Diversão e Arte

O traço certo do artista brasiliense Virgílio Neto

postado em 31/12/2011 13:55
Fluxo-floema é o título de um livro da escritora Hilda Hilst, mas poderia, também, intitular a obra e o processo criativo do artista brasiliense Virgílio Neto. Pois, a combinação destas palavras significa algo que flui, e a obra dele não segue as margens, fronteiras ou proporções. No entanto, não é algo como o cubismo de Pablo Picasso nem surrealista, como as pinturas oníricas de Salvador Dalí. Os traços são sobrepostos e orgânicos, se espalham no papel e imprimem as experiências visuais, literárias, musicais, ou seja, tudo que aguça o olhar dele.

Em algumas obras, além das figuras humanas, animalescas e outras, estão escritos nomes como o de Jorge Luis Borges, Milan Kundera, Gal Costa e até mesmo o de Hilda Hilst, que se misturam aos outros elementos. ;Você sempre tira coisas, vai pegando um pouco de tudo, não tem alguém ou algo, unicamente, que me inspire;, explica Virgílio. A liberdade é percebida tanto nos desenhos quanto na sua personalidade leve e jovial, desde o jeito articulado de falar até o tênis All Star vermelho jogado no canto do quarto.

Toda a sua produção é fruto de pesquisas e horas de estudo. Aí, desmistifica-se a ideia de que o ato de criar vem de uma inspiração repentina ou de um momento de epifania. Para ele, o ofício de artista exige labor, entrega. ;Deve-se encarar o trabalho para o desenvolvimento. Não tem isso de estar ou não estar inspirado. Tem que ler, pesquisar, rever os desenhos, jogar fora os que você não gostou. Assim o trabalho vai tomando um corpo.;

É em um quarto, no Espaço Laje (uma casa aconchegante localizada na 708 Sul), que ele produz. Lá, estão espalhadas ; pelas paredes do seu ateliê (ou quarto) ou guardadas em caixas ; imagens de pessoas, arquitetura, fotos pessoais e tiradas de internet, recortes de revistas, que servem como arquivo e nas quais busca alguma informação e referências. Uma das séries de desenhos, por exemplo, retrata o vazio nos espaços físicos; ideia criada depois de ver sucessivas imagens de apartamentos e casas desocupadas.

Afinidade
O desenho e a escolha da arte como profissão não foram coisas planejadas desde criança. A sua história como artista começou como a de muitas pessoas que, depois de terminarem o ensino médio, deixam a cidade natal e migram para estudar, na capital. No caso dele, saiu de Anápolis (GO) e cursou design de programação visual na Universidade de Brasília (UnB), por afinidade com a área visual e o talento para desenhar, este sim, adquirido desde a infância.

Essa mudança o possibilitou entrar em contato com um mundo cheio de informações e coisas a descobrir. Hoje, com 24 , já conquistou bons resultados e reconhecimento do seu trabalho. Foi selecionado para participar do salão Rumos Artes Visuais 2011/2013, do instituto Itaú Cultural, considerado uma das principais curadorias do país. ;Eu me lembro de ter ido visitar a exposição do Rumos três anos atrás e via com um certo distanciamento. Você fica com medo, porque a galera tá fazendo coisa totalmente diferente do que eu estou fazendo. Eu ficava pesando: será que eu estou no caminho certo? Aí eu mandei meu material e foi legal ter sido selecionado.;

Compromisso
A liberdade autoral se afirmou depois de uma temporada de quase um ano em Londres. O contato com galerias, museus, a cultura londrina e a oportunidade de passar um tempo sem compromisso fizeram com que ele produzisse sem pensar em regras e clientes. ;Como eu não tinha nada o que fazer lá, obrigatoriamente, comecei a me aproximar das coisas que me interessavam. E também foi em Londres que me deu vontade de voltar para o Brasil e fazer alguma coisa nessa área;.

Depois de ser selecionado para o Rumos, ter participado do Salão Novíssimos, no Rio de Janeiro, e realizar a primeira individual no Museu de Arte Contemporânea do Mato Grosso do Sul (Marco), ele diz que a carreira fica mais crível. ;No começo o artista novo tem uma insegurança natural. A gente vai criando nossas noias. Mas, o negócio é acreditar no que você está fazendo. Na arte tem muito isso de estar em compromisso com a sua pesquisa, não tente inventar moda. Se eu faço desenho, é no desenho eu tô, é onde eu to me encontrando para fazer as coisas e minhas pesquisas imagéticas;.

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