Quando saiu do Cordel do Fogo Encantado, em fevereiro de 2010, depois de 11 anos na banda (e três na peça de mesmo nome), Lirinha dizia sentir uma “vital necessidade de trilhar novos caminhos”. Por isso, Lira, seu primeiro disco solo, produzido por Pupillo (baterista da Nação Zumbi), foi muito pensado antes de ser gravado. Ao longo de um ano e meio, o cantor e compositor pernambucano virou noites conversando com Pupillo sobre o álbum, procurando sonoridades (Velvet Underground é uma das inspirações), aprendendo a escrever poesia de outras formas. Menos teatral, mais melodioso, aí está o “novo” José Paes de Lira. “Joinha”, como diz o conterrâneo China.
No disco — que ele lança em Brasília no próximo dia 23, em show gratuito no gramado da Funarte, pela 7ª edição do projeto Arte e Cidadania —, Lira está cercado de amigos. Com Ângela Ro Ro e Otto, por exemplo, ele canta Valete, a história da moça que se apaixona por uma carta de baralho, o valete de paus.
Em Adebayor, feita para o atacante togolês (“Quero ver mais um gol vagalume de Adebayor”), tem a seu lado Lula Côrtes tocando o tricórdio, instrumento com que gravou o lendário LP Paêbiru em 1974. Último registro de Lula em estúdio (ele morreu em 26 de março), Adebayor foi considerada pelo jornal britânico The Guardian uma das 35 melhores músicas de outubro (do mundo todo).
As 12 faixas do álbum, lançadas primeiro na web (com download gratuito) e agora em formato físico, são quase todas assinadas pelo cantor — algumas com parceiros como Bactéria, tecladista do Mundo Livre S/A (Ducontra, Nada a fazer); Jorge Du Peixe, vocalista da Nação Zumbi (Sidarta); e Fábio Trummer, guitarra e voz do Eddie (Memória, Ela vai dançar). A exceção é My life, escrita e cantada (em inglês) por João, o filho de Lirinha, de 9 anos.
A banda de base é formada por Pupillo (bateria e percussão), Bactéria (pianos, teclados e sintetizadores) e Neilton, ex-integrante da banda Devotos (guitarras). E em quase todas as faixas aparecem convidados — do cantor Junio Barreto, no backing vocal de três músicas, ao guitarrista Fernando Catatau (do Cidadão Instigado), no violão de aço de Sidarta (“Se é pra viver é pra morrer/ E se é pra morrer, viveremos/ Leva eu, Sidarta”).
Bem cercado, o “contador” de poesia, que começou a carreira aos 12 anos declamando em Arcoverde, no sertão pernambucano, brinca com as palavras, com as lembranças (“A minha história é canção de bêbados/ Feito uma árvore/ que come pássaros”, diz, na ótima Memória). Faz isso de forma mais pessoal do que no Cordel (lá eram personagens, aqui é ele), embora ainda siga sua primeira escola, a dos cantadores. Mais pop do que antes, e delirante como sempre (sim, isso é bom), Lira trilha novos caminhos numa viagem visceral e instigante.