postado em 01/08/2011 09:22
A imagem romântica do artista sozinho, enclausurado em seu ateliê, consumindo-se para criar uma obra, deve ter ficado no passado. Atualmente, artistas da cidade se unem com a intenção de dar uma nova configuração aos espaços culturais e às formas de trabalho. Para isso, juntam criatividade e interesses em comum.Foi o caso de cinco amigos que compartilhavam uma certa angústia ao pensar em trabalhos no serviço público. Decididos a criar uma equipe autônoma, eles idealizaram propostas, como a revista Nil, com o objetivo de difundir a produção do circuito de arte. As amizades da infância e dos tempos da universidade facilitaram a integração. ;Foi possível por causa da intimidade que já tínhamos, e também porque é a realização de um sonho em prol do mesmo objetivo;, diz uma das integrantes do grupo, Clarissa Novais.
A liberdade de atuação é apontada pela diagramadora Flora Egécia como a principal vantagem de estarem juntos. ;A maior sorte é encontrar pessoas que queiram entrar nessa com você;, ressalta. Já para a editora da revista, Patrícia Colmenero, além de realizar projetos profissionais com pessoas em sintonia, é primordial a persistência de todos diante das dificuldades.
Outra iniciativa parecida é a do grupo teatral Liquidificador. Como o nome sugere, eles pretendem ;misturar; ideias. A atriz Karine Ribeiro acredita que a união de pessoas em torno de um projeto é uma atitude de resistência, com o intuito de enfrentar a defasagem da cena cultural. Depois da montagem da peça A cartomante, os sete integrantes decidiram oficializar o coletivo. Segundo Fernando Carvalho, os ensaios favoreceram o clima familiar. ;A intimidade permitiu que a gente conhecesse nossos limites, o potencial de cada um e aceitasse os nossos defeitos;, pontua Carvalho.
Ainda assim, a cobrança permanece. ;Tem exigência, tem crítica, porque você quer fazer o melhor com aquelas pessoas. Por outro lado, você fica muito mais seguro para se expor, afinal, estar com amigos é, justamente, estar em um lugar seguro;, analisa Fernanda Alpino. Para o grupo, a harmonia é mantida pela sinceridade, pela vontade de trabalhar e de investir na iniciativa. ;Cada cabeça é uma cabeça. Juntos, temos que ser uma cabeça só;, resume a atriz Iza Cavanellas.
Conectados
Em meio ao cheiro de café fresco, bolachas como lanche e, ao fundo, um disco de Bob Dylan, sete artistas ocupam o Espaço Laje, uma casa na W3 Sul, onde cada cômodo é um local de criação independente e, ao mesmo tempo, conectado com os outros. Pinturas em tela, desenhos, roteiros de cinema e até uma sala de edição de som formam o lugar.
O artista plástico Lucas Gehre, editor da revista em quadrinhos Samba, com Gabriel Góes e Gabriel Mesquita, conta que tudo começou com a necessidade de um lugar para produzir, longe dos problemas de casa. Mesmo com cada um no seu canto, as intervenções no trabalho um do outro são inevitáveis. ;Nós não somos um coletivo homogêneo, mas a gente interage. Dá vontade de ver o que o outro está pensando, influenciar no trabalho dele. Estamos aproximados por afinidades;, justifica Gehre.
Essa sintonia de propostas cria um ambiente convidativo para intensificar a produção, como explica o também artista plástico Virgílio Neto: ;Quando trabalhava sozinho, em casa, tinha sempre algo batendo à porta, convidando a desistir. Aqui, cada um o estimula, é uma cena que dialoga;. Essa complementaridade é vista como uma ;intervenção construtiva; pelo cineasta Rafael Lobo, pois as fronteiras entre o que cada um produz não são delimitadas.
E, para manter a casa em ordem, prevalece o bom senso. Cada um fica responsável pela organização do espaço que utiliza. Já os custos com o aluguel e outras contas são administrados por Rafael Lobo e pelo produtor musical Ricardo Ponte. Todos concordam que trabalhar dessa forma. Até agora, é a ideal. ;Aqui todo mundo está querendo algo. A arte é meio sem espaço, mas nós podemos criar o nosso espaço;, finaliza Lucas Gehre.