George Harrison, Keith Wood, The Edge. Não são raros os exemplos de guitarristas que, vez ou outra, assumem os microfones. Essa versatilidade, no entanto, não é restrita aos Beatles, Rolling Stones ou U2. Algumas vezes, toma proporções maiores do que pequenas participações.
Martin Mendonça, guitarrista da banda que tem à frente cantora Pitty e dos duos Agridoce e Dezenove vezes amor, se alterna entre os riffs e as cordas vocais. Mendonça lança o primeiro disco solo, Quando um não quer, no dia 27 deste mês. O músico tem o projeto como uma espécie de batismo. Embora destaque que a força do álbum está nas composições, Martin coloca a voz como protagonista de um enredo incerto e do qual ele fugiu por alguns anos. ;Confesso que tive medo. Por isso nunca assinei só o meu nome em nada que fiz;, admite.
Não é de hoje que o paulistano Fernando Deluqui, ex-RPM, gosta de cantar. Mas o interesse foi mais levado a sério em 1993. Era, novamente, um momento de crise no RPM. ;Eu me autoexilei num estúdio caseiro que tinha em São Paulo. Fiquei gravando, testando as minhas músicas, região e alcance de voz. Fiz isso porque sabia que se soubesse cantar ao vivo teria autonomia para sobreviver. A vida de músico não é só glamour e eu precisava trabalhar;, explica.
[SAIBAMAIS]Tanto Martin Mendonça quanto Fernando Deluqui concordam ; a possibilidade de agregar características mais pessoais às letras e nos acordes é uma das maiores motivações para manter uma carreira solo em paralelo às bandas em que atuam. Marcelo Gross, guitarrista da Cachorro Grande, também tem um disco para chamar de seu, Use o assento para flutuar. Ele engrossa o coro de que a possibilidade de ser mais pessoal vale o risco à exposição nos palcos e nos estúdios.
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Entrevista com Martin Mendonça
Como está o disco, segue a linha mais Pitty ou Agridoce?
Acho que nem para um, nem para o outro. Ele tem alguma características do Agridoce pelo fato de que nessa banda eu escrevia também, mas no meu projeto solo o som não é tão acústico, é um pouco mais pesado. No final, o disco não ficou pesado e também não se voltou para meu lado do folk. Ele é centrado na canção e tem uma pegada bem elétrica.
Que novos elementos você consegue incorporar a esse projeto que ainda não tinha usado em outros?
Uma característica é que o disco foi muito bacana de se feito. O processo me agradou muito. Juntei um time de bons músicos e entramos no estúdio sem ter tudo muito formatado. Diferente do que faço com a Pitty, por exemplo, quando preparamos o repertório e o ensaiamos à exaustão antes de gravá-lo, onde só registramos os melhores takes. Com álbum Setevidas aconteceu assim. E no meu disco solo quis fazer um caminho totalmente distinto, inclusive chamando pessoas que eu conhecia há tempo e nunca havia tocado com eles, como o guitarrista Thiago Guerra, da Fresno. A maioria das músicas, a gente nunca tinha tocado junto. Entrar no estúdio com o disco incompleto levaram as músicas a lugares que, se tivéssemos planejado, jamais seriam conhecidos. Quando você acaba de gravar um disco, fica muito tempo escutando-o e uma hora se cansa. Mas esse está longe de me enjoar, ele ainda me surpreende. Foi muito livre. A música e a forma existia, mas os arranjos foi feito de maneira orgânica. Gravei violão, guitarra e voz, Gui Almeida, o baixo e Alexandre Brasil, que também toca com o Otto, me ajudou nas guitarras
Por ser o seu primeiro instrumento, há maior dedicação às guitarras nas gravações?
Eu não sou muito encanado, tanto que deixei o Alexandre Brasil totalmente livre para fazer novos arranjos. Até na com a Pitty, essa liberdade é algo que exercito muito. Tenho um arranjo base, mas também deixo espaço para o imprevisível. Gosto das ideias que saem na hora. As vezes você até se prova, se põe o desafio, usa um pedal novo, a guitarra de forma diferente; Guitarra é um grande parque de diversões. Esse disco, em particular, não tem megalomania de guitarra porque é voltado para canção.
Como fica a banda com Pitty? Setevidas foi lançado há pouco tempo, como você pretende manter os dois projetos?
Eles vão coexistir mas existe um protagonista, que é o Setevidas e meu papel com guitarrista da banda Pitty. Esse é meu projeto principal embora o meu carregue meu nome, minhas composições. Ele é um exercício, um hobby, vamos dizer assim. Quero fazer shows e fazer o disco correr o país, levá-lo para a estrada, mas só nas brechas que conseguir encontrar na agenda da Pitty.
Quais são as influências para as composições?
Leio muito, mas, engraçado, na hora de escrever eu olho para dentro. Não é uma coisa proposital. O compor música eu até consigo exercitar de forma mais metódica e direcionada. Mas letra é sempre um parto. Vem de um lugar e de uma forma que não tenho muito controle. É muito interno. Não necessariamente são letras de caráter biográfico, mas é tudo um pouco existencialista, se é que isso não soe pedante. O artista que sempre me influenciou ; e nem sei se influenciar seria a palavra certa ; foi o John Fusciante. Ver um cara cantando um conteúdo tão pessoal, é incomparável. O jeito que ele canta é peculiar. Aquilo funcionou para mim como incentivo, há algo que me diz: cante do jeito que você conseguir. É a influencia mais próxima que posso dar. Leio muito, mas não consigo colocar o paralelo entre algum autor.
Como você prepara sua voz?
Não faço aulas de canto ainda, mas pratico. A Pitty me ajuda muito e me dá toques. Ela tem uma super boa vontade e didática que não sei de onde tirou. Eu sempre mostro as músicas a ela e ela dá pitaco. Mas o segredo é fazer. Assim como na guitarra, em que fui autoditada. Se você quer algo, tem que treinar muito. A minha destreza na guitarra vem do tanto que toco e me dedico a ela, e acho que estou cada vez melhor mas longe de estar plenamente satisfeito. Acredito que estou cantando melhor do que quando gravei o agridoce. Nesse disco, contei com uma ajuda indispensável e super por acaso. Estou há dois anos trabalhando no CD e quando voltei para gravar as vozes o estúdio Costella, onde os instrumentos foram gravados, estava fechado. Até que conheci Mauro Motoki, do Ludov, e ele me ajudou bastante, foi super fofo. O que calhou de acontecer é porque ele é um baita de coach de voz
PARA OUVIR
Quando um não quer
Primeiro disco solo de Martin Mendonça. Deck Disc, 9 faixas. Lançamento dia 27 em formato digital no site deckdisc.com.br, no iTunes e no Deezer. Preço médio: Ainda não divulgado.
Nau
Novo EP de Fernando Deluqui. Independente, 5 faixas. Preço sob consulta.
Use o assento para flutuar
Disco solo de Marcelo Gross. Monstro Discos, 12 faixas. Preço médio: R$ 21,90.
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