mesa dedicada à relação entre o evento e a subsistência da cidade. ;A ideia desse debate que fazemos todos os anos é contribuir para decisões de políticas públicas em Paraty e como incluir as pessoas locais;, disse Mauro Munhoz, diretor da Casa Azul, instituição que realiza a Flip.