Diversão e Arte

Noites e os bares da cidade, nos anos 1980, foram a escola de Cássia Eller

Irlam Rocha Lima
postado em 29/12/2011 09:36
Cássia Eller estava no auge da carreira quando, em 29 de dezembro de 2001, morreu no Rio de Janeiro vítima de infarto do miocárdio. Naquele ano, a cantora vivera um período extremamente produtivo. Em 13 de janeiro, apresentou-se no Rock in Rio para 190 mil pessoas, dividindo o palco principal com R.E.M., Foo Fighters, Beck, Barão Vermelho e Fernanda Abreu. Dois meses depois, gravou o DVD Acústico MTV, nome também da turnê desgastante que a levou a fazer 95 shows, entre maio e dezembro.

Roqueira por atitude e comportamento, Cássia foi intérprete de diferentes gêneros da MPB e, 10 anos depois de iniciar uma das mais bem avaliadas trajetórias artísticas na cena nacional, convivia com o status de grande estrela. Do legado deixado por ela, fazem parte 11 CDs e cinco DVDs. O último show de Cássia, em Brasília, aconteceu em 7 de agosto de 2001, na Sala Villa-Lobos, tendo o amigo Nando Reis como convidado.

A artista, que hoje é cultuada por diferentes gerações em todo o país, nasceu no Rio de Janeiro e viveu em Minas Gerais até o começo da adolescência. Mas foi em Brasília que ela se revelou, na primeira metade da década de 1980, logo depois de vir morar na capital na companhia da família, no Setor Militar Urbano ; filha de um sargento paraquedista do Exército e de uma dona de casa.

Aos 17 anos, Cássia passou a se dedicar à música com paixão. Cantou em bares da cidade, fez shows em teatros, foi vocalista de trio elétrico (o Massa Real, criado por Ivan Sérgio), participou de musicais e integrou o coro de uma ópera. Chegou inclusive a criar (em parceria com Dora Galesso) a trilha sonora do curta-metragem Patativa do Assaré, um poeta do povo, dirigido por Jefferson Albuquerque Jr. e Rosemberg Cariry, ganhador de prêmio de melhor filme pelo júri popular do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro de 1984.
Dora Galesso:
Em 1982, a cantora foi selecionada para o elenco de Veja você, Brasília, musical dirigido por Oswaldo Montenegro, no qual atuou ao lado de Zélia Cristina, que viria a se tornar famosa como Zélia Duncan. O espetáculo cumpriu temporada vitoriosa na Sala Villa-Lobos. ;Tomei um susto na primeira vez que a ouvi. Fiquei desconcertado. Havia um som rouco saindo daquela garganta muito musical e, ao mesmo tempo, muito duro e seco. Fui para o Beirute, me encontrei com a galera e falei alto: hoje ouvi a maior cantora do Brasil;, revela, emocionado, Montenegro.

Sua voz grave e seu ecletismo musical se adequaram totalmente à banda Malas e Bagagens, criada pela pianista Dora Galesso, de quem se tornou grande amiga. ;Estava à procura de uma vocalista quando fui apresentada à Cássia. Já no primeiro encontro fiquei impressionada com aquele timbre, com aquele jeito de ser dela. Na casa da minha mãe, ficávamos tocando noite a dentro, ela ao violão e eu ao piano, e ouvíamos Edith Piaf, Billie Holliday, Nina Simone e Beatles; e gravamos algumas coisas que guardo em fita cassete;, recorda-se Dora. O Malas e Bagagens durou três anos, mas a amizade entre as duas manteve-se intacta.

Porgy and bess

Outra grande amiga de Cássia, a hoje cantora lírica Janette Dornellas, a conheceu nos ensaios da ópera Porgy and bess, de George Gershwin. ;Insisti muito para me aproximar dela. Já a tinha ouvido cantar e passei a admirá-la. Durante a encenação da ópera, nos tornamos amigas e, com Marcelo Saback (que também participou da montagem), passamos a sair juntos. Íamos toda noite ao Beirute, que, por muito tempo, passou a ser nosso ponto de encontro. Lá, enquanto todo mundo tomava chope, Cássia sempre bebia cachaça com guaraná;, lembra, sorrindo. Naquela época, as duas fizeram um show na Villa-Lobos, intitulado Dose dupla, dirigidas por Márcio Faraco, outro integrante da turma e que hoje mora na França.
Janette Dornellas:
Presidente da Associação Ópera de Brasília, Asta Rose Alcaide produziu Porgy and bess. Como Cássia era apenas corista, ela teve pouco contato com a cantora, até porque o elenco era grande, mas lembra dela. ;Cássia era mezzo-soprano e estava no começo da carreira, mas senti naquela menina, por suas atitudes, uma pessoa de personalidade marcante. Não me surpreendi quando ela se tornou uma cantora famosa.;

Sucesso, Cássia faria antes mesmo de se tornar uma estrela da música brasileira, ao protagonizar com Marcelo Saback, o show Gigolôs, escrito e dirigido por Alexandre Ribondi. O espetáculo estreou na Sala Funarte (que viria, posteriormente a receber o nome de Cássia Eller) e depois ficou em cartaz na Villa-Lobos. ;Cássia nunca gostou de usar vestido, só calçava tênis. No Gigolôs, ela foi para o palco com um modelo bordado com lantejoulas e de sapato alto. Tive que ensiná-la a se equilibrar no salto alto, pois eu havia usado um igual na peça Crepe Suzette. Ela tinha domínio absoluto da voz e quando a soltava, encantava a todos;, lembra Ribondi.

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