postado em 06/09/2014 06:01
A guerra civil estava no começo e a Espanha vivia o auge da ditadura de Francisco Franco, para quem Federico García Lorca representava um problema. De acordo com o pesquisador irlandês Ian Gibson, autor de Federico García Lorca: A biografia, rebeldes fascistas de Granada não estavam contentes com a fama que o poeta ganhava internacionalmente, havia clara perseguição, mas o desconhecimento das reais circunstâncias que levaram o poeta à morte realçaram a motivação que Gibson precisava para se debruçar em longa e difícil investigação.O corpo do poeta e dramaturgo espanhol nunca fora encontrado e era necessário convencer amigos e familiares a cederem detalhes sobre a vida, ralacionamentos mais íntimos e possíveis inimigos de García Lorca. Ao longo dos anos, as informações se acumularam e o autor percebeu que tinha o suficiente para uma extensa biografia do poeta. Ao Correio, Ian Gibson falou sobre o tabu em torno da homossexualidade e da paixão secreta de Lorca pelo artista plástico Salvador Dalí. Os dramas pessoais, sempre embasados na obsessão por amores impossíveis, eram camuflados pela espontaneidade e intensa vida social.
Vinte anos após a primeira publicação da biografia, a obra ganha nova edição no Brasil. ;Nessas duas décadas, a fama de Federico García Lorca só fez aumentar, a ponto de ele ser hoje, sem a menor sobra de dúvida, o poeta e dramaturgo espanhol mais lido, mas estudado, mas amado ; e mais pranteado ; de todos os tempos;, escreveu Ian Gibson no prefácio do livro.
Entrevista Ian Gibson
Por que o nome de García Lorca foi considerado tabu por cerca de 20 anos?
Foi um imenso e, cada vez mais crescente, embaraço para o regime de Franco. Eles o assassinaram! Os rebeldes fascistas em Granada mataram o maior poeta e dramaturgo da Espanha! A cada ano, ele se tornava mais famoso internacionalmente. Não podiam admitir qualquer responsabilidade. Assim, atribuíram a morte dele a militantes ;incontrolados; que agiam por conta própria ou por um rival homossexual. Foi uma mentira vil. Ele fora assassinado por ordem das autoridades rebeldes. Finalmente, em 1954, suas obras voltaram a ser publicadas na Espanha, mas em uma edição de luxo, fora de alcance para o bolso dos estudantes.
Qual a sua maior dificuldade para fazer a biografia? Quanto tempo a pesquisa levou?
Em 1965, comecei a investigar as circunstâncias da morte. Passei um ano em Granada pesquisando. As pessoas ainda tinham muito medo e tive de ser cuidadoso para não colocá-las em perigo. Foram quatro anos de idas e vindas. O livro, obviamente, não podia ser publicado na Espanha e um editor exilado, Ruedo Ibérico, lançou;o em Paris, em 1971, com enorme sucesso internacional. Ao longo dos anos, acumulei muitas informações sobre a vida de Lorca. O próximo passo seria embarcar em uma biografia, publicada em dois volumes ; o primeiro em 1985, o segundo em 1987. Foi uma tarefa difícil ; e muito cara. A maior dificuldade era conseguir os dados, o que implicava, entre outras coisas, infindáveis horas lendo páginas em arquivos de jornais em Madri, Granada, Nova York, Londres, etc. Não havia digitalização, lembre;se, então tinha que ler cada publicação, página por página. Além disso, Lorca era muito sociável e tinha milhares de amigos e contatos. Procurei localizar o máximo deles e essa tarefa tomou anos e anos.
Como avalia a experiência de ter passado tanto tempo mergulhado em pesquisa sobre vida obra e morte do poeta?
Com enorme satisfação. Ser o biógrafo de Lorca é um privilégio que desafia qualquer descrição. Estou relendo sua obra completa para revisar a biografia e cada dia descubro algo novo que não percebera antes. Isso me leva a níveis cada vez mais profundos de entendimento, como faço com os trabalhos do meu compatriota James Joyce, mas eu me devotei a Lorca, não ao autor de Ulysses.