Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Novos lançamentos mostram como anda a cena heavy metal brasileira

Novidades das bandas Noturnall, Devachan e Kappa Crucis trazem o selo da produtora Som do Darma



O competente trabalho da Som do Darma recentemente resultou em apresentações por vários palcos europeus da banda mineira Uganga, quinteto thrashcore oriundo de Araguari com mais de 20 anos de estrada e que mostrou trechos de sua passagem pelo velho continente no DVD Eurocaos ao vivo, lançado com o apoio da empresa de Tomasi, em 2010. Serviu de apoio também para o true metal da não menos calejada banda paulista Hellish War (vide seu demolidor CD ;Keep it hellish;). Sem perder o fôlego, agora a Som do Darma vem expandir suas múltiplas intervenções com os lançamentos dos CD dos grupos Kappa Crucis (;Rocks;), Devachan (;Andarilho;) e Noturnall (;Noturnall;).

Morada dos Deuses

Fruto de tradições que remontam à música caipira mais autêntica, a população que hoje habita a pequenina cidade do interior paulista de Boituva talvez jamais imaginasse que seria berço de uma das formações emergentes mais promissoras da novíssima cena metálica nacional, o quinteto Devachan ; ou ;Morada dos Deuses;, em sânscrito.

O ;extended play; de estreia, provido pela equipe da Som do Darma com uma belísssima arte gráfica, em lúdico formato digipack, traz seis amostras de uma sonoridade que se revela a um só tempo agressiva e trespassada por referências esotéricas. Aberta a influências angariadas no rock progressivo e na música erudita, composições como a faixa-título e ;Mentalis corpus; ; todas tendo como diferencial letras cantadas em português ; foram escritas pelo também baixista Daniel Dias e se mostram razoavelmente urdidas, ainda que, em termos sônicos, a banda precise, no futuro, sair da sombra de nomes referenciais para seu estilo mais melódico, vide Queensryche, Nightwish e Dream Theater.



E aí, Apiaí?

E como a lembrar que o cenário pesado nacional sempre teve no interior do estado de São Paulo um de seus principais celeiros, foi ainda em meados da década de 90 que a quase desconhecida cidade de Apiaí gerou o trio Kappa Crucis. Após se consolidar no underground com a edição do CD ;Jewel box; (1999), com uma mistura de temas inéditos com material extraído de suas primeiras fitas demo, Kappa Crucis passou longo tempo distante dos estúdios de gravação.

Um período pródigo em experimentos, estudos e shows finalmente resultou em seu tão ansiado segundo álbum, Rocks (selo MCK), que vem confirmar o que o hoje quarteto já deixara sugerido no som de seus primórdios. Ou seja, uma fidelidade às tradições do assim chamado classic rock; uma classificação capaz de abranger sonoridades marcantes, mas também tão díspares quanto o southern rock de Lynyrd Skynyrd, os cruzamentos folk-bluesy-prog do Jethro Tull, o rock de complexas interseções eruditas do Yes ou o prototípico hard rock forjado a ferro e a fogo pelo antológico triunvirato Uriah Heep-Black Sabbath-Deep Purple.

Sem se render às obviedades covers que pululam por aí, Kappa Crucis mostra em ;Rock; 10 faixas autorais cantadas em inglês sem sotaque, cujos arranjos elaborados, cozinha sólida e riffs mastodônticos, remetem à mágica era compreendida entre os anos 1960 e 1970. Algo que de modo algum soa redundante ou propulsionado a clichês, Na verdade, uma boa aproximação do que o grupo apresenta nas superlativas ;Invisible man;, ;Flags and lies;, ;Stranger soul; e ;Between night and day; seria com o estilo que bandas norte-americanas como Gov;t Mule ou Widespread Panic têm desenvolvido de uns 10, 15 anos para cá sob a égide ;jam band;. Sem tantos improvisos, mas com um tipo de pegada e uma autoridade de mesma cepa, Kappa Crucis consegue a proeza de soar de forma quase tão convincente quanto suas principais referências, sem se render a um mero exercício de nostalgia.



Supergrupo


As últimas novidades distribuídas/divulgadas pela Som do Darma estão no homônimo CD do quinteto Noturnall. Espécie de versão tupiniquim para os supergrupos de outrora, já que em sua formação está um virtuoso e reconhecido baterista, Aquiles Priester, somando forças a quatro ex-membros do não menos mítico Shaman. Neste que é seu álbum de estreia, Noturnall evitou de forma premeditada soar como uma nova encarnação das mais famosas bandas power-prog-metal (Angra, Almah ou o próprio Shaman).

Com uma sonoridade híbrida de difícil definição, mas por demais impactante, prenhe de nuances e inesperadas texturas, Noturnall mostra por que já pode ser reconhecida como uma das principais expressões do metal brasileiro na atualidade. Mesmo que acenos ao som de formações consagradas lá fora, como Fear Factory, Annihilator, Symphony X ou Lamb of God, Noturnall consegue impor uma marca singular em Noturnall human;s die, Zombies, Master of deception e The blame game ; temas cuja personalidade sônica, impiedosa pancadaria e inovações melódicas elevam o emergente quinteto a um patamar raramente compartilhado por outras formações peso-pesadas do país.