Circular nos largos corredores da 30; Feira do Livro de Brasília, pelo segundo ano consecutivo instalada no Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade, representa uma caminhada de algumas centenas de metros ; se estiver chovendo, há de se ter algum cuidado com possíveis goteiras. Enquanto caminha, o passante vê nos estandes livros, alguns coloridos o bastante para atrair as crianças, outros que estampam na capa novidades aguardadas (ou desconhecidas) pelos adultos. E também, em meio a exposições e bancas de assinatura de revista, bijuterias, adesivos, brinquedos, bichinhos de pelúcia, doces e itens de artesanato. A visão assustou o servidor público Rodrigo Delgado, que, na tarde fria da última segunda, visitava o evento com a esposa, Camila. ;Achei estranha a presença de boxes de comida e artesanato aqui. É feira de livro ou artesanato?;, disse o leitor, de 30 anos.
Estudante de direito e igualmente acostumada ao ambiente da feira, Camila estranhou a edição atual por outros motivos. ;Na programação, vi poucas atrações. E poucos escritores de Brasília;, indicou. ;A gente não sente o convite para participar das conversas, das palestras. Não há chamamento. O apelo me parece comercial: de comprar e ir embora. A proposta cultural devia ser mais enfática;, diz a visitante, de 24 anos. Já que os preços, reproduções dos valores das livrarias, não convencem, e a participação dos sebos é tímida, Rodrigo defende que a feira assuma um modelo mais ambicioso. ;De repente, funcionaria melhor se trouxessem dois, três nomes nacionais da literatura;, sugere.
Basta ser regional?
Mesmo para quem se diz satisfeito com o estado da feira, especialmente no que diz respeito aos largos espaços dedicados às crianças e à generosidade do grande estacionamento, fica a sensação de que ela agrega um potencial ainda não liberado. O gestor ambiental Renato Boareto, paulista que há oito anos vive em Brasília, passava os dedos numa prateleira enquanto a esposa, Renata, e a filha, Helena, ocupavam-se de atividades do outro lado da livraria. Para ele, a festa carece de projeção fora do Centro-Oeste.
;A feira é muito do DF e não tem tanta divulgação nacional. Considerando os eventos esportivos que teremos nos próximos anos, podia ter vocação nacional;, acredita. Por outro lado, a variedade dos estandes é digna de elogios. ;Acho bom associar gastronomia e artesanato à literatura. Acaba virando uma feira cultural, com o livro sendo âncora disso tudo. Desse jeito, ela tem a cara de Brasília;, observa.
Ana Paula Vilela,42 anos, deixou os dois filhos, os gêmeos Enzo e Diogo, 10, em oficinas infantis ; a de raciocínio lógico foi particularmente útil. Sozinha, folheava livros que poderiam interessar aos filhos. Ela não tem dúvidas: durante a realização do evento, o pavilhão é lugar das crianças. ;A feira é bacana para estimular jovens leitores e iniciar as crianças na leitura;, diz ela.
Ela sente falta de uma melhor organização das lojas, com uma divisão por gênero, por exemplo, e não faz ressalvas quanto à proximidade dos livros de outros artigos. ;Talvez poderiam separar os corredores por temas ou gêneros, com plaquinhas indicando. Para quem já conhece as editoras e livrarias, do jeito que está é mais fácil. Para quem não sabe, não;, recomenda. ;Acho que a presença do artesanato ajuda na propagação da cultura local;, continua. É assim, com elogios moderados, que a Feira do Livro segue tímida, mesmo após 30 anos de existência: a longevidade parece sinônimo de conformidade e resignação.