Quando recebeu a notícia de que havia sido selecionado na audição da ópera Olga para viver Filinto Müller, o tenor Homero Velho foi pesquisar a vida do tenentista dissidente que virou chefe de polícia de Getúlio Vargas. Quanto mais fuçava, mais se impressionava. E quanto mais avançava no tempo, mais se surpreendia com os tentáculos de Müller. Em 1973, Velho já era nascido, e o carrasco do casal Olga Benário e Luís Carlos Prestes ainda circulava pelas altas instâncias do poder, como presidente da Arena e do Senado. ;É o melhor personagem da ópera. Normalmente, os canalhas são os melhores;, concluiu.
Para interpretar Filinto Müller no 3; Festival de Ópera de Brasília, o tenor precisava encontrar uma maneira de não ser caricato e de concentrar a crueldade da qual o personagem era capaz em duas ou três aparições. Pouco tempo para uma carga pesada. Deixou o bigode crescer e vasculhou no baú de experiências com óperas históricas a dose certa de interpretação. Acabou, nas palavras dos colegas Martha Herr (Olga) e Adriano Pinheiro (Prestes), encarnando um vilão perfeito.
Aos 40 anos, Velho tornou-se um dos tenores mais comprometidos com a ópera contemporânea brasileira. Não que tenha traçado planos estratégicos para construir essa carreira, mas soube se encaixar, enxergar o potencial, se satisfazer profissionalmente e aproveitar o momento. Das 35 óperas escritas por compositores brasileiros na última década, 21 foram encenadas e o tenor esteve em cinco delas. ;Se estou no Brasil e posso fazer uma coisa que ninguém fez, por que não? Para o bem ou para o mal, sou a pessoa que fez pela primeira vez quatro ou cinco óperas brasileiras. Tem relevância? Nenhuma. Mas tem um prazer pessoal enorme. Não é uma obra de grandes projeções fora do país, mas se é algo importante para quem está fazendo e se a plateia, mesmo pequena, gostou, já é suficiente;, diz.
