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Em e-book, Benjamin Moser faz críticas sobre a construção de Brasília

Para o escritor, o movimento que criou a capital federal, apesar do nacionalismo um tanto exagerado ao redor, era um movimento colonial, que buscava a aprovação estrangeira




Quando veio a Brasília, Clarice Lispector se deparou com uma cidade descrita por ela como vazia e inabitada. Passados tantos anos, preocupa a superpopulação do DF, com 2,6 milhões de habitantes e grande especulação imobiliária. Qual seria a saída para esse deficit habitacional, já que vivemos em uma cidade tombada como Patrimônio Cultural da Humanidade?
Não gosto desse título de Patrimônio Cultural da Humanidade. Uma cidade não é para ficar preservada em âmbar. Talvez uma cidade muito antiga e pequena, como Veneza, mas uma cidade nova como Brasília precisava de mais tempo para se desenvolver normalmente. A Unesco está sediada em Paris, e isso não é coincidência. É que todo o movimento que criou Brasília, apesar do nacionalismo um tanto exagerado ao redor, era um movimento colonial, que buscava a aprovação estrangeira e que, pretendendo exaltar o Brasil, fez tudo com um olho para fora, com ideias importadas, que nada tinham a ver com a história das cidades brasileiras. Os ideólogos de Brasília tinham um desgosto profundo para o Brasil. Isso não falo eu: falam eles.

Há quem diga que a especulação imobiliária é o maior indício da crise política que se instala sobre o Brasil. Você concorda? Há descaso dos governantes quanto às políticas habitacionais?
Diria mais: se você tirar a especulação imobiliária e seu grande aliado, a indústria automobilística, o crescimento econômico das últimas décadas ficaria bem menor. Agora, o país está pagando um preço muito alto por ter investido num modelo de progresso que, já sabemos, diante de mil exemplares em dezenas de países, sempre acaba custando muito caro. O povo sabe disso: os protestos em torno da Copa do Mundo, por exemplo, tinham muito a ver com os gastos astronômicos para prédios ;para inglês ver;. Pense nos estádios gigantescos em cidades que não tinham nem time para jogar. É um símbolo importante. Mas cada político gosta de inaugurar uma coisa enorme e cara, quem sabe com o nome dele em grandes letras na fachada. É bem mais sexy do que renovar os esgotos.

Poderia nos explicar melhor a relação que vê entre a construção de Brasília e os regimes ditatoriais?

Os arquitetos têm uma afinidade explícita com regimes ditatoriais. De novo, não sou eu falando isso. Mas o fato de Niemeyer ser stalinista virou quase um clichê que ;todo mundo sabe;, como se isso dispensasse a necessidade de ver o que significa apoiar um homem que matou 50 milhões de pessoas. Aliás, se sabem mesmo o que ele falou sobre Stalin e podem passar por alto, é um problema mais do que intelectual. Vira um defeito moral. Sabem mesmo até que ponto o mestre dele, Le Corbusier, adorava Mussolini? Que tinha um plano para a destruição total do Rio de Janeiro? Isso deveria ser algo a se pensar.

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