postado em 05/02/2012 19:30
[FOTO1]Quando ainda era uma garotinha, Naira Carneiro já estava habituada à dinâmica da criação artística, de tanto saltitar pelos ensaios que a mãe, a atriz, bailarina, palhaça e contadora de histórias Eliana Carneiro, organizava na casa da família. Aos 6 anos de idade, agarrou alguns tecidos comprados para a caracterização da próxima montagem da companhia Os Buriti, e decretou: ;Estes serão para o meu figurino;. A mãe acatou o desejo da filha e a incluiu no espetáculo. Naira nunca mais saiu dos holofotes: acabou crescendo diante deles.
Hoje, a atriz, que completa 23 anos esta semana, volta ao palco com uma personagem que interpreta desde os 14. Na peça O marajá sonhador e outras histórias, dá vida a um menino peralta, criado no luxo de palácios, que vive pregando peças na mãe. ;Começamos a ensaiar quando eu tinha 14 anos. Minha mãe tinha medo de que eu entrasse na crise de adolescência e ficasse com vergonha de interpretar um menino. Mas quanto mais o tempo ia passando, mais eu gostava de fazer;, relata ela. A peça, que estreou em 2004, foi revisitada algumas vezes por mãe e filha, hoje parceiras profissionais, e será encenada hoje, às 16h e às 20h, na Sala Martins Penna do Teatro Nacional, como parte da programação do Festival Internacional de Artes de Brasília (Festiarte).
O espetáculo passou por mudanças ao longo dos anos: era narrado e tinha uma trilha sonora, as atrizes não falavam ; dançavam e davam vida às personagens. Depois, veio o desejo de fazer música ao vivo no palco e O marajá; ganhou uma segunda trilha, composta por músicos espanhóis, durante a passagem da peça por lá. Atualmente, a encenação é complementada por uma terceira versão, composta pelos músicos Jorge Brasil e André Togni. Nesse meio-tempo, Naira também foi evoluindo: ;Foi um amadurecimento corporal, vocal e de interpretação. A gente vai repetindo, repetindo e agregando ao processo tudo o que aprende. A narração vai se aprimorando, a gente brinca mais em cena;, explica.
Puro instinto
No princípio, a vontade de atuar era puro instinto. O pai, cenógrafo, contava com a ajuda da menina para fazer adereços. Observando a mãe e os colegas, ela foi tomando gosto. Aprendeu os princípios fundamentais do ofício (não ficar de costas para a plateia, formas de se posicionar, interação com a público) e foi em frente. Aos 8 anos, participou de um musical e acabou decorando as falas de todos ; e corrigindo os outros atores. Depois de se mudar com a família para São Paulo, aos 11 anos, é que começou a se dedicar a aulas de percussão e canto.
Em Portugal, próxima parada dos Carneiros, ela estudou balé, dança contemporânea e até ritmos portugueses, durante dois anos. Além de cantar e tocar violão, hoje se dedica à sanfona. Certa vez, ganhou um pífano do mestre Zé do Pife, aprendeu algumas músicas e foi convidada por ele para integrar o grupo das Juvelinas, que sempre o acompanha. Recém-formada em artes cênicas pela Universidade de Brasília, abordou, em seu trabalho de conclusão de curso, a arte da contação de histórias. Não por acaso, O marajá sonhador inaugurou este capítulo na história das artistas.
São seis histórias diferentes, quatro escritas por Eliana, mãe de Naira. A outra é uma adaptação do poema Cobra Norato, de Raul Bopp, baseado no folclore brasileiro. Ainda há Vassalissa, história inspirada em um conto russo. ;É meu espetáculo mais querido, apresento com muito gosto. É engraçado porque sempre vejo fotos e, mesmo as recentes, acho que são antigas, porque é uma experiência que me acompanha faz muito tempo. Entro na personagem e me sinto um pouco mais nova. Volto à sensibilidade da infância;, conta a atriz, que pretende continuar crescendo, e aparecendo, diante dos espectadores.
O marajá sonhador e outras histórias
Com Eliana Carneiro, Naira Carneiro e os músicos Jorge Brasil e André Togni. Hoje, às 16h e às 20h, na Sala Martins Penna do Teatro Nacional (Setor Cultural Norte, Via N2; 3325-6239). Entrada franca, mediante retirada de ingressos a partir das 14h. Classificação indicativa livre.
Três perguntas - Naira Carneiro
Como é trabalhar com a mãe? Ela acaba sendo mais rígida ou mais afetiva do que um colega com quem não se tem parentesco?
Ela é muito afetiva. Temos uma relação linda e nos respeitamos. Estou sempre participando ativamente dos espetáculos, sugiro coisas e, muitas vezes, ela aceita. Atuo em todas as frentes, faço cenário, confecciono peças. Tenho essa liberdade de atuação.
Suas primeiras experiências em cena foram tranquilas? Dava trabalho nos ensaios, com as peraltices infantis?
Minha mãe sempre me deixou muito livre, não me dava coreografias muito exatas. Isso me deu a segurança e a liberdade que hoje eu tenho. No primeiro espetáculo, eu entrava em cena e dançava com um boneco. O tempo que eu ia levar dançando, eu decidia, de acordo com o humor e a vontade de estar no palco. Com o Marajá, foi a mesma coisa. Minha mãe conta que, quando a gente ia se apresentar nas escolas, todo mundo ficava com medo de a meninada tocar o terror, eu entrava tranquila e fazia o que tinha que fazer.
Além de interpretar o marajá, de que outras formas você participa do espetáculo?
Narro histórias e também interpreto a Vassalissa. É um conto russo, que desfia a história de uma menina que perde a mãe, mas, pouco antes, ganha uma boneca dela, como recordação. Essa boneca tem poderes especiais, conversa com sua dona. O pai da menina acaba se casando e a madrasta a maltrata. Um dia, manda Vassalissa buscar fogo na casa de uma bruxa. Ela é aprisionada e precisa passar por provações até conseguir levar o fogo, e a boneca a ajuda nesse processo. É uma história sobre provações e ritos de passagem.