Diário de Pernambuco
postado em 04/11/2014 18:20
Em 1970, Raimundo Carrero era um jovem jornalista e aspirante a escritor. Tinha 23 anos. Na Universidade Federal de Pernambuco, ajudava a escrever as edições de um jornal universitário, pretexto ideal para conviver com um ídolo, o então professor Ariano Suassuna. Conversavam sempre a respeito de literatura e do Movimento Armorial, criado pelo dramaturgo paraibano no ano anterior. Decidido a fazer parte daquele universo, o discípulo deu tudo de si para mostrar o próprio potencial.
[SAIBAMAIS]Em uma tarde e noite de sábado, na quitinete onde morava, em Casa Amarela, diante da maquina de escrever Remington, produziu o conto O Bordado, a pantera negra. Mostradas a Ariano na manhã seguinte, as quatro páginas foram recebidas com entusiasmo. O professor não somente elogiou, como escreveu um folheto de cordel inspirado na história e o publicou no manifesto do Movimento Armorial, de 1974. Pouco depois, enchentes assolaram o Recife e destruíram os textos. Essas páginas estavam desaparecidas até há poucos meses, quando, misteriosamente, alguém as escaneou e publicou na internet.
Mais de quatro décadas depois, o Romance do bordado e da pantera negra (Iluminuras, 36 páginas, R$ 29) será enfim publicado, em edição com o cordel e o conto, ilustrada com xilogravuras do pernambucano Marcelo Soares. O lançamento do livro será durante a Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto), quando os dois autores serão homenageados. A sessão de autógrafos é logo após a palestra de Carrero em homenagem a Ariano, no dia 16 de novembro.
;Gosto do conto, mesmo tendo escrito quando era inexperiente. Me realizei muito bem nele. Até me arrependo de não ter continuado nesse caminho, que é forte e bonito. Eu perdi a originalidade do conto. Na época, talvez por ser jovem, achava um formato fechado. Se fosse mais maduro, eu teria aberto essa reflexão e talvez alcançado minha obra teria sido mais densa;.
Com uma verve de literatura fantástica, o conto de Carrero narra a história da personagem Conceição. Após bordar a imagem de um dragão, ela vai tomar banho de rio, onde encontra uma garrafa ultramarina. Ao abri-la, a mulher é atacada por um monstro, e acaba sendo defendida por sua criatura, a figura fantástica do dragão. ;Associei o ;problema; do bordado, comum no interior, ao elemento popular do monstro, para falar da criatura em defesa do criador. É como quando Deus vem ao nosso socorro. Quis refletir sobre a condição humana;, explica Carrero. Já o folheto de Ariano reconta o episódio com alteração na forma do texto. ;É diferente, rimado, grandioso, maravilhoso e belo;.