Diversão e Arte

Extinto Mercado Sul se transforma em um beco de cores e culturas

postado em 21/08/2011 11:48

O espaço urbano funciona como um corpo vivo que se transforma com a história e a intervenção dos moradores. Essa apropriação foi o que ocorreu no ;beco da cultura;, localizado no extinto Mercado Sul de Taguatinga. Fora do circuito do Plano Piloto, o lugar é composto de pequenas lojas, uma ao lado da outra, como uma espécie de micro-vizinhança em que circulação dentro dos pequenos ateliês possibilita tomar um café no vizinho ou bater um minuto de prosa.

A história do lugar começa com a chegada dos candangos, na década de 1960, quando o mercado abrigava uma feira de secos e molhados, e já se ouvia as rimas dos repentistas nordestinos, munidos de suas violas. Com o passar do tempo, o lugar enfrentou uma fase de abandono e há quase 20 anos começou a ganhar a configuração de polo de produção artística.

Com violões, violas e ferramentas de trabalho, o luthier João da Silva, 76 anos, conhecido como mestre Dico, inaugurou as atividades do beco. Apesar do jeito tímido e das poucas palavras, não lhe faltou iniciativa para desenvolver um trabalho pioneiro. A arte de fabricar e reformar instrumentos, aprendida ainda na infância, pelas mãos do pai, é a forma escolhida por ele para colocar sua arte em prática. ;Antes circulavam drogas, prostituição. Aí, nós resolvemos nos instalar aqui e começamos a trazer nossos amigos para fazer arte. Hoje a área é conhecida como beco da cultura;.

Para Alexandre Silva, filho do mestre Dico e também herdeiro do ofício da luthieria, foi possível fazer a transformação e beneficiar a comunidade, pois o lugar promove festas e oficinas com foco na cultura popular e outros tipos de expressões. Nesses eventos, por exemplo, Alexandre e Dico participam de rodas de prosa e viola. Além disso, há apresentações teatrais, shows de música, mamulengos, declamações de poesia e ;contação de causos;. O beco já recebeu as visitas ilustres de Gilberto Gil, na época ministro da Cultura, e de Zé do Pife. ;Aqui é tão eclético que tem música popular, nordestina, clássica. As pessoas usam o espaço de várias formas. Nós queremos cultura de ponta a ponta com todo tipo de arte;, destaca Alexandre.

Formação
No coletivo Motirô, o objetivo principal é distribuir informação. Para isso, mantém um acervo de livros, gibiteca e uma videoteca com 450 filmes, para oferecer às pessoas, que dificilmente têm acesso a esses conteúdos. De acordo com o mímico e ator Abder Paz, o foco é mostrar uma visão de mundo fora do lugar comum e que desperte uma consciência politizada.

Todos os grupos do beco funcionam com sistema de autogestão. Além da fábrica de instrumentos do mestre Dico e do Motirô, há mais quatro espaços: Invenção Brasileira, RED Produtora, Tempo Eco Arte, e Tribo das Artes. Cada um se mobiliza para manter o espaço.

Nessa área de elaboração de projetos, a produtora RED auxilia os artistas. O músico Dillo D;Araújo conta que a produtora surgiu quando ele sentiu necessidade de uma gerência para sua carreira. Mas, a consultoria também passou a atender os outros artistas . ;Quando surge um projeto na área de cinema e teatro, por exemplo, eu mesmo uso minha experiência como instrumentista para fazer as trilhas sonoras.;

Mais cores
No ateliê Tempo Eco Arte, Virgílio Mota faz do saco de cimento e do papelão matérias-primas para produzir instrumentos, mobiliário e criar cenários. Ele abriu as portas para duas artesãs frequentadoras assíduas do beco da cultura: Caroline Nóbrega quer trazer mais pessoas para o local. ;Quanto mais pessoas interagindo é melhor;. Já para Thaís Sampaio ;o espaço é aberto e permite experimentar sem medo, livremente;.

O colorido e a criatividade também estão presentes no trabalho do bonequeiro e iluminador Miltinho Alves. Todos os personagens são inventados por ele, as cores, as roupas estampadas e os trejeitos de cada boneco dão ideia de algo vivo, pois, além de fabricar, ele capricha nas interpretações.

Parceiro de Miltinho, o artista plástico Branco também é mais um transformador de materiais. Seja na escultura de um cavalo ou de um mapa, é possível se surpreender com identificação do que é usado na obra dele: correias de bicicleta, parafusos, pequenos pedaços de ferro e sucata, tudo colocado de maneira precisa.

A parede azul revestida com fotos de personagens da cena artística do Distrito Federal, como Nicolas Behr e o palhaço Zezito, mostra a trajetória da Tribo das Artes. O poeta e escritor de cordéis Ruiter Lima está à frente da Tribo há 10 anos, mas só passou a ocupar um dos espaços do corredor há pouco tempo. Para ele, é importante fazer parte do lugar e é vital o reconhecimento do beco como ponto de cultura por toda vizinhança. ;Fazemos aqui um trabalho de vitalizar. Não é revitalizar. Agora é que este lugar está ganhando vida de verdade. E as pessoas precisam entender isso, saber o que acontece aqui.;

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