Especializado em reedições de discos, o selo americano Rhino Records lançou recentemente a coleção Original Album Series ; que, no Brasil, ganhou edição e distribuição da Warner Music. O grande chamariz da coleção é oferecer, em caixas contendo cinco discos, álbuns ou inéditos ou há muito tempo fora de catálogo no país. A seleção de artistas é variada, vai do jazz ao pop, passando por rock, funk e soul.
Coincidência ou não, alguns dos títulos da coleção ajudam a contar a história da black music. Por ser sintético, o termo black music acaba colocando no mesmo balaio sonoridades semelhantes, mas de caraterísticas rítmicas e melódicas distintas. Do blues ao hip-hop, passando por rhythm and blues, soul, funk e tudo que surgiu entre uma vertente e outra, a moderna música negra norte-americana passou por várias metamorfoses ao longo do século 20.
Ao unir o sagrado e o profano (ou seja, o gospel com o blues, o country e o jazz), o cantor e pianista Ray Charles (1930-2004) criou sua própria revolução musical. A alquimia sonora de Charles é ainda hoje fonte de inspiração para incontáveis músicos e intérpretes. Na coleção estão os álbuns The great Ray Charles (1957), Ray Charles at Newport (1958), The genius of Ray Charles (1959), The genius sings the blues (1961) e The genius after hours (1961). Uma fatia representativa de sua vasta discografia justamente por mostrar o artista em plena forma como compositor, pianista e cantor. O disco ao vivo, em Newport, é um dos melhores retratos das forças de Ray.
Do R ao funk
Apesar de ser cultuado como um dos maiores (para muitos, o maior) cantor de soul, Otis Redding (1941-1967) é muito menos conhecido do que o peso de seu legado poderia sugerir. Talvez por ter morrido muito jovem, aos 26 anos. Dono de uma voz rascante e uma interpretação cheia de emoção tanto para baladas (I;ve been loving you too long) quanto para números mais animados (Shake), Redding era um performer inigualável em cima do palco, admirado por seus colegas (do rock e da música negra) pelo talento e carisma magnético. Se estivesse vivo, Otis Redding completaria 70 anos em 9 de setembro. Estão presentes na coleção todos os álbuns individuais lançados pelo cantor em vida: Pain in my heart (1964), The great Otis Redding sings soul ballads (1965), Otis blue ; Otis Redding sings soul (1965), The soul album (1966), Complete & unbelievable ; The Otis Redding dictionary of soul (1966).
Composta por Redding, a música Respect alcançaria ainda mais sucesso na voz de Aretha Franklin. Mas este é apenas um dos hits que podem ser encontrados nos discos I never loved a man the way I love you (1967), Lady soul (1968), Aretha now (1968), Spirit in the dark (1970) e Live at Filmore West (1971). A presença cênica incendiária e a voz potente, cheia de expressividade (e, claro, a postura de mulher independente, dona do próprio nariz), fizeram da cantora um ícone do soul, influente até os dias de hoje.
Parceria
Em parceria com o compositor Burt Bacharach e o letrista Hal David, Dionne Warwick emplacou incontáveis sucessos (Walk on by, I say a little prayer, Do you know the way to San Jose?). Suas interpretações, de uma doçura comovente e uma melancolia avassaladora, faziam a ponte entre o R, o pop sofisticado e o soul. Os discos da coleção, os cinco primeiros da artista, também levam a assinatura de Bacharach como produtor: Presenting Dionne Warwick (1963) Anyone who had a heart (1964), Make way for Dionne Warwick (1964), The windows of the world (1967) e Dionne Warwick in Valley of the dolls (1968).
Se o soul é filhote do R, o funk é neto. E poucos músicos estão tão intrinsecamente ligados ao funk quanto o baixista William Earl ;Bootsy; Collins. Ex-integrante dos grupos Parliament e Funkadelic, ele se lançou em carreira solo em 1976, com Stretchin; out in Bootsy;s Rubber Band (1976), presente em sua caixa da coleção, assim como os quatro discos subsequentes: Ahh... The Name is Bootsy, baby! (1977), Bootsy? Player of the year (1978), This boot is made for fonk-n (1979), Ultra wave (1980) ; todos mais ligados no groove do que nas canções e, justamente por isso, uma atalho para a nascente sonoridade disco.
No quesito música, os títulos da Original Album Series oferecem muito do que de melhor foi feito na música negra americana. A queixa fica por conta da ausência de encartes (os discos são apresentados no formato mini LP e reproduzem as capas e contracapas originais) que pudessem trazer mais informações para enriquecer a experiência sonora.
No mercado
; A primeira leva da coleção Original Album Series é composta por caixas de 10 artistas. Além dos mencionados na matéria, os outros são David Sanborn, Duke Ellington, George Benson, Natalie Cole e Rod Stewart. A segunda, em breve nas lojas, terá a-ha, Al Jarreau, Anita Baker, Antonio Carlos Jobim, Faith No More, Herbie Mann, John Coltrane, Ornette Coleman, Simply
Red e The Coors.