Diversão e Arte

Artigo: Concerto de um pai coruja

Plácido Fernandes
postado em 06/04/2013 10:00

Ilustração de máscara, trompete e violino

Sempre que tenho algum tempo livre, o que é cada vez mais raro, dedico parte dele à minha filha, Manuela, hoje com 4 anos. Sou a desafinação em pessoa. Mas quando tenho a chance de colocá-la para dormir, não resisto e cantarolo alguma coisa. Aos 2 anos e 4 meses, ela me surpreendeu ao violão tentando tocar e cantar O xote das meninas, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. No momento atual, ;na minha voz;, a preferida dela é Yellow Submarine, de Lennon e McCartney. Dia desses, a mãe a flagrou no instrumento ;improvisando; a canção dos Beatles.


Desde criança, sempre adorei música. Até participei de uma banda infantil com coleguinhas da vizinhança. Íamos assistir aos ensaios do Som Brasil, antiga banda de Salgueiro (PE), e depois tentávamos imitá-los. Infelizmente, esse tempo ficou para trás. Mas, para mim, a música nunca deixou de ser a mais sublime e arrebatadora forma de expressão da humanidade. Já adulto, quando consegui juntar dinheiro o suficiente para comprar um violão, fiquei desapontado com a minha completa descoordenação motora e tamanha falta de ritmo.

Vez ou outra volto a insistir no instrumento. Mas logo recuo. Não dá. É uma coisa tosca. Frustrante. Ainda mais agora que meu maior fascínio é o jazz. Todo esse texto veio à tona porque, antes de começar a escrever, inventei de ouvir Miles Davis no inspirado Sketches of Spain, álbum baseado no Concierto de Aranjuez, do espanhol Joaquín Rodrigo. Era só para relaxar. Abstrair a mente. Mas o quê? Ao ouvir o som do trompete, não consegui me fixar em mais nada. O jeito foi escrever sobre a peça.

Enquanto viajava no som magnífico de Miles, lembrei-me de que já passa da hora de pôr Manuela para ter aulas de música. Não por imposição, mas porque ela vive me cobrando a compra de um violão ;pequeno; para ;tocar;. No carro, quando o CD da vez é algo de Lenine ou Mingus, ela já identifica e, mesmo sem saber o nome do compositor, pede a faixa preferida dela. No caso de Lenine, é ;a música do Visconde;. No de Mingus, ela improvisa com a boca alguns acordes de Fables of Faubus. Na primeira vez que ouvi, quase não acreditei. Os olhos do pai coruja marejaram.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação