O líder da banda de rock mais cáustica dos anos 1980 ; o Camisa de Vênus ; completou 60 anos em agosto, mas o tempo não mudou Marcelo Nova. O coiote solitário, como ele mesmo se define, continua, na essência, Marcelo Nova: irreverente, língua solta, boca suja e sem o cacoete de querer agradar ninguém. ;Não quero um milhão de amigos; bastam meus cinco atuais;, diz, às gargalhadas, o velho roqueiro baiano, que sobe hoje no palco do O;Rilley Irish Pub, na 409 Sul, para divulgar o álbum Hoje, às 23h.
Essa é a terceira vez de Marcelo no pub de inspiração irlandesa somente este ano. ;Gosto de tocar pra plateias pequenas. O que adianta tocar pra 100 mil pessoas e o sujeito ter de te ver pelo telão? Pra mim, isso não faz o menor sentido;, comenta.
Segundo Nova, no início deste ano chegou a ser convidado para participar do Rock in Rio homenageando outro baiano: Raul Seixas, morto em 1989. Mas a ideia de reunir artistas do rock brasileiro no palco secundário (Sunset) soou mal para Marcelo Nova, amigo e parceiro de Raul. ;Todos reconhecem a importância dele no rock e nunca chamaram ele pra nada disso quando estava vivo. E outra: gringos com metade do tempo de carreira e de qualidade duvidosa iriam se apresentar no palco principal. Tô completamente fora desse troço! Não preciso disso;, foi a reação do senhor rebelde. O tributo acabou não acontecendo.
No show de lançamento do álbum Marcelo Nova, canções da fase solo, das parcerias com Raul Seixas, do Camisa de Vênus e também duas inéditas. O CD foi gravado durante um show na casa noturna Bolshoi, em Goiânia, em comemoração aos 30 anos de carreira, mas quem for ao O;Rilley não deve se prender a rótulos. O artista diz não se sentir atrelado ao passado.
;Não faço um set (lista de músicas do show) com base nos meus 16 sucessos. Toco as músicas dos meus discos de platina, dos de ouro e principalmente dos discos de couro, aqueles que não venderam nada. Meu critério é pessoal, não me baseio em vendagem ou parada. Gosto de surpreender o público e a mim mesmo;, diz.
;Envelhecer não significa perder a qualidade. Tem artistas que estão envelhecendo e estão melhores do que nunca. Veja Lou Reed ou Bob Dylan, o tempo não lhes tirou o talento;, cita o roqueiro quando questionado sobre os shows de velhas lendas. No entanto, pondera, há aqueles que se tornaram caricaturas de si próprios.
Ele destaca o show de Axl Rose, no Rock in Rio, como um desses exemplos. ;O show dele foi tão deprimente que não me fez sequer rir. A banda dele era ruim, o show foi fraco; ele é um arremedo do que foi. Isso é um exemplo pra gente. Jamais quero me tornar uma caricatura de Marcelo Nova;, diz.
LANÇAMENTO DO DVD HOJE
Hoje, às 23h, no O;Rilley Irish Pub (409 Sul Bl. C ). Ingressos: 1; lote (venda antecipada), mulheres, R$ 15 (meia) e homens, R$ 25 (meia). Informações: 3244-0222. Não recomendado para menores de 18 anos.
Duas perguntas // Marcelo Nova
Sobre o rock: Ele morreu, encaretou ou isso é só o fim?
Eu nasci com o rock, tenho 60 anos. O rock é um senhor de 60 anos e evidentemente muita coisa aconteceu. Nos anos 1950, cantavam sobre carros, garotas, sorvetes; a chegada de artistas como Bob Dylan, Lou Reed, inseriu outros elementos. O rock não significa hoje o que significou antes. Não existe isso de bons e velhos tempos. A vida existe agora. A ideia de que o passado era melhor é para pessoas que viveram ou se divertiram intensamente na juventude e hoje estão com uma vida entendiante, modorrenta. O cara que diz que isso "de aquela década lá atrás era uma maravilha", é porque tem uma vida de m#@%. A ideia de que roqueiro não envelhece é uma bobagem, basta olhar o Mick Jagger pra ver o ridículo que é ele rebolando. Estou com 60 anos e adorando. Não sou daqueles que acham que rock é um gênero musical superior. Essa suposição por si só é infantil. A verdade é que 90% do rock hoje no Brasil e fora dele são uma grande porcaria. Estamos enfrentando um período muito fraco em criatividade, mas isso cria ao menos a possibilidade do surgimento de novos artistas, da entrada de sangue novo.
Para encher estádios, os festivais de rock precisam investir no pop ou até mesmo no axé?
Penso que não. Mas se você quiser fazer um festival pra 100 mil pessoas aí não estará privilegiando nada com critério, nada com direção artística, a não ser quantidade. Aí fala com o dono das Casas Bahia. O festival pode ter critério, direção, não precisa durar três dias, mas deve lhe dar orgulho. O Rock in Rio é um guarda-chuva; eles não têm nenhuma ligação com esse gênero musical. Você abriga embaixo dele Metallica, Ivete Sangalo, Shakira. Tudo cabe. O festival é uma marca que gera muito dinheiro, mas que está distante do gênero musical. Eles usam a expressão "rock" porque ela tem o poder comercial muito grande. Rock vende tatuagem, moto, calça jeans, corte de cabelo, caneca, camisa. Como pode Rock in Rio Madri? Ou Lisboa? É uma contradição e, no entanto, são eventos bem sucedidos.