postado em 19/01/2012 08:00
Se estivesse viva hoje, em plena era digital, será que Nara Leão resistiria aos encantos da internet? Não dá para saber. O ;será?; é vago demais para uma artista tão delicada como Nara. De certo, só se sabe que agora o legado da musa da bossa nova está oficialmente na rede, em www.naraleao. com. br, site idealizado e produzido pela filha Isabel Diegues, que faz um apanhado importantíssimo da carreira da cantora.
Hoje, Nara Leão completaria 70 anos. Com a criação do site, sua filha preservou o trabalho da mãe e tornou o endereço a fonte oficial de informações sobre a cantora. ;Em 19 de janeiro de 2012, minha mãe faria 70 anos. E esse é o meu presente: compartilhar sua obra para que todos possam se deliciar, ouvir e pesquisar à vontade;, disse Isabel em sua página no Facebook. Não há nenhuma outra homenagem oficial para o aniversário de Nara. Nem mesmo um show especial.
Lançado oficialmente no dia 5 de janeiro, o site permite que os internautas ouçam os 23 álbuns lançados por Nara durante a sua carreira. Dá para ouvir, não dá para baixar. Opinião, que inspirou o espetáculo musical homônimo, estrelado por Nara, Zé Keti e João do Vale, em 1964, é uma dessas obras-primas.
No álbum ...e que tudo mais vá pro inferno (1968), com músicas de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, uma curiosidade chama a atenção. A faixa-título não está disponível. Culpa da implicância que o rei teve com a música, em especial com o ;inferno;, impensável para o cantor, que tomou um rumo cada vez mais religioso na sua trajetória. O álbum ganhou versão em castelhano, em 1979. Entre as canções, Olha e Como é grande o meu amor por você.
Outro destaque é Os meus amigos são um barato, de 1977. O disco tem a participação de Caetano Veloso (Odara), Gilberto Gil (Sarará miolo), Dominguinhos (Chegando de mansinho), Chico Buarque (João e Maria), Tom Jobim (Fotografia), entre outros. Vale muito a pena ler o texto de apresentação do álbum em que a cantora narra os convites para as participações. A apresentação tem parte superinteressantes, como quando ela diz: ;Caetano mandou uma fita, com um recado: ;Narinha, aí vai Odara. Sei que é seu aniversário. Odara quer dizer, em yorubá nagô, bonito, bom, bacana. Será que você vai gostar?;. Adorei. Caetano canta tão bem;, escreveu.
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Em 1971, a bossa nova está ali, viva e pulsante em Dez anos depois, disco duplo com Insensatez, Corcovado, Garota de Ipanema e Por toda minha vida. Em 1984, o gênero retorna em Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim, onde canta Por causa de você e Wave. O disco marcou a volta da cantora ao repertório de bossa nova. Dá para ouvir tudo e o melhor: de graça.
Exame de caligrafia
Na seção Documentos, registros históricos foram digitalizados, como um exame de caligrafia de Nara, aos 6 anos, que mostra sua queda pelas palavras, no poema intitulado O coração. Um trabalho de 1974 da faculdade de psicologia também está lá, além das impressões de Nara ao visitar, pela primeira vez, um hospital psiquiátrico em 1978. Amarelado, o programa oficial do show Opinião, com Nara, João do Vale e Zé Kéti, no Teatro de Arena, em São Paulo, está registrado no site.
Nos vídeos, podem ser vistos duetos como em Por causa de você, com Roberto Menescal, e em Meu ego, com Erasmo Carlos. Além da interpretação de Além do horizonte, em clipe gravado para o programa Fantástico, em 1978, e As tears go by, do grupo Rolling Stones, em um festival da Record.
A biografia da capixaba está ali para quem deseja conhecê-la melhor e não quer cair nas armadilhas de sites que contam com biografias não autorizadas. Lá, estão datados momentos importantes, como as reuniões dos jovens músicos da bossa nova, no apartamento de Nara, localizado no edifício Champ-Elysées, em frente ao Posto 4 da Avenida Atlântica, em Copacabana, no ano de 1957. Esses encontros seriam o ponto de partida para a carreira de Nara Leão.
A galeria de imagens do site é dividida por décadas e registra cliques raríssimos, de momentos pessoais ao lado dos filhos, Francisco e Isabel, e com o ex-marido, o cineasta Cacá Diegues. Entre essas imagens, estão várias com Roberto Menescal, outras tantas com Chico Buarque e uma na qual compartilha o palco com Sérgio Mendes em um show em Tóquio (1964).
Em 1989, Nara Leão lançou My foolish heart, disco em inglês com versões feitas por ela e por Nelson Motta. Ela morreu no mesmo ano, vítima de um tumor no cérebro. Acompanhado do melhor da tecnologia, o site resgata as palavras do poeta Ferreira Gullar, em poema escrito para a Nara: ;Sua voz, quando ela canta, me lembra um pássaro. Mas não um pássaro cantando. Lembra um pássaro voando;, disse.