Diversão e Arte

Egberto Gismonti surpreende pela disponibilidade e cativa pela simplicidade

"Eu queria ficar sentado, olhando para o morro do Cristo Redentor, com uma prancheta na mão", conta o pianista e violonista fluminense

postado em 17/02/2013 12:08
Egberto Gismonti As respostas parecem estar todas prontas na cabeça de Egberto Gismonti. Mas o modo de contá-las - uma mistura da prosa do homem interiorano com a sutileza do criador universal, genial e virtuoso - é que deixa tudo mais saboroso. Era para ser apenas um papo sobre o lançamento de um disco ao vivo, gravado com Charlie Haden e Jan Garbarek há mais de 30 anos, mas os minutos foram passando, extrapolaram uma hora, e a conversa sobre mil assuntos insinuou-se para preencher esta seção. Aos 65 anos, o pianista e violonista fluminense, nascido na pequena cidade de Carmo, surpreende pela disponibilidade e cativa pela simplicidade. Conta que não tem gostado de viajar, apesar de ser reverenciado mundo afora. "Eu queria ficar sentado, olhando para o morro do Cristo Redentor, com uma prancheta na mão", descreve, citando a paixão por escrever para orquestras. "Venho de banda de coreto", diz, "e o que quero é a alegria da música".

Você escreveu para o Correio nos anos 1980. Como foi a experiência?
O Correio Braziliense, desde a época do Cláudio Lyzias, meu grande amigo, é um jornal que eu conheço e gosto sobremaneira. O Cláudio, na década de 1980, me convenceu a escrever umas crônicas, que cheguei a fazer três ou quatro, uma a cada 10, 15 dias. Esqueci o nome das crônicas. Por isso, criei um vínculo com o jornal. Ele me ligava: ;Aqui é da diretoria, estou cobrando o material que não chegou;. A gente se divertia pra burro. Pouca gente sabe. Eu morria de vergonha na época. Eu dizia: ;Topo. Mas você vai botar o meu nome bem pequeno. Não quero botar um pseudônimo não;. Era divertido. Chamava Meio de transporte. Eu contava que a música transporta e eu estava rodando o mundo. As crônicas não eram tão importantes. O importante era a minha relação com ele, que tinha uma capacidade de convencimento tão grande que até eu, que não queria nada com essa história, ele acabou convencendo. E me cobrava como se eu fosse um contratado (risos).



Faz alguns anos que você não vem a Brasília.
Rapaz, você sabe que eu tô a cada dia querendo viajar menos, né? Seja aqui ou seja fora. As últimas vezes em que aí estive foi para fazer coisas na Sala Villa-Lobos, tocando com a orquestra, música de câmara. Não sei se eu estaria muito interessado em fazer solo, dueto, trio, sabe como é? Não sei se estaria muito inspirado. Se Brasília tivesse um festival que um amigo estivesse fazendo; Fui a Brasília e trabalhei como assistente do Silvio Barbato, em um trabalho longo, que iniciou-se com gravações de compositores brasileiros. Passei um tempo aí.

Conte sobre sua amizade com o Silvio.
A gente era amigo. Dois dias antes de fazer o voo miserento (Barbato morreu em um acidente de avião, em 2009), ele estava aqui em casa e a gente discutindo sobre os três concertos que faríamos (um na Itália e dois em Portugal). A gente brincava de dizer que ;mais uma vez, a Europa curvar-se-ia ao Brasil;. Éramos tão amigos que participei de várias das últimas coisas que ele fez em Brasília. E o levei para Recife, Olinda, ensaiando uma orquestra de meninos de 10, 11 anos. Nos conhecemos por meio de um disco que ele gravou com uma ópera do Carlos Gomes, chamada Colombo. Quando esse troço bateu na minha mão, fiquei encantado que alguém tivesse gravado. Quando ouvi a gravação do Barbato, cacei ele de qualquer jeito. E ele ficou felicíssimo, porque adorava aquilo. E a gente se casou, no sentido de termos uma ideia de necessidade de Brasil muito parecida. Quando se gosta da mesma coisa, ainda mais em música, isso é um casamento violento.

Ouça gravações de Egberto Gismonti

O Sonho

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