Diversão e Arte

Zuenir Ventura fala ao Correio sobre experiências ao longo da carreira

Jornalista que acaba de ingressar na Academia Brasileira de Letras fala sobre os acasos que marcaram a sua vida e as mudanças vertiginosas do jornalismo na era das mutações tecnológicas

Severino Francisco
postado em 07/03/2015 09:09

Jornalista que acaba de ingressar na Academia Brasileira de Letras fala sobre os acasos que marcaram a sua vida e as mudanças vertiginosas do jornalismo na era das mutações tecnológicas

Ontem, foi dia de o jornalista e escritor Zuenir Ventura tomar posse na Academia Brasileira de Letras, fato que o deixou nervoso e cheio de solicitações durante toda a semana. Assim mesmo, concedeu entrevista ao Correio e adiantou que incluiria no discurso a experiência de ter sido aluno do poeta Manuel Bandeira e o que aprendeu com ele sobre se manter humilde diante da vida. Falou sobre a importância de ler os clássicos para entender o mundo em constante transformação, envolto em nova realidade tecnológica. Zuenir é um caso raro de jornalista-escritor que ingressa na Academia pela excelência dos textos produzidos em dramática contagem regressiva, contra os ponteiros dos relógios e o deadline, a hora fatal do fechamento da edição. Tornou-se imortal, não escrevendo nos papiros da eternidade, mas, sim, nas páginas efêmeras dos jornais.

[SAIBAMAIS] O senhor começou a escrever por acaso? Como foi o início?
É exatamente isso. Tudo na minha vida aconteceu muito por acaso. Nunca pensei em ser escritor e nem jornalista e acabei sendo as duas coisas (risos). Como tudo na minha vida aconteceu por acaso, eu brinco querendo saber se não fui gestado também por acaso. Hoje, eu não consigo me imaginar fazendo outra coisa, a não ser ser jornalista e escritor.

Como o senhor se tornou cronista e como vê a crônica que é feita hoje?
Eu fui cronista meio obrigado (risos). O Dacio Malta, que era diretor do jornal, cismou que eu tinha que ser cronista. Resisti a primeira vez, quando houve uma vaga e indiquei o Arhur Xexéo, que é um ótimo cronista. Na segunda vez, eles me disseram que não tinha mais jeito e que eu teria de ser cronista. Porque, na verdade, não gosto de escrever, gosto de ter escrito. Então, eu resisti muito até quando não teve mais jeito. E, realmente, é um dos gêneros que é meio jornalismo, meio literatura e é mais democrático. Na crônica, você pode fazer tudo: ensaio, humor, poesia; Sem falar, que é um gênero sem paletó e gravata, em que se tem muita liberdade, muita descontração. Talvez, por isso, a crônica sobreviva. Mesmo com a internet, essas coisas todas, cada jornal tem o seu cronista, à vezes, mais de um. Porque o leitor busca esse olhar subjetivo, mais pessoal. É o que a máquina não dá, que é essa visão particular de cada um de nós. Esse é o segredo da crônica.

O senhor se considera um jornalista literário?
Eu acho que é isso, porque tem uma categoria chamada de jornalismo literário. O meu livro, 1968, o ano que não terminou, foi muito classificado pelos críticos nessa categoria. Então, eu acho que é um jornalismo que você faz com mais cuidado, mais tempo e mais espaço. A diferença é essa, você tem mais tempo para apurar e escrever e, portanto, o resultado geral apresenta uma excelência maior do que o jornalismo que a gente faz diariamente. Não se pode exigir um nível de qualidade de quem faz duas ou três matérias por dia. No jornalismo literário você tem, teoricamente, o tempo que precisa para escrever.

Como foi a experiência de ser aluno do Manuel Bandeira?
Essa, modéstia à parte, é uma das experiências mais especiais. Eu dou muita palestras ; gosto de lecionar, a minha paixão, realmente, é o ensino ; e quando eu digo que fui aluno do Manuel Bandeira, vejo caras meio incrédulas. Aí eu digo que tenho testemunhas, não é mentira (risos). A minha faculdade, no curso de letras, eu tinha professores como Manuel Bandeira, José Carlos Lisboa e um timaço de professores catedráticos, como se dizia na época. O Bandeira já era um dos maiores poetas de língua portuguesa e era muito informal, ele vinha conversar com a gente. Íamos ao apartamento dele, que ficava em frente à faculdade. Foi uma das experiências memoráveis. O Bandeira foi aquele poeta sujo de vida, a poesia dele é encharcada de vida. Na vida real, ele adorava a Lapa, um bairro boêmio. Era uma época em que o intelectual vivia em uma torre de marfim e ele mostrou que não é nada disso, que a poesia é cheia de vida, Manuel Bandeira é muito jornalista também, ele fala intensamente do cotidiano. Enfim, ele me deixou isso. A humildade diante da vida talvez tenha sido o maior legado dele para mim.

A matéria completa está disponível, para assinantes. Para assinar, clique .

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação