Quando ainda engatinhava nas lições sobre música, já aos cinco anos de idade, Bj;rk Gudmundsdóttir era a aluna que acertava quase todas as questões ; mas que nunca se satisfazia com os métodos dos professores. ;A sensação era de que, para entrar na elite dos alunos, eu teria que praticar violino durante 10 anos, diariamente, religiosamente. Para mim, música não era isso;, lembrou a islandesa, ao site Stereogum. Aos 15 anos, inconformada com a ladainha dos mestres, abandonou as partituras e virou punk. Mas é só agora, aos 45, que ela finalmente resolve a crise escolar. Admite que Biophilia, o oitavo trabalho da carreira, é disco de ;professora frustrada;.
O que não deixa de ser um forma bem-humorada ; e até muito direta ; de descrever um projeto cuja escala de ambição não encontra concorrentes em 2011 (ou em 2010, em 2009;). Porque, de fato, e intencionalmente, o álbum tem um quê educativo. O novo ecossistema da compositora abarca, além do CD em si (que chega ao Brasil via Universal Music), uma série de outros ;organismos;: 10 aplicativos para iPad, instrumentos musicais personalizados, um novo site, um documentário de 90 minutos de duração, shows intimistas e workshops para que as crianças aprendam a criar músicas no computador. Interdisciplinar, o curso prevê um curto-circuito entre biologia, tecnologia e arte: músicas que soam como fenômenos da natureza.
O tamanho desse universo sonoro e didático pode intimidar aquela parte do público que deseja apenas ouvir boa música. Biophilia também se dispõe a isso. As inovações, no entanto, estão à margem das canções. A maior provocação de Bj;rk, desta vez, é usar tecnologia de ponta para recriar (ou divagar sobre) processos naturais. Quatro anos depois de Volta ; um disco ruidoso, ;feminista; ;, a cantora retorna ao casulo delicado de álbuns como Vespertine (2001) e Homogenic (1997). ;O disco anterior era antropológico. Desta vez, a intenção foi mostrar a natureza, mas sem a presença de seres humanos;, comentou. Quase todas as faixas foram compostas com um passar de dedos nas ;touch screens; de iPads ; muitos dos instrumentos foram confeccionados pela própria cantora.
Ousadias
As canções novas mostram a vocação experimental da cantora, em grande parte impaciente para melodias pop. A paisagem, ainda que exuberante, exige do ouvinte espírito de desbravador. Para quem adquirir os aplicativos de iPad (a US$ 10 o pacote, importado), a aventura será digerida com mais prazer: cada faixa prevê um game e um ensaio acadêmico, desenvolvidos por uma equipe de cientistas, professores e desenvolvedores de joguinhos eletrônicos. Na turnê, ela se instalará em pequenas cidades, onde fará shows (com demonstração dos aplicativos e dos instrumentos ;customizados;) e dará aulas por duas semanas.
Para o fã brasileiro, que não terá acesso a esse parque temático, mais importante é saber se o conceito multimídia reavivou a gana musical da musa nórdica, que há muito não produz um álbum capaz de estremecer o solo pop. Segundo os mais céticos, os tentáculos de Biophilia desviam a atenção do público para o fato de que a compositora andaria pouco inspirada. O álbum, porém, foi recebido como um ;retorno à forma; principalmente na Inglaterra, onde ela inicia a turnê. ;Quando eu tinha 18 anos, minhas matérias favoritas eram ciências, física e matemática. Eu era um pouco nerd ; a única garota nos campeonatos de xadrez;, revelou, ao site Pitchfork. Taí uma outra definição possível para Biophilia: uma jornada orgulhosamente nerd.