postado em 17/03/2013 08:15
Ele já foi chamado de Elvis Presley da filosofia, por seu carisma e sua fala vibrante. Também já despertou polêmicas ao redor do mundo, por posições afiadas e algumas vezes controversas. O esloveno Slavoj Zizek (que inclusive já concorreu à Presidência da República de seu país) mistura a ciência de Platão e Aristóteles à psicanálise, usando bases da teoria lacaniana para analisar o mundo contemporâneo. O pensador veio à cidade participar de um debate sobre o marxismo em tempos de crise. Aproveitou para lançar Menos que nada: Hegel e a sombra do materialismo dialético, no qual aponta a necessidade de um novo projeto para a esquerda. O Correio conversou com Zizek sobre política, felicidade, igreja e a posição do Brasil no cenário global.
Qual o impacto da morte de Hugo Chávez na esfera venezuelana, latino-americana e mundial?
Nunca fui pego pela idolatria a ele. Sempre estive plenamente ciente de suas limitações e de que talvez o problema fosse muito dinheiro de petróleo. Frequentemente eu tinha a impressão de que, em vez de realmente resolver problemas, ele estava atirando dinheiro neles, fazendo com que desaparecessem. Estava alerta para o quão problemáticas eram suas mudanças econômicas, como as cooperativas, a entrega das fábricas aos trabalhadores. Era especialmente crítico, e isso foi um choque para muitos amigos na Europa, a seus amigos na política internacional. Na Europa, se você mencionar o nome Lukachenko, na Bielorrúsia, você não pode ir mais baixo. É como Groucho Marx no poder, um homem totalmente excêntrico e louco. Apesar disso tudo, acho que Chávez é um de nós. Fez coisas que são importantes não só para a América Latina, mas para o mundo todo.
Que coisas são essas?
Todos nós temos essa solidariedade filantrópica, caridade com os pobres, mulheres vestindo Bourjoir preocupadas se as crianças da favela têm remédio o bastante. Isso não significa nada hoje. Não foi ele um dos primeiros a assumir o risco e tentou realmente politizar ativamente as pessoas na favela, os excluídos? Chávez incluiu esse grupo na vida política, fez com que fossem agentes políticos ativos, não só objeto da sua caridade e isso é algo que, francamente, não vejo muito por aí. O urbanista americano Mike Davis escreveu o livro Planeta favela, no qual afirma que as favelas estão surgindo em todo o mundo. As de vocês, na América Latina, não são as maiores. A maior fica na África, entre Nigéria e Costa do Marfim. Eles são excluídos, mas essa não é uma pura exclusão. Eu sei que há capitalismo violento e brutal nesses ambientes. No Brasil, soube que há o termo capitalismo de favela. Incluí-los no sistema político é algo que não acontece, assim como não está acontecendo na China.
Há outros líderes interessantes e fortes na América Latina no momento?
No momento ando cético, não tenho problema com grandes líderes, entendo que eles são parte de um processo emancipatório revolucionário. Mas acho que esses sonhos de multiplicidade de comunidades locais, de auto-gestão sem lideranças, simplesmente não funcionam. Para isso, é preciso um grande aparato do Estado. O problema é que aqui se encontra o sistema do caudilho latino-americano carismático. Pelo lado bom, ele mobiliza as pessoas e por que não? Mas esse modelos têm limitações, mas não penso que esse conceito de líder carismática possa ser exportado, porque em geral ele está lá para encobrir com seu carisma problemas concretos e antagonismos.
Quem é um grande exemplo dessa questão?
O modelo de todos eles é Juan Perón, e muitos argentinos discordam disso, mas foi a maior catástrofe que já aconteceu no país. Claro que foi bom quando ele limitou a oligarquia liberal, mas por causa de sua postura clientelista e corporativista, o país perdeu sua capacidade de desenvolvimento. Não tenho uma posição a priori, bom/mau, mas acho que líderes carismáticos não funcionam.