Agência France-Presse
postado em 14/08/2012 20:13
Los Angeles - O ator americano Kirk Douglas, uma lenda viva do cinema, relembrou a era do "macarthismo", em um cinema de Hollywood onde foi exibida uma versão restaurada de "Spartacus", filme que conta com uma insinuante cena homossexual censurada em seu lançamento, em 1960.Douglas, 95 anos, foi ovacionado pelo público ao entrar na sala antes do início da projeção e, vestindo terno bege e camisa preta sem gravata, sentou-se no palco para falar de sua obra-prima durante o Festival de Cinema de 70mm da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. "Quando você tem 95 anos, não olha para frente. Olha para trás e faz balanços", disse Douglas, falando com dificuldade por causa da idade e de uma trombose leve que sofreu nos anos 1990. "Estou muito orgulhoso de ser um membro da comunidade de Hollywood", acrescentou, em alusão ao seu próprio "balanço".
"Porque em Hollywood você não está entre republicanos ou democratas, está entre americanos", acrescentou. "Fico orgulhoso com caras como (os atores) George Clooney e Sean Penn, que usam seu dinheiro para ajudar outras pessoas", continuou.
[SAIBAMAIS]O filme, ganhador de quatro Oscar, foi produzido e estrelado por Douglas, com direção de Stanley Kubrick e atuação de outros superastros da época, como Lawrence Olivier e Tony Curtis.
Baseado em romance histórico de Howard Fast, o épico de duas horas e meia conta a história real de um gladiador trácio que lidera uma revolta de escravos na Roma antiga. Mas "Spartacus" também se tornou célebre por ter desafiado a censura durante o declínio do "macarthismo", como ficou conhecida a política de perseguição de supostos comunistas, impulsionada pelo então senador Joseph McCarthy, nos anos 1950.
Seu roteirista, Dalton Trumbo - um das mais famosas vítimas da "lista negra" de Hollywood -, foi contratado por Kirk Douglas e recebeu pagamento sob pseudônimo.
Mas o protagonista e artífice do filme pôs o nome verdadeiro de Trumbo nos créditos e por isso atualmente Douglas atribui a si a responsabilidade de ter posto fim à censura das "listas negras". "Não fazem ideia de como esses anos foram terríveis, quando existia essa ;lista negra;", disse o ator na noite de segunda-feira, na sala de cinema do prédio da Academia, em Beverly Hills. "Ninguém empregava ninguém que estivesse na lista negra", disse.
Douglas, talvez o último astro vivo a lutar na Segunda Guerra Mundial (alistou-se em 1941), é pai do também ator Michael Douglas e recebeu três indicações ao Oscar, mas só levou a estatueta em 1996, quando a Academia concedeu a ele o prêmio pelo conjunto da obra.
A versão restaurada de "Spartacus", com alguns altos e baixos no som, mas cores vibrantes, incorpora a famosa cena gay com o discurso sobre "ostras e caracóis", que os produtores tiveram que tirar do filme original por ordem dos censores.
Um jovem Tony Curtis, no papel de Antoninus, é escravo do grande inimigo de Spartacus, Crasso, interpretado por Lawrence Olivier.
Crasso pede que Antoninus entre na banheira com ele e o ajude a se banhar. O erotismo, delicado mas evidente, culmina com um sedutor discurso do governador sobre as diferenças de gostos, após o que ele pergunta ao escravo se prefere ostras ou caracóis. "Gosto dos dois, de ostras e caracóis", diz Crasso na cena em que se percebe o toque de Kubrick, que dirigiria anos depois clássicos como "2001: uma Odisseia no Espaço", "Laranja Mecânica" e "O Iluminado".