Adriana Izel
postado em 25/03/2015 08:10
Pode parecer estranho abdicar de uma vida convencional e de luxo para viver de forma mais primitiva, fazendo arte nas ruas em uma cultura nômade. Mas não é para os personagens do documentário Malucos de estrada II ; Cultura de BR, produzido pelo coletivo Beleza da Margem e lançado em 27 de fevereiro na internet. ;Você é louca de estar aqui. É isso que você quer da sua vida? Eu realmente tinha tudo, mas não era feliz como na rua fazendo arte e pegando coisas que muita gente acha que é lixo e transformando em artesanato;, diz uma das jovens entrevistadas pelo grupo no início do longa-metragem.
[SAIBAMAIS]Exatamente para jogar luz sobre o movimento e tentar diminuir o preconceito vindo da sociedade é que o fotógrafo Rafael Lage, integrante do coletivo Beleza da Margem e diretor de Malucos de estrada, resolveu criar o documentário. ;Acho que é importante que as pessoas entendam que há múltiplas formas de ser e estar no mundo e todas elas são legítimas.
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Queremos desfolclorizar o hippie e convidar os espectadores a uma reflexão;, defende Lage. ;Quem são os malucos? São artesãos, nômades e coletores de matéria-prima. Nesse sentido, são os guardiões da ancestralidade e dos primeiros fazeres humanos. Eles bebem da fonte dos povos originários e mantém viva essa cultura, com diferenças pelas mudanças nos tempos;, completa.
O documentário é, na verdade, uma trilogia, que começou a ser montada em 2011 como resposta a repressão contra os artesãos em Belo Horizonte. Com ajuda do artesão Gustavo Policarpo, de Cyro Almeida e de Mooa Gaspar, que também fazem parte do coletivo, Lage começou a registrar o modo de vida dessas pessoas que integram o movimento que ele chama de ;malucos de estrada; em vez de hippie, como eles costumam ser chamados. ;Viajamos quatro estados em 2011, registramos um material riquíssimo, que deram origem aos curtas A criminalização dos artistas e Dê um rolê. Mas percebemos que para retratar a malucada e mostrar a diversidade do movimento, teríamos que viajar por todo o Brasil;, explica.
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Duas perguntas para Rafael Lage
Como você define a expressão cultural dos ;malucos de estrada;?
O maluco é um canibal cultural, um antropófago. Seu caminhar e sua rota o definem. As culturas com as quais ele tem contato, as diferentes pessoas que atravessam seu caminho e as geografias que ele percorre, tudo isso cria um ser único, paradoxal e multifacetado. Se há algo de fato que os une como uma família é a enorme diversidade de cada um e o insistente exercício de aprender a respeitar as diferenças dos outros.
O documentário mostra um pouco do trabalho dessas pessoas. Como é a arte produzida por elas?
Os malucos costumam se referir aos artesanatos como ;trampo de maluco;. Tem os trabalhos com linhas, conhecido como macramê e festonê, que são técnicas milenares de trançar fios; as filigranas e a modelagem em fios de arame; a modelagem feita em massa epoxi e os trabalhos no couro, como pulseiras e bolsas. Essas técnicas, embora milenares, foram recriadas pelas mãos dos artesãos brasileiros adquirindo um estilo e uma estética própria do movimento, além de manifestarem um imaginário e símbolos próprios do universo cultural da malucada. Mas é importante dizer que nem todo maluco é artesão. Muitos se utilizam de outras artes móveis e portáteis, como a música, a poesia, fotografia, o malabares, a pintura. Tem de caber na mochila.
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