Diversão e Arte

Em entrevista, escritor de Necrópole fala sobre carreira e criação da obra

O esloveno Boris Pahor completou em 2013 um século de vida. Para quem passou por duas guerras mundiais, viver por tanto tempo traz significados diferentes para as lembranças

postado em 07/01/2014 09:17

Pahor: Eu não escrevi para ganhar prêmios, escrevi porque queria escrever, era um alívio, uma forma de descarregar o que tinha dentro

A voz ao telefone mostra o cansaço de um homem de 100 anos. As palavras constroem imagens tristes de alguém que passou por duas guerras mundiais, uma delas como prisioneiro em um campo de concentração nazista, ditaduras e pela tentativa de apagar sua cultura materna. Da conversa de uma hora, a vitalidade do escritor se mostra nas memórias ainda muito vivas. Boris Pahor escreveu mais de 30 livros, muitos deles baseados no que viu e viveu. O tempo passa diferente hoje para o homem que carrega como desejo pungente em sua rotina conseguir escrever coisas belas.

Necrópole, obra traduzida para 13 línguas, inclusive o esperanto, foi escrito em 1967 após uma visita do escritor ao campo de concentração de Natzweiler-Struthof, na Alemanha, que havia se transformado em museu. O retorno à prisão deu origem a uma das narrativas mais importantes da literatura sobre as atrocidades do nazismo.

O trabalho autobiográfico é marcado por descrições que tiram o fôlego do leitor. Os detalhes dos dias de terror não se perderam na memória e na vontade de esquecer. Com o passar dos capítulos, o autor mantém a linguagem forte e crua, sem que a frieza diante dos fatos narrados tomem conta da história. A obra demorou mais de 20 anos para ser traduzida pela primeira vez para outra língua. Em 2013, o livro ganhou versão em português pela editora Bertrand Brasil.



Pahor nasceu em Trieste, Itália, dentro da comunidade minoritária eslovena. Durante a Segunda Guerra Mundial, colaborou com a resistência antifascista eslovena e foi deportado para os campos de concentração nazistas. Lecionou por 24 anos literatura italiana e eslovena. Já foi indicado ao Prêmio Nobel de Literatura. Em 1992, recebeu o Prêmio Pre;eren, o mais alto reconhecimento esloveno, por sua atividade literária. Em 2007, recebeu a Ordem Nacional da Legião de Honra do governo francês; e, em 2009, a Condecoração Austríaca de Ciência e Arte dada pelo governo daquele país.

Suas experiências o marcaram profundamente tanto na vida pessoal quanto na produção literária. Os resquícios podem ser observados em seus livros. O autor não se cansa de dizer que o amor é o único valor pelo qual o homem pode ser aliviado do mal. Mais do que um escritor, alguém para se admirar.

Por que escreveu Necrópole?

Eu escrevi para meus amigos que morreram, porque é preciso lembrar que deram a vida pela liberdade. Nos campos de concentração, morria-se por falta de comida, por doenças e pelas mãos dos homens.

O senhor mudaria algo no seu livro?

Mudar? Poderia escrever um livro maior, mas não mudaria nada.

O que gostaria de apagar da sua memória?

Não há como eliminar lembranças. A partir do momento que vivemos algo, podemos deixar de lado, mas não apagar. Tudo que está na memória está ligado a outras experiências. Há memórias terríveis, mas não se deve eliminar porque são ruins. É preciso acostumar-se a elas, acostumar-se para conseguir viver momentos belos. As memórias têm riquezas, mesmo quando tristes.

A matéria completa está disponível para assinantes. Para assinar, clique

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação