Diversão e Arte

Filme israelense com ator palestino é exibido em festival internacional

67ª edição do Festival de Cinema de Locarno exibe Dancing Arabs em praça pública, sob contexto polêmico

Rui Martins
postado em 09/08/2014 19:00
Locarno (Suíça) - Enquanto o governo israelense continuava bombardeando a Faixa de Gaza, o Festival de Cinema de Locarno pregava a união entre os povos. Na Piazza Grande e a céu aberto, o filme israelense Dancing Arabs mostrou atores palestinos na tela. O longa foi adaptado do best seller de mesmo título, escrito por Sayed Kashua, que faz parte dos 20% dos árabes que vivem em Israel.

No festival, foi o contexto ousado que chamou a atenção. Como se percebe, é preciso muita ousadia para se lançar na adaptação do livro que fala de paz e entendimento entre palestinos e israelenses, quando o ódio é agora moeda corrente entre essas duas populações. Não deve haver tema mais controvertido e gerador de discórdias, divergências e mesmo vias de fato, quando Israel continua criando novas colônias nos territórios ocupados a ponto de inviabilizar a criação de dois Estados e quando o Hamas rejeita qualquer possibilidade de aceitar a existência de Israel.

Ora, o filme Dancing Arabs entra nesse terreno minado e mostra a intolerância de ambos os lados, com a personagem de um jovem palestino brilhante em matemática no secundário, pelo que foi aceito a frequentar um prestigioso colégio interno israelense, mesmo tendo um pai considerado terrorista por ter participado das manifestações que precederam a primeira Intifada, ainda na época de Yasser Arafat.

Eyad tem duas experiências importantes nessa sua nova vida, depois de ter deixado os pais e ido viver no internato - se apaixona por uma colega israelense, Naomi, e tem como melhor amigo um jovem israelense, Jonathan, sofrendo de distrofia muscular, que vive numa cadeira de rodas e logo entra numa fase terminal sem movimentos.

Quando Naomi tenta sondar sua mãe sobre qual seria sua reação caso namorasse um palestino, ouve a seguinte resposta - "preferiria que você fosse lésbica ou tivesse um câncer". Do lado da família de Eyad, a reação não seria diferente.

Por fim, a própria Naomi rompe o namoro para poder ter uma vida normal dentro da sociedade israelense, mesmo se Eyad tivesse abandonado o colégio para protegê-la. Em todo caso, Eyad tinha percebido a impossibilidade de se prosseguir com o namoro, evitando-se assim um repetir de Romeu e Julieta.

Logo depois, Jonathan morre e a opção tomada por Eyad, proposta pelo autor Sayed Kashua, é a de renunciar à sua nacionalidade palestina para assumir a nacionalidade israelense de seu amigo Johathan, com o qual tinha semelhança física possibilitando uma simples troca dos documentos de identidade.

Para não haver dúvidas futuras, a mãe de Jonathan aceita que seu filho seja enterrado segundo o rito muçulmano com o nome de Eyade que, por sua vez, assume a nacionalidade israelense do amigo.

Esse o ponto fraco do filme, mesmo se seu realizador Eran Riklis, é autor de outros filmes sobre as relações entre israelenses e palestinos - a opção de trocar a nacionalidade palestina pela israelense ou a perda de identidade palestina é inaceitável na busca da paz entre israelenses e palestinos.

Porém, Eran Ricklis deixa claro ter seguido o livro original. Mas essa solução de perda da identidade talvez tenha sido ironia do autor, mostrando qual é, no momento, a única solução possível de paz, no contexto atual entre israelenses e palestinos.

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