postado em 01/12/2011 11:45
Em uma carta escrita para uma criança que ainda não nasceu, o escritor americano Russell Banks faz a confissão: ;A minha visão do futuro é sombria, eu sei. Mas só nos resta aprender a chorar;. O sabor da prosa não é doce. Nas previsões do autor, os Estados Unidos chegam a 2031 como um país fantasmagórico, arruinado por um grande colapso econômico. Esperança acabou faz tempo. Chances de final feliz? Quase zero. Mas o texto de Banks é apenas o começo: ele foi escolhido para abrir a coletânea 12 de setembro: a América depois, lançada no Brasil pela editora Record.Uma opção que, por sinal, explica muito sobre o livro, organizado pelos jornalistas franceses Pascal Dellanoy e Jean-Christophe Ogier. A verve crítica, sem falsas promessas, conecta as colaborações de 19 artistas, que foram convocados para responder a uma questão: o que aconteceu (e ainda vai acontecer) aos Estados Unidos depois do 11 de setembro de 2001? Em 208 páginas de textos e ilustrações, a ;coletânea de pensamentos; reúne charges, artigos, entrevistas, histórias em quadrinhos, ensaios poéticos e um conto de Natal. ;Nosso objetivo não era criar um memorial para o 11 de setembro, mas estimular diálogos sobre o tema, 10 anos depois da tragédia;, explicou Ogier, em entrevista à revista francesa Télérama.
A intenção da dupla se manifesta de forma literal, por exemplo, quando os organizadores do livro convidam os jornalistas Roger Cohen (americano) e Jean-Luc Hees (francês) para papear sobre o destino dos Estados Unidos. Ou quando propõe uma troca de correspondências entre o chargista americano Daryl Cagle e o francês Plantu, do jornal Le Monde. A experiência rende alguns dos momentos mais inspirados do livro, que evita lugares-comuns ao fragmentar os pontos de vista sobre os atentados terroristas de 2001. É larga a distância que separa as provocações de Russell Banks da entrevista ponderada com o arquiteto Jacques Ferrier, que discute as transformações do espaço urbano de Nova York após a queda das Torres Gêmeas.
Corporações
Para o fã de quadrinhos, os ensaios jornalísticos não serão páreo para o conto apocalíptico Projeto Nostradamus, do maltês Joe Sacco ; que, na tradição de um Aldous Huxley, imagina um futuro especialmente sombrio para a América, cujo governo passa a ser patrocinado por corporações. Nesse ambiente totalitário, os executivos guiam a república enquanto dirigem carrinhos de golfe. Ainda mais assustadora é a graphic novel de Miles Hyman e Jerome Charyn, Encontro, que relembra o pânico sofrido por pessoas comuns afetadas pelos atentados. Já o argentino José Muñoz faz uma sátira às relações de poder numa visita irreverente à cozinha da Casa Branca.
Vencedor do Pulitzer pela série de HQ Maus, Art Spiegelman aparece em uma entrevista extensa, conduzida por Ogier e Dellanoy. Na conversa, comenta sobre o ;planeta Google; e as decepções com um país que insiste numa ;aventura militar sem fim;. ;A coisa mais assustadora, para mim, foi ver os veículos militares na Canal Street depois do 11 de setembro. Foi o sinal de que algo tinha acabado;, lembra. 12 de setembro, o livro, divaga sobre o ;day after; desse fim de mundo.
12 DE SETEMBRO: A AMÉRICA DEPOIS
Organizado por Pascal Dellanoy e Jean-Christophe Ogier. Tradução
de André Gordirro, Carmem Cacciacarro e Gabriel Zide Neto. Record, 208 páginas, R$ 49,90.