Nem um pouco religioso, recentemente, o diretor goiano W.T. Tede teve a ;não fé; testada: ;Fiquei doente e não saí a pedir socorro pelos céus, ao contrário, fiquei na Terra e procurei médicos e amigos;. Na vida profissional, entretanto, a conversa foi outra: o apoio de pessoas da Assembleia de Deus, de pai de santo, de judeus e de espíritas foi alicerce para a realização do longa Matrículas abertas, vagas limitadas, com lançamento em DVD, hoje, na sessão das 20h do Museu Nacional Honestino Guimarães do Conjunto Cultural da República. A modesta vitrine para o filme, realizado ao longo de sete anos, tem um rompante de sentido para o diretor: ;O cinema brasileiro de hoje vive acoplado a um único canal de televisão, ao qual se submente (sic) em termos de tema, de estética, de financiamento e de distribuição;.
Retratar a apoteose de uma descoberta para o público ; ao registrar desdobramentos sobre agressões contra gays ; é o objetivo do diretor, na narrativa pautada por ensinamentos de Buda: ;A ignorância é dos maiores pecados;, sintetiza Tede. Incitado pelo tema e por uma corrente globalizada de amigos saídos da Argentina, do Chile, da França, da Tunísia e da Alemanha, a publicidade da fita aponta para a ;revolução mundial do arco-íris;. Debater e ;estar do lado certo; da questão está entre os propósitos de Tede, atento para o latente público alvo: ;Acredito que seja o grupo de heteressexuais pouco esclarecidos e conservadores;.
Com a concepção baseada na diversidade e sem unidade na narração, o roteiro acolhe ficção, mas há depoimentos que ;cheiram a documentário;. A partir da formação diversificada, o diretor ; entrevistado de Paris (onde estuda cinema) ;, que foi ator e jornalista, além de ter ingressado no ramo da música, defende uma obra tocada com recursos próprios. ;Em anos, as pessoas aderiram e foram colaborando, à medida que liam o roteiro. Isso até a última gravação, em Paris, com o depoimento de Camille Cabral, primeira francesa de origem brasileira, e transexual, a ser eleita vereadora em Paris. Chegamos a dever mais de R$ 40 mil;, lembra.
Dinheiro público
O apoio ; que mobilizou desde o MinC à Petrobras, passando pelo GDF ; saiu apenas para a reprodução em DVD, com o empenho da produtora Deléia Vasconcelos. ;No filme, há gente tão diferente quanto um casal de ucranianos hare krishna presente na trilha sonora. Israelenses, tunisianos e um basco mostram que tema e enfoque são universais e atemporais. Temos ainda de goianos a brasilienses; de paulistanos a nordestinos;, conta. Na pele do protagonista Messias, Nicanos Jacinto (ator undergroud paulistano) vive um heterossexual conservador e arrivista que quer se salvar à custa de pegar carona na onda gay. Na avaliação do diretor, Leão Lobo, ;jornalista e militante da dignidade homossexual;, revela-se um excelente ator.
Do cinema ;teatral de Fellini, ao discursivo de Woody Allen;, o diretor desfia seu gosto pessoal. ;Gosto ainda de Chaplin e de Polanski. O cinema não é novela de televisão;, completa. Permitindo o exagero na interpretação ; ;cinema é coisa que se assiste apenas uma vez: ou você ganha o espectador de uma tacada, ou o perde; ;, o diretor elogia ;a revelação de Brasília; Gehro Brasile. Em outro departamento, se há ou não militância em Matrículas abertas, vagas limitadas, só a ida à pré-estreia irá confirmar. W.T. Tede, porém, conta que não é gay, ;no sentido técnico do termo;. ;Acredito ainda que isto não tem nada a ver, em termos de arte ou criação. Um amigo meu, um dia cravou que o Chico Buarque devia ser gay por captar poesias e visões tão femininas. Respondi que, se fosse assim, a Agatha Christie seria uma grande assassina;, conclui.
MATRÍCULAS ABERTAS, VAGAS LIMITADAS
Hoje, às 20h, no Museu Nacional Honestino Guimarães do Conjunto Cultural da República. Entrada franca. Não recomendado para menores de 16 anos.