Há um misto de erudição e espontaneidade popular em Sete cordas. Uma mescla delicada, uma combinação executada com tanto cuidado que é possível identificar uma feliz dose de despreocupação e apuro estético de cada acorde. O disco duplo do violonista Fabiano Borges, gravado com recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), está cheio de bons momentos, com um repertório reverente à música latino-americana, a mesma que o músico apresenta hoje na Casa Thomas Jefferson.
Borges, 28 anos, tem caso antigo com vários estilos musicais. Curiosamente, chegou ao violão erudito por meio do rock. Ou do blues. Ainda garoto, assistiu ao filme A encruzilhada, em que o ator Ralph Macchio treina para um duelo de guitarras com o virtuose Steve Vai. Borges também tocava guitarra, mas o filme o levou a Mozart e ao violinista Paganini. ;Percebi que muito do que eles tocavam vinha daí;, conta. E foi quase ao mesmo tempo que descobriu Raphael Rabello. Não teve jeito: ele deixou a guitarra e foi estudar violão erudito na Escola de Música de Brasília (EMB).
Sete cordas nasceu dessa trajetória. Para as duas primeiras faixas de cada disco, Borges convidou o violonista cubano Aléxis Mendez. Com ele, fez a homenagem a Rabello, logo na primeira faixa, Meu avô, reverência que continua em Comovida n; 1.
A peça é de Guinga, mas nunca foi gravada pelo autor. Apenas Rabello se atreveu a registrar a melancólica composição. O primeiro disco também traz Suíte brasileira, assinada pelo próprio Borges. Três peças ; Sambossa, Bolero chorado e Samba em Minas ; formam o conjunto, uma espécie de celebração da música brasileira.
;Sambossa foi minha primeira composição, em 2002. Depois fiz as outras e resolvi transformar em suíte como se fosse um grupo de peças de dança com três gêneros brasileiros típicos;, avisa. A conexão do compositor com o universo clássico fica clara nos tremolos de Sambossa.
Tango brasileiro
A primeira parte do trabalho traz ainda a referência tradicional com Escovado e Tenebroso, de Ernesto Nazareth. ;Ele deu a base para a nossa música popular. Essas duas peças são tangos brasileiros, um gênero do século 19 quando ainda não existia a palavra choro. Mas no fundo são choros;, conta. ;Acho imprescindível o trânsito entre o popular e o erudito. O erudito tem toda a base da música europeia e isso é importante para o violonista. E o popular é mais solto, despreocupado.;
Os tangos, desta vez argentinos, introduzem a segunda proposta do disco: o diálogo com a música latino-americana. À tradição de Astor Pizzolla, com Adiós nonino em arranjo refinado, Borges acrescentou um universo desconhecido trazido da música peruana e do norte da Argentina. San Miguel de Piura resgata o ritmo popular do folclore peruano conhecido como marinera. ;É uma peça muito rítmica, na qual o violão tenta simular os instrumentos de sopro, com muita polifonia. É uma música com mais de 100 anos;, explica Borges. O CD traz ainda duas faixas multimídia.
O instrumentista também assina Suíte contrastes latinos. Um prelúdio e uma milonga firmam o compromisso com a música do continente, que desde 2008 ele divulga em parceria com o violonista argentino Diego Martín Castro no Duo do Mercosul.
Sete cordas
CD do violonista Fabiano Borges. Álbum duplo, com 18 faixas. Lançamento: MCK. Preço médio: R$ 44,90. Show hoje, às 20h, na Casa Thomas Jefferson (706/906 Sul). Entrada franca. Classificação livre.
Paraense com sotaque baiano (Irlam Rocha Lima)
A cultura musical de Cláudia Cunha é rica e diversificada. No serviço de alto-falante de Ourém, pequena cidade do interior do Pará onde nasceu, ouvia cantores e compositores nordestinos e cantava nas festas religiosas e populares. Na capital, Belém, morou por algum tempo, iniciou os estudos e agregou referências da região.
Radicada em Salvador desde 1996, tornou-se bacharel em música pela Universidade Federal da Bahia, fez pesquisa aprofundada dos ritmos (e ritos) afro-brasileiros e do samba de roda. Nos últimos cinco anos, desenvolve elogiada e premiada carreira.
Todas as informações recolhidas por Cláudia, em vários momentos de sua trajetória, estão espalhadas em Responde à roda, álbum recheado de sambas, cocos, cirandas e cantos.
O disco foi lançado pela gravadora Biscoito Fino há dois anos, com produção do mineiro Sérgio Santos.
Responde à roda serve de base para o show que ela faz amanhã, às 21h, no Clube do Choro. Em sua companhia estarão Jana Vasconcellos (violão), Oswaldo Amorim (contrabaixo acústico) e Sebastian Notini (percussão). Como convidados especiais, os cantores brasilienses Leonel Laterza e Túlio Borges. ;É a primeira vez que me apresento em Brasília e vivo uma grande expectativa para pisar no palco do Clube do Choro, que já recebeu tantos nomes importantes da música brasileira;, elogia.
No disco estão reunidas canções de diferentes compositores, tais como Egberto Gismonti, Tom Zé, Zé Renato, Joyce, Roberto Mendes e Sérgio Santos, entre outros. A voz delicada e de impressionante afinação de Cláudia pode ser apreciada, também, nas autorais Baião dividido, No girar de Alice e na faixa-título.
Cláudia Cunha
Show da cantora paraense com as participações de Leonel Laterza e Túlio Borges, amanhã, às 21h, no Clube do Choro (Eixo Monumental), ao lado do Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia). Informações: 3224-0599. Não recomendado para menores de 14 anos.