No começo de cada sessão do 44; Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, uma vinheta produzida pela Secretaria de Cultura do Distrito Federal é exibida, explicando como será feita a reforma do Cine Brasília. Enquanto uma animação é projetada na tela, a voz (em off) diz que ;até a Copa de 2014; a ampliação do edifício ; com a construção de um anexo, localizado na Entrequadra 106/107 Sul ; estará concluída no ano em que sediaremos o evento esportivo.
Apesar do enredo de história com final feliz, o anúncio institucional esconde que a ampliação do Cine Brasília ainda não está garantida. Por enquanto, está certo que o cinema será fechado, de novo, com o término do Festival de Brasília, para a segunda etapa das reformas pelas quais o espaço passará ainda este ano. O projeto atualizado pelo arquiteto Oscar Niemeyer em 1991 ficará completo se concretizada a construção de um anexo do edifício, com outras salas de exibição de filmes e 12 lojas destinadas para o comércio.
;A estrutura do prédio não pode ser descaracterizada. A reforma servirá para modernizar as instalações que estão bastante deterioradas ou obsoletas;, enumerou o arquiteto da Novacap Leonardo Bianchetti, o responsável dentro do órgão por supervisionar os trabalhos de atualização do cinema. Ele inclui no projeto a construção de rampas e a instalação de elevadores que melhorem a acessibilidade de portadores de necessidades especiais, a reforma de sanitários, a ampliação da bilheteria do espaço e a troca do sistema de ar-condicionado. Segundo o arquiteto, a reforma ainda não entrou em processo de licitação.
O secretário de Cultura, Hamilton Pereira, garantiu que o orçamento desta etapa, cerca de R$ 6 milhões, está garantido para este ano. O problema é assegurar os recursos necessários para completar a soma de todas as reformas (a de impermeabilização do telhado custou R$ 900 mil e já foi concluída) mais a construção do anexo, que está calculado em R$ 14 milhões. ;A previsão é concluir a segunda etapa da reforma até setembro do ano que vem para a realização do 45; Festival de Brasília. Em 2012, abriremos o diálogo para saber como a sociedade deseja determinar como esses novos espaços deverão ser utilizados. Aí, sim, desejamos incluir a conclusão total do projeto no orçamento de 2013;, acredita Pereira.
Nunca é demais lembrar que 2013 é o último ano antes da realização da Copa do Mundo de Futebol, o que diminui sensivelmente as perspectivas de angariar recursos para esse fim. ;É verdade que os principais vetores de investimento ; tanto público quanto privado ; nesta cidade estão voltados para a Copa do Mundo. Mas tentaremos abrir espaço para uma nova fonte de captação de recursos que entre em vigência no ano que vem. Também é necessário encontrar modelos de gestão entre os setores público e privado que permitam que essa sala tenha um elemento de vida cultural com durabilidade;, afirma Pereira.
O próprio secretário admite que, além do Cine Brasília, boa parte dos monumentos e espaços culturais da cidade estão abandonados (para dizer o mínimo) e necessitam de reformas urgentes. O caso do Teatro Nacional é também muito grave. A verba que seria usada na recuperação do espaço, liberada ainda na administração do governador José Roberto Arruda, está retida pela Justiça por conta das investigações do esquema de corrupção desbaratado durante a Operação Caixa de Pandora. A fachada do edifício chegou a ser reformada recentemente. Mas o trabalho mal concluído descaracterizou o projeto original dos cubos em profundidade, feito pelo artista plástico Athos Bulcão. ;Estamos trabalhando no sentido de exigir que eles refaçam o trabalho de afixação dos cubos. Depois, começaremos a reforma interna pela Sala Martins Pena;, explica Pereira. Mesmo com parte do dinheiro retido, o secretário afirmou que o teatro será reformado ainda em 2012.
Complexo e cultural
Um hiato de 20 anos separa o anexo do Cine Brasília incluído por Niemeyer e a construção que até hoje não foi feita. Naquela época, havia condições de construir o anexo, mas o projeto esbarrou em uma decisão popular. Márcio Cotrim, colunista do Correio, era secretário de Cultura e Esportes do DF quando a ideia de ampliação do espaço foi conceituada. ;O projeto foi aprovado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Brasília. Mas houve uma reação contrária por parte dos moradores daquelas quadras. O pessoal disse que era uma atitude anti-ecológica derrubar as árvores que ficam detrás do edifício. Foi uma queixa avulsa, mas não houve como fazer a construção;, recorda Cotrim.
O arquiteto Carlos Magalhães supervisionou a construção do cinema, inaugurado em 22 de abril de 1960. Ao mesmo tempo, era um cinéfilo e entusiasmado frequentador do espaço. Aos 78 anos, ele tem acompanhado de perto a retomada do projeto abandonado há 20 anos. ;Aquilo era um sucesso, assisti a vários filmes de boa qualidade, com visibilidade boa. Mas, assim como os comércios saíram da W3, os cinemas migraram para os shoppings. O Cine Brasília é um item de qualidade que não pode ser relegado a quinto plano;, analisa.
Magalhães é um dos representantes do escritório de Niemeyer em Brasília e serve como porta-voz do arquiteto, que projetou vários edifícios públicos da cidade. ;A nossa opinião, inclusive a do doutor Niemeyer, é que se deve recompor o cinema mantendo a integridade do projeto. Por exemplo, a fachada do edifício e até o letreiro dos filmes não podem ser substituídos por modelos diferentes;, esclarece.